Ricardo Coelho dos Santos*
Vivemos hoje dias de choques de gerações, ideias e gostos. Um desses, é o conflito entre o que é novo e o que é antigo. Independentemente da idade, há pessoas que dão as costas para o passado, desejando sempre o que há de mais moderno. Então, citar frases como “no meu tempo”, “eu me recordo” e “já foi melhor” são heresias que irritam esse povo. Assim, para quem já considera Facebook uma coisa de um passado tão distante que nem se recordam, não lhes interessa saber como as coisas começaram. Não podemos sequer dizer que o aparelho telefônico evoluiu muito, que eles vão fazer a seguinte pergunta antes de se aborrecerem: “O que é um telefone?”. A velocidade de mudança de conceitos e equipamentos contribui para dar razão a esse pessoal.
Mas ainda há nostálgicos. Desses, dividimos entre os reacionários às novidades e os que questionam se a tecnologia realmente está beneficiando a humanidade. Esses costumam perguntar como eram as coisas antes. Então, esse sessentão que vos escreve logo lembra as laudas datilografadas que enviava ao “Correio Popular” de Cariacica. Perguntam o que é datilografar e, depois, o que é máquina de escrever. É um prazer ver a cara de um desses jovens diante uma régua de cálculo, instrumento de engenheiros que precedeu as calculadoras científicas. Outro dia, eu falei que tinha uma vitrola. Pronto… O que seria isso? Vitrola era o toca-discos analógico fabricado pela RCA Victor, enquanto a Eletrola era o mesmo equipamento produzido pela General Electric, que também fabricava GEladeiras, enquanto as concorrentes fabricavam refrigeradores.
Deixemos claro que essa inundação de novidades não é de hoje! Na década de 1950, também passamos por isso, com igual intensidade. Era a época que o avião a jato. O primeiro jato de transporte de passageiros alçou voo em 1948, se tornando um símbolo de modernidade tão forte que os anos cinquenta já seriam chamados de Era do Jato. Naquele tempo, surgiu uma regra: o homem tinha de se modernizar!
O capitalismo era a face da modernidade. E o comunismo reagiu, sem deixar de ser moderno. Era chique ser comunista, mesmo perseguido pelos governos contrários, bebendo vinhos caros e morando em bairros elegantes. O macarthismo foi implantado e provocou uma exagerada caça aos “vermelhos” desde 1950 até à morte do seu idealizador em 1957. E pergunto ao leitor: qual seria a indústria mais evidente de todas, alvo especial da modernidade e das perseguições ideológicas? Quem respondeu cinema, acertou! Falamos sobre cinema e é sobre um filme especial que trata o nosso assunto.
Trata-se de “Ave, Cesar”, dos irmãos Joel e Ethan Cohen.
Vamos começar falando dessa dupla. São perfeitos em preparar comédias inteligentes. Mas não esperem escutar gargalhadas sonoras na sala de cinema, pois a graça do filme é percebida depois, quando, lanchando com a namorada ou esposa, se comenta uma ou outra sequência da obra e, daí, se percebe que ele é engraçado. Muito engraçado, aliás. A sutileza é tal que, no Google, o filme é classificado como drama e mistério. Longe disso!
Trata-se da indústria cinematográfica da década de 1950, quando vários tipos de filmes faziam sucessos estrondosos e a indústria se preocupava em ser isso mesmo: uma indústria! Muito séria e para entretenimento, uma validade que é inclusive questionada por um dos personagens da trama.
Então, vemos referências a filmes bíblicos, musicais, musicais aquáticos, de mistério e faroestes, referenciando sucessos da época como o épico Ben-Hur, os musicais com Gene Kelly e Esther Williams, Alfred Hitchcock e toda uma gama de bangue-bangues que garantia matinês cheias. Além do mais, mostrava a vida íntima dos astros e como a indústria trabalhava para se extrair deles o melhor que fosse possível. Falta de cultura, más atuações, arrogância, vícios, gravidez indesejada, homossexualidade, fofocas jornalísticas, intelectuais comunistas e grandes movimentações financeiras são itens de administração.
O personagem central é Josh Brolin, o executivo que tudo tem de tratar ao mesmo tempo e ainda se manter tranquilamente na família e se apegar à religião. George Clooney é genial como um canastrão que se julga intelectual enquanto Ralph Fiennes é o diretor perfeccionista.
Não são só essas as atuações brilhantes. Temos Alden Ehreich, o futuro jovem Han Solo, no papel de um ator matuto, Scarlet Johansson que hoje está brilhando em mais dois filmes: “Capitão América: Guerra Civil” e “Mowgli, o Menino Lobo”, na voz de Kaa. E ainda vemos o desempenho físico impressionante de Channing Tatum — o que garante uma boa bilheteria entre o público feminino. Fora as pontas preciosas como Jonah Hill, Frances McDormand, que não pode ser deixada de lado de um filme do marido e do cunhado e uma sempre surpreendente Tilda Swinton.
Assistindo a esse filme, ficamos diante de uma aula de cinema de antigamente. Um cinema de uma era glamorosa, em que se pregava o “American Way of Life”, os atores eram licenciosos e toda a indústria estava calcada na competência dos seus executivos. Quase um documentário sobre aquela época com filmes que hoje são referências que, o público averso ao que não é novo, há de citar como isso: uma referência, lida no Google e na Wikipedia. Mas sem o gosto de ter assistido e apreciado as explosões de cores fortes, os desempenhos das danças complexas e das tramas inteligentes da época. Nem mesmo os exageros dos filmes de aventura.
E, eis que me questiono: estamos de volta aos anos cinquenta?
“Ave, César”. Recomendo assistir, discutir e comentar. Mas só para quem entende de sutiulezas, gostando do novo ou não!
*Engenheiro, Escritor.
Fontes de pesquisa: Wikipedia, Adoro Cinema