Por: Guilherme Henrique Pereira*
Esses três pequenos textos atendem ao propósito de divulgar um pouco mais de informação sobre o sistema educacional brasileiro, porém com foco em sua abrangência quantitativa. Expressou-se concordância com o discurso prevalecente sobre a necessidade de profundas mudanças em nosso sistema educacional como uma das pré-condições para destravar o desenvolvimento, mas defende que a prioridade no Brasil de hoje é maior atenção e investimentos nos níveis médio, superior e pós-graduado stricto sensu. São nesses níveis que o Brasil apresenta maior atraso relativo. Por isso, somente a partir de fortes intervenções neles será possível revolucionar a educação brasileira.
O crescimento da pós nas últimas duas décadas foi significativo, mas preocupa a perda de velocidade, quando na verdade seria necessária uma aceleração. Também foi apontado que há falta de política indicativa de áreas de conhecimento prioritárias e de aprofundamento da qualidade de cada programa.
Essa terceira parte complementará as informações anteriores, abordando duas outras questões: o crescimento da pós-graduação regionalmente e o quadro geral de emprego dos mestres e doutores.
Em 1996 a formação de mestres e doutores encontrava-se concentrada na região Sudeste: 62% dos programas de mestrado e 68% dos mestres titulados. Se agregarmos a região sul, esses percentuais passariam para 78% e 85%, respectivamente. No caso do doutorado, a concentração era ainda maior: 79% dos programas e 89% dos doutores formados; Incluindo a região sul, a concentração da pós nesta parte do Brasil (sul, sudeste) era absoluta: 90% e 96%.
É possível dizer que houve uma descentralização, embora ainda modesta: Em 2014, 49% dos mestres e 60% dos doutores ainda eram formados no Sudeste; considerando a região sul, 70% dos mestres e 80% dos doutores ainda teem sotaque sul/paulista. A região que mais destacou-se em crescimento relativo foi a região nordeste.
O desejável esforço de aumento de programas e titulados, preferencialmente de forma melhor distribuída pelas regiões precisa continuar. Contudo, há que se aprofundar o debate e a busca de medidas mais efetivas de qualidade. Atualmente o painel conhecido por todos são as notas de avaliação da CAPES. Estes dados mostram poucos avanços: em 1998 com as notas 6 e 7 tínhamos 10,3% dos programas de mestrado, percentual que passa para 11,2% em 2014; com notas 3 e 4 estavam, em 1998, 62% ; essa faixa concentrou, em 2014, 72,1% dos programas de mestrado. No caso do doutorado: em 1998, 33,3% alcançaram avaliações 6 e 7; nessa faixa, em 2014, eram 36,7%; na faixa 3 e 4 estavam 26,7%, passando para 29,7%.
Portanto, no período analisado não há motivos para comemoração quanto a qualidade. Mesmo não considerando a polêmica natural sobre critérios de avaliação. O adotado pela CAPES, por exemplo, recebe pesadas críticas de privilegiar indicadores quantitativos que estimula uma cultura “produtivista” de professores e pós-graduandos e, em paralelo, o surgimento de muitas revistas científicas de qualidade duvidosa.
E o mercado de trabalho para tais profissionais como anda? O relatório de pesquisa utilizado aqui , como fonte de dados, apresentou várias tabulações que não poderão ser totalmente discutidas no âmbito desse artigo. Mas, apenas observar em que medida os titulados estão sendo absorvidos pelo mercado de trabalho. Há que se ter bastante cuidado para não se tirar conclusões apressadas de políticas para a conjuntura atual. A formação de um mestre ou doutor tem um horizonte temporal muito longo, assim, a oferta de formação no presente é um grande problema, dada a absoluta incerteza sobre mercado daqui a uma década ou mais. É por isso também, que em todo o mundo, o setor público geralmente é o maior responsável pela oferta de educação.
A população de mestres em 2014 era da ordem de 445 mil dos quais 66% encontrava-se formalmente empregado . Sem oscilações relevantes nos últimos anos, tal percentagem pode parecer baixa, porém cabe mencionar que esse indicador é muito influenciado pelo percentual de mestres titulados que não se apresentam logo ao mercado de trabalho por ingressar no doutorado. Em média 30,6%, mas, com larga margem de variação em função das áreas de conhecimento: quase metade – 49,6% - nas ciências Biológicas ; e apenas 16,6% na grande área das multidisciplinares. A taxa de empregados formalmente, também tem grandes diferenças por área de conhecimento e de forma inversa a de continuidade para o doutorado: maior em Biológicas e menor em Multidisciplinar. Também, variável em função do tempo da titulação: 62,5% para os com dois anos; 70,7 para os com 5 anos; e 72,3% para os com 10 anos.
Já na população (2014) de 168,1 mil doutores, 126,9 encontravam-se formalmente empregados, representando uma taxa de 75,5% que também não mostrou oscilação significativa nos últimos anos. Para os autores do relatório da pesquisa citada, a taxa acima da verificada para os mestres ainda pode parecer baixa por conta daqueles continuam em pesquisa ou no pós-doutorado com bolsa, portanto sem carteira assinada. Tanto para os mestres quanto para os doutores, quando utilizadas metodologias de avaliação de desemprego os percentuais encontrados são da ordem de 1,5% dos titulados que buscam e não encontram trabalho.
Para finalizar, imprescindível duas observações. Primeira, defendeu-se a necessidade de fortes intervenções na educação, especialmente nos níveis médio, superior e pós-graduado como parte do requerido para destravar o desenvolvimento nacional. Mas, o horizonte aqui é de médio a longo prazo. No presente o mais importante é a viabilização de um grande bloco de investimentos, algo que não ocorre desde os anos setenta do século passado, bem como a retomada da indústria nacional em novas bases, isto é privilegiando estratégias de inovação.
Em segundo lugar, comentar que um importante jornal de hoje (Valor, 02.08.2016) publicou uma extensa matéria sobre o significativo corte de recursos para a pós-graduação. O apoio à infraestrutura dos programas de pós, o Pro-equipamento foi descontinuado em 2015 e centenas de bolsa de mestrado e doutorado estão suspensas. Uma olhada rápida para o orçamento de 2015: Saúde + educaçãoo + Desenvolvimento social + Transportes + Déficit da Previdência somaram R$ 405 bilhões. O outro item, aquele do pagamento de juros corresponde a R$ 502 bilhões, ou 82% do déficit primário, mesmo assim, a política monetária insiste na manutenção da taxa Selic em 14,25% ao ano. Impossível reduzir o déficit cortando apenas em rubricas que somadas representam apenas 18% do déficit primário. Isso para não discutir o que é mais importante, se a educação ou a lucratividade do sistema bancário.
*Economista, Professor, Doutor em Ciências Econômicas.