Por Ricardo Coelho dos Santos*
A Flórida é um dos estados mais críticos dos Estados Unidos da América. Por ser quase tropical, é onde um grande volume de turistas americanos vêm passar as férias de inverno, fugindo do frio inclemente. Muitos velhos aposentados vêm para o sul, quando não conseguem ir ao Havaí, e aqui desfrutam de uma temperatura agradável numa região ensolarada grande parte do tempo. Mas não é só isso.
A Flórida está perigosamente perto de Cuba. Nos tempos de Barack Obama e Raul Castro, em que os dois países estão encontrando um caminho de conversação, podemos até dizer que esse perigo já passou. Mas há apenas poucos anos que a situação esteve tensa, e, na década de 1960, houve quase uma guerra entre as duas nações. Estive em Miami em 1973 e a quantidade de cubanos fugitivos que se estabeleceram por lá em pontos comerciais não era pequena. Havia até um restaurante cubano de “comida brasileña”, servindo feijoada. Alguns amigos me chamaram para ir para lá, mas vou lá comer feijoada nos Estados Unidos?
Por ser um dos pontos mais próximos da linha do Equador, a NASA instalou lá as bases de lançamento de foguetes. Com isso mais a proximidade de Cuba, há nesse estado um aparato de segurança militar extraordinariamente forte.
Fora isso, poderíamos dizer que o resto seria pântano, até que um tal de M. T. Lotts resolveu adquirir o máximo de região pantanosa possível. Era um nome falso. Reparem que a sonoridade é igual a “empty lots” — lotes vazios. Essa pessoa era ninguém menos que Walter Elias Disney que, se usasse o nome verdadeiro, teria o custo de uma região desprezada ser astronomicamente inflacionado. Com essa região adquirida, colocou ali o maior conjunto de parques temáticos em funcionamento nesse planeta: o Walt Disney World. Passou a atrair milhões de pessoas de todos os países, principalmente americanos e brasileiros. A cidade de Orlando, antes de vida quase insuportável, repleta de mosquitos, hoje é uma região importante e rica com o turismo fervilhante no local. Estou nessa cidade hoje, e não encontro um estabelecimento onde não se fala o espanhol, principalmente, e o português. Outros parques aproveitaram e correram para cá aproveitando a imensa leva de turistas que deram a Orlando o luxo de ter um aeroporto internacional.
Os parques da Disney são deslumbrantes, principalmente no que se refere ao seu funcionamento, na gestão de pessoal, na organização geral e no atendimento impecável dos seus empregados, os “Cast Members”, que não só trabalham como vivenciam o clima vigente que os turistas experimentam.
Portanto, a Flórida é o estado que mais recebe turistas nos Estados Unidos. Esse é o ponto mais importante. Para mim, particularmente, foi onde nasceu meu neto, e resolvi cumprir uma promessa a ele em leva-lo na vizinha cidade de Celebration, em cujo hospital ele nascera. Na viagem, encontramos Mattew.
Vamos ressaltar que o atraente calor da Flórida não é causado somente pela baixa latitude, mas, também, por ser banhada pelas águas do Golfo do México, que consegue aquecer até a costa da Inglaterra. Quando o calor excessivo dessa região encontra um frio quase constante, mesmo no verão, no Hemisfério Norte, aparecem os furacões.
Os furacões são ventos fortes que circundam uma pequena área de calmaria, o chamado “olho”, nascendo no Caribe e se movendo para o Norte. Em outras regiões, esse tipo de tempestade recebe outros nomes. As ilhas do Caribe são sempre as primeiras a sofrer com sua força destruidora; principalmente Cuba.
Dessa vez, a destruição maior ocorreu no Haiti. O pobre país — miserável, mais adequadamente falando — nem ainda se recuperou do terremoto de 2010, recebeu agora um furacão de nível 4, teoricamente o segundo mais potente na escala Saffir-Simpson, e deixou 900 mortos e 10.000 desabrigados, de acordo com o “El País”.
Cuba foi atingida somente na sua ponta oriental e a Flórida teve a sua costa percorrida pela tormenta até essa perder sua potência. Total de um morto: uma americana cardíaca que não pôde receber atendimento ambulatorial a tempo.
O governo do estado da Flórida recomendou a quem pudesse que fugisse para a costa oeste do estado, pois era pelo leste que Mattew estava chegando. Nós estávamos no Animal Kingdom, um dos interessantes parques da Disney, quando soubemos que o furacão se destinava para cá. Um dia antes, sabíamos da grande possibilidade, mas eis que essa se tornou uma certeza.
Para nós, naquele momento, foi maravilhoso. Apesar das chuvas constantes, os brinquedos não pararam, o que ocorreria somente em caso de raios. Não havia muitos ventos, mas as nuvens no céu corriam como loucas. Havia medo no ar. Assim, o parque ficou bem vazio, não de todo, mas deu para quem tivesse ficado, percorrer todas as principais atrações do parque, o que é praticamente impossível nos dias normais. E nós aproveitamos!
Foi avisado que todo o complexo da Disney seria fechado às 17:00 h. O furacão atingiria Orlando às 20:00 h e teria sua intensidade máxima às 4:00 h do dia seguinte. Era mandatório que se ficasse em casa nesse período. Isso queria dizer que quem saísse, se arriscava em ser preso, se não sofresse um acidente.
Resolvemos sair às 16:00 h. Iríamos passar num supermercado para adquirir água e suprimentos.
A primeira surpresa que encontramos foi a fila de automóveis deixando Orlando. Mesmo com a liberação dos pedágios, a fila de automóveis simplesmente não andava. Os carros estavam parados aguardando com uma civilizada paciência o momento de andarem. Talvez por causa do tempo que ainda havia antes da chegada da tempestade, o pessoal ainda se mantinha calmo.
Na próxima semana descreveremos o nosso encontro com Mattew.
*Engenheiro e escritor.