O Governo
Por Ricardo Coelho dos Santos
A questão política de Equinata é curiosa e bem complicada de se aceitar. Conheci alguns equinateanos e o que eles me revelaram foi uma governança nacional tão confusa que é bem difícil aceitar que o reino seja classificado como um modelo para o futuro. Está mais para propaganda de camelô do que uma perspectiva real.
Para começar, em Equinata, não há um programa de Estado. Há um programa de Governo. Assim, um bom governo é aquele que consegue recursos e oferece respostas aos anseios gerais para o momento. Garantia para o futuro é algo inexistente. Isso seja talvez por causa da natureza exuberante desse belo reino.
A história explica até um pouco do porquê de tal situação. Há alguns anos, houve um rei cruel que prendia e torturava qualquer inimigo do reino. O que ele não enxergava foi que se declararam alguns amigos como inimigos e alguns dos que ele perseguia estavam ao seu lado, bajulando-o. Naquela época, havia somente duas facções políticas: a dos que apoiavam o rei e a dos que o criticavam. Em ambas, havia gente fiel e aproveitadores desonestos.
Morreu o rei e o novo rei não queria impor a política do pai; preferia escutar o anseio do povo. Para impedir aproveitadores que olhassem mais para seus interesses do que as necessidades do reino, criaram um canal de condução dos anseios populares e foi assim que foi fundado o Clube dos Lordes, uma instituição que ouve o povo e separa o que é necessário ou não, prometendo melhorias. As necessidades se mostraram tão grandes, tão complexas, que, aparentemente, pareceram mais interesses que beneficiam alguns membros. Mas esses senhores, escolhidos pela população, têm demonstrado que são isso mesmo: aparências. A primeira grande necessidade foi estruturar o Clube, o que permitiu elevar a eficiência do seu trabalho. Verdade que isso teve um custo. Os transportes, como já foi relatado, mais a saúde, a educação e a defesa estão temporariamente prejudicados. Sempre que o rei separa uma parte do tesouro para atender esses benefícios, surge mais uma demanda para a verba ser redirecionada aos nobres senhores para eles prosseguirem no santo trabalho.
Porém, algo precisava ser feito para o cumprimento das promessas, e os Lordes, usando da sua imensa sabedoria, superior mesmo à dos doutos homens saídos das lides acadêmicas, acharam uma solução única para o reino. Se prometem uma estrada, um hospital ou uma escola, se constrói somente o que o orçamento permite. Como seus responsáveis são incompetentes, nunca prevendo a parte operacional dos Lordes nas obras, que consiste nas melhorias que somente eles enxergam durante a execução, o trabalho é abandonado até surgir um orçamento complementar para seu término. Assim, a promessa dada é cumprida mais de uma vez: a primeira no momento que a obra começa, as demais em cada retomada com as novas liberações e, no final, quando a obra é fundada. Depois disso, se preocupa em suprir de profissionais para os estabelecimentos, principalmente os de saúde e de ensino, mas isso consta de outra pauta orçamentária a ser analisada.
O caso dos hospitais é crítico, pois, além dos profissionais, tem os equipamentos que, se não foram adquiridos, precisam ser recuperados depois do longo tempo sem uso. Isso, quando eles já não se tornam obsoletos, necessitando de outra aprovação de verba para adquirir novos. Quando são aprovados, já se torna necessário construir outro hospital, pois o novo já está aos pedaços por falta de manutenção, ou de verba para manutenção, e o problema inteiro se repete!
Mesmo nos tempos despóticos de duas facções, essas recebiam um sustento razoável para manterem a si e aos seus trabalhos. O Clube dos Lordes também era dividido em duas partes, ambas suficientemente renumeradas. Porém, eles levaram ao rei a necessidade de sair da polarização para que os anseios populares fossem melhor canalizados, e, assim, surgiram várias outras facções, cada uma, recebendo as mesmas verbas robustas para seus funcionamentos, com seus respectivos presidentes com incentivos motivadores para compensar o árduo trabalho da negociação que a máquina do reino exige.
Claro que, para isso, os sacrifícios temporários se tornam necessários!
A negociação mais pesada é saber quem vai fazer parte da facção favorável ou da oposta ao rei. O que se negocia é quem comporá os representantes do povo: dos ministros reais até aos secretários das esferas nacionais, feudais ou municipais. A questão é tão delicada que pode até decidir, de acordo com a partição, quem ficará a favor ou contra o governo, não importando as filosofias a partir das quais essas foram criadas. Para quem vê de fora, não parece que há uma pluralidade de partes, mas sim, a situação e a oposição existindo e formando debates acalorados como no tempo do despotismo.
Os representantes do povo sempre foram escolhidos entre os melhores. Os currículos pessoais e suas comprovações de idoneidade são irrelevantes para o processo. Conta nisso o quanto as facções se fortalecem para representar o povo. Quanto mais fortalecida, mais podem começar, dar continuidade ou terminar as aprovações dos orçamentos para a construção dos benefícios ansiados pela população.
E, como se disse, para cada governo, um orçamento diferente. O rei está preocupado e pensa, erroneamente, em ser despótico como seu pai, para permitir que o Reino de Equinata tenha futuro como Estado. Por enquanto, o reino cresce, de acordo com o que os Lordes apresentam, apoiados pela mídia e pelos que depositam neles fé nas suas atuações.
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