Por Delano Câmara
Confesso – com um certo pudor e vergonha – que eu ainda não aprendi a falar mal das mulheres. Homem que se preza – dizem por aí os menos avisados – aprende desde cedo a falar mal dessas criaturas maravilhosas, descobre logo um meio de revolver seus pecados ocultos e de lhes abrir o peito para faze-las confessar seus inúmeros defeitos. Dizem mais: falar mal das mulheres, falar simplesmente das mulheres, é um agradável passatempo e um certo indício de ser profundo conhecedor do sexo oposto.
Eu, por exemplo, conheço um sujeito que esteve profundamente apaixonado por uma mulher, e a sua paixão era assim tão assustadora e intensa que, ao descobrir que ela já não gostava mais dele, construiu em volta de si uma indestrutível fortaleza amorosa e deu para falar mal das mulheres. E sempre me diz que hoje é feliz porque, no seu absurdo, deixou definitivamente de amar.
Eu o escuto, sereno e atento, mas não o creio. Não porque a vida e os anos tenham me ensinado a conhecer tanto assim as pessoas, mas porque o amor, assim como as flores silvestres – que são muito belas – nasce e rasga as entranhas do peito sem que a gente saiba explicar ao menos por que.
Há dias me disse, na mesa de um bar, que as moçoilas de hoje são fáceis e volúveis, imponderáveis e vaidosas. E que as senhoras – prosseguiu ele em seu amargor – não passam de fracassadas bonecas, todas cheirando a elogios fáceis, a caríssimos perfumes, como se isso fosse avisadamente disfarçar o peso dos anos que a custo querem evitar. Despeja sobre mim, quando me encontra, um saco de malfadadas histórias sobre mulheres e depois me diz, cheio de si, que se sente sólido e seguro contra essa mania idiota de amar.
Mas no fundo, só eu sei – e talvez ele também o saiba – que quando se despede e vai embora, leva na alma a desconfiança de que está sozinho e que aos poucos as grades da vida o mantêm trancado do lado de fora. Um dia mais e ei-lo batendo no peito a sua falsa alegria:
- “Ao diabo com as mulheres!”
Mas o que sei – e isto é o mais pungente – é que um outro amigo comum já o encontrou várias vezes no banheiro do escritório chorando copiosas lágrimas. O porque, ninguém sabe. Ele mesmo não conta. Já deu até absurdas evasivas: forte dor de dente e enxaqueca das grossas. Mas a mim quer parecer que, no fundo, as mulheres estão cortando com afiadas navalhas as últimas cordas daquele torturado coração.
A verdade – creio eu – é que somos todos um pouco parecidos com esse meu amigo que diz detestar as mulheres, e o diz – tenho certeza – triste e incerto. Quando a mulher nos abandona gritamos em voz bem alta que de mulheres o mundo está cheio. Uma aqui, outra ali e vai se levando. E se perguntam por ela, a traidora, a cachorra, a volúvel, damos de ombros e achamos muita graça, como se o mes de ausência fosse um tempo bobo, sem nenhuma significação.
Mas só nós sabemos que aqueles trinta dias representam uma horda de sanguinários ladrões que aos poucos vão roubando as nossas melhores ilusões ao lado da mulher amada. Só nós sabemos que aqueles dias são de tempestade e de borrasca intensa, que definham em nosso peito a flor silvestre do amor, quando não a mata, sem que se possa saber – pois isto só o tempo é quem diz – se mesmo plantada outra vez a terra a faça vingar e crescer.
Ah, meu Deus, eu ainda não aprendi a
falar mal das mulheres – e talvez nem o queira! Somente quem muito amou e que
depois, inexplicavelmente, se tenha visto abandonado pelo seu grande amor pode
se dar ao luxo de contar histórias horríveis sobre essas criaturas maravilhosas
que a todo instante assaltam nossos corações e os deixam amolecidos e inúteis.
Somente quem passou noites indormidas, vagando pelos cantos da casa à espera de batidas na porta, ou mesmo quem mediu a madrugada com seus passos de ébrio pode subir à mais alta tribuna e de lá atirar lama à dignidade das mulheres. Eu mesmo é que não posso. Só consigo mesmo admirá-las, todas à luz da minha alma e à alegria do meu coração.
Ah, mulher, no clarão da verdade ninguém pode condenar você. Ninguém pode negar a beleza das suas curvas sinuosas e a sensualidade de sua boca molhada. E quem pode – meu Deus – esquecer a expressão dos seus olhos e tapar os ouvidos às suas tolices de amor? Quem fechará os olhos quando você passar com seus seios oprimidos e grandes no burburinho da praia? Quem! – mulher – desviará a atenção do seu corpo esguio quando vento vadio levantar as suas vestes e mostrar a intimidade da sua carne? Quem, mulher, finalmente pergunto, negará o dourado da sua pele e a beleza do seu vulto, se não os cegos e os aflitos?
Senhores – e em especial este meu torturado amigo – eu não sei se vou dar o meu melhor conselho, mas é bom perder as vossas almas e condenar-vos prazerosamente ao inferno: ele existe e está por aqui, nesses vestidinhos azuis, nesses biquínis pequenos – até demais – e nesses corpinhos queimados e salgados pelo sol de verão que – meu Deus! - ainda nem começou...
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