Por André Ricardo Valle Vasco Pereira*
O eleitorado brasileiro pode ser dividido da seguinte forma: 1) direita; 2) centro-direita; 3) centro “puro”; 4) centro-esquerda; 5) esquerda. Há um bloco de alienados eleitorais e indecisos. Os alienados são aqueles que votam nulo, em branco ou não comparecem. Os indecisos não possuem preferências claras e só escolhem uma candidatura em cima da hora.
O eleitorado de direita defende atitudes repressivas contra a corrupção e a violência. Além disso, é conservador em termos de comportamentos (aborto, direitos de “minorias”). O centro-direita prefere menos Estado e mais mercado. São pessoas que acham que o governo deve funcionar como uma empresa e as ações privadas devem ser estimuladas. O centro “puro” acredita em um meio termo entre Estado e Mercado, tendo opiniões bastante vagas sobre questões concretas, podendo ir de um pólo a outro, dependendo do assunto. Já o centro-esquerda quer mais Estado e menos Mercado, um governo interventor, grande, que proteja os cidadãos em todos os sentidos. A esquerda, por fim, tem uma visão radical da exploração do trabalho, defendendo um governo que aja de forma agressiva na redistribuição de renda.
A distribuição de tais preferências em termos quantitativos depende das conjunturas. O momento atual é de alta polarização ideológica. O efeito disto é o de uma solidariedade entre a direita e o centro-direita, levando a uma proximidade entre o centro “puro” e o centro-esquerda. O primeiro bloco elaborou um projeto que conseguiu derrubar o PT, soldando neoliberalismo e conservadorismo.
Hoje, o nome mais forte da direita é Jair Bolsonaro (PSC). Na última pesquisa do Datafolha foi possível notar que ele conta com o seu voto “natural” e uma parte do PSDB, que é o partido que melhor representa o centro-direita. Isto aconteceu por conta do desgaste do senador Aécio Neves, que era o nome preferencial da legenda, e da pouca viabilidade do prefeito paulistano João Doria e de Geraldo Alckmin, governador de São Paulo. Desta forma, Bolsonaro marcou cerca de 16%.
O centro “puro” tem tido uma presença eleitoral significativa desde 2002. Já foi disputado por Anthony Garotinho, por Cristovam Buarque e tem hoje, como seu principal nome, Marina Silva (REDE), com uma imagem bastante consolidada. Ela obtém algo em torno de 15% e disputa o segundo lugar com Bolsonaro.
Lula (PT) é o candidato mais forte de centro-esquerda. Vale notar que, além do projeto político do bloco, ele possui um voto pessoal que deriva de seu carisma, do fato de ser a pessoa mais conhecida do Brasil, e da boa avaliação de seus governos. Ele se estabilizou em 30%. A esquerda chega a um máximo de 4%. Para o que se segue, vou usar os termos campo conservador para a soma de direita com centro-direita e campo progressista para a soma de centro “puro” e centro-esquerda.
Nas projeções de segundo turno, ao enfrentar algum nome viável do campo conservador, Lula recebe 45% de votos válidos contra 32 a 34% (Alckmin, Doria ou Bolsonaro). Vale notar que os 15 pontos conquistados por Lula são iguais à intenção média de Marina. Já o campo conservador consegue angariar cerca de 7 pontos a mais que suas intenções de primeiro turno, talvez entre indecisos e alienados. É importante perceber que os votos não mudam em bloco, mas eventuais compensações entre eles não deixam de divisar uma lógica geral.
Lula empata com Marina e com o juiz Sérgio Moro. No primeiro caso, é razoável supor que o campo conservador se deslocou para ela, provocando uma fissura entre os progressistas. No segundo, temos Moro obtendo votos de indecisos ou alienados, mais os “seus” (cerca de 14%) e os do campo conservador. Lula teria os do campo progressista, mas podendo perder algo para o magistrado.
Marina vence Bolsonaro com a margem mais alta de segundo turno: 49 x 27. O campo conservador fica no seu espaço “natural” e ela vai além da sua soma com Lula. Já quando Ciro Gomes (PDT) vai ao segundo turno e enfrenta alguém do PSDB, oscila entre 31 e 34, com Doria e Alckmin mantendo a faixa 34 a 32 que teriam com Lula. Este é o cenário no qual há menor volume de voto válido, ou seja, muitos eleitores indecisos, incertos e se alienando.
A polarização ideológica que houve no Brasil desde 2013 deixou o eleitorado do campo conservador acessível a uma retórica exagerada. O mesmo não ocorre com o campo progressista. A moderação de Marina e Lula mostra desempenho bem superior ao de Ciro Gomes. Ao mesmo tempo, Joaquim Barbosa vai de 10 a 13 e Moro marca 14% no primeiro turno. O Datafolha não informa sobre Barbosa no segundo turno, mas Moro ganha 30 pontos. Os dois também apresentam discurso moderado.
Uma candidatura do campo conservador, caso enfrente nomes viáveis do campo progressista, não tem chances de vitória. Por esta razão, ela deve lançar armadilhas para atrair os adversários, como no caso de escândalos, acusações de corrupção ou retórica anticomunista. O aparelho policial-judiciário (“Lava Jato”) e a imprensa cumprirão papel fundamental neste processo, tornando a resposta agressiva inevitável. Isto pode afastar votos, principalmente se houver uma candidatura “apolítica” viável.
Moro e Barbosa são os exemplos que indicam o espaço para alguém que não se apresente como político “profissional” e que não tenha acusações judiciais. Quando estão presentes com Lula, Marina e Bolsonaro, tendem a empatar no segundo lugar com estes dois, provocando relativa queda da indecisão e alienação, além de levar alguma coisa do PSDB. É claro que estamos longe da eleição e muita coisa pode mudar este quadro, mas já é possível divisar alguns elementos para o debate.
*Professor do Departamento de História/UFES
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