Por Antonio Carlos Pimentel Mello*
O Congresso Nacional, formado pelos deputados federais e senadores, deve instituir o chamado “Distritão” para as eleições do próximo ano. Na forma concebida, mais um golpe ladino contra o povo brasileiro. Objetiva perpetuar os atuais detentores de mandato nas casas legislativas. Terão à disposição um fundo financeiro imenso, de quase quatro bilhões de reais e as benesses conhecidas que facilitarão virem a ser os mais votados. Lembrar que as eleições em 2018 serão para deputado federal, deputado estadual, senador e governador. Apenas os dois últimos seguem o sistema majoritário (eleitos os mais votados). Em que consiste o “distritão”?
A Constituição Federal estabelece no parágrafo único do seu art. 1º que “Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição”. Para a escolha desses representantes eleitos do povo foi idealizado um sistema eleitoral proporcional. A eleição para o Senado é pelo voto majoritário (quem tiver mais voto leva o mandato). A eleição proporcional atualmente obedece a normas dos chamados quociente eleitoral e quociente partidário. O sistema do voto proporcional objetiva dar representação às minorias políticas. Sem a salvaguarda, as maiorias dominariam todo o cenário da Câmara dos Deputados. O sistema eleitoral vigente criou a seguinte fórmula estampada no Código Eleitoral:
Art. 106. Determina-se o quociente eleitoral dividindo-se o número de votos válidos apurados pelo de lugares a preencher em cada circunscrição eleitoral, desprezada a fração se igual ou inferior a meio, equivalente a um, se superior.
Lei nº 9.504/1997,
art. 5º: nas eleições proporcionais, contam-se como votos válidos apenas os votos dados aos candidatos regularmente inscritos e às legendas partidárias. Parágrafo único. (Revogado pelo art. 107 da Lei nº 9.504/97.)
Art. 107. Determina-se para cada partido ou coligação o quociente partidário, dividindo-se pelo quociente.
eleitoral o número de votos válidos dados sob a mesma legenda ou coligação de legendas, desprezada a fração.
Artigo com redação dada pelo art. 3º da Lei nº 7.454/1985.
Art. 108. Estarão eleitos, entre os candidatos registrados por um partido ou coligação que tenham obtido votos em número igual ou superior a 10% (dez por cento) do quociente eleitoral, tantos quantos o respectivo quociente partidário indicar, na ordem da votação nominal que cada um tenha recebido.
Art. 108 com redação dada pelo art. 4º da Lei nº 13.165/2015.
Parágrafo único. Os lugares não preenchidos em razão da exigência de votação nominal mínima a que se refere o caput serão distribuídos de acordo com as regras do art. 109. Parágrafo único acrescido pelo art. 4º da Lei nº 13.165/2015Art. 109. Os lugares não preenchidos com a aplicação dos quocientes partidários e em razão da exigência de votação nominal mínima a que se refere o art. 108 serão distribuídos de acordo com as seguintes regras:
I – dividir-se-á o número de votos válidos atribuídos a cada partido ou coligação pelo número de lugares definido para o partido pelo cálculo do quociente partidário do art. 107, mais um, cabendo ao partido ou coligação que apresentar a maior média um dos lugares a preencher, desde que tenha candidato que atenda à exigência de votação nominal mínima;
II – repetir-se-á a operação para cada um dos lugares a preencher;
Caput e incisos I e II com redação dada pelo art. 4º da Lei nº 13.165/2015. III – quando não houver mais partidos ou coligações com candidatos que atendam às duas exigências do inciso I, as cadeiras serão distribuídas aos partidos que apresentem as maiores médias. Inciso III acrescido pelo art. 4º da Lei nº 13.165/2015. § 1º O preenchimento dos lugares com que cada partido ou coligação for contemplado far-se-á segundo a ordem de votação recebida por seus candidatos.
§ 2º Somente poderão concorrer à distribuição dos lugares os partidos ou as coligações que tiverem obtido quociente eleitoral.
Parágrafos 1º e 2º com redação dada pelo art. 4º da Lei nº 13.165/2015. Art. 110. Em caso de empate, haver-se-á por eleito o candidato mais idoso.
Art. 111. Se nenhum partido ou coligação alcançar o quociente eleitoral, considerar-se-ão eleitos, até serem preenchidos todos os lugares, os candidatos mais votados.
Artigo com redação dada pelo art. 3º da Lei nº 7.454/1985. Art. 112. Considerar-se-ão suplentes da representação partidária:
Lei nº 7.454/1985, art. 4º, in fine: o disposto neste artigo aplica-se também à coligação partidária.
I – os mais votados sob a mesma legenda e não eleitos efetivos das listas dos respectivos partidos;
II – em caso de empate na votação, na ordem decrescente da idade.
Parágrafo único. Na definição dos suplentes da representação partidária, não há exigência de votação nominal mínima prevista pelo art. 108.
Parágrafo único com redação dada pelo art. 4º da Lei nº 13.165/2015. Art. 113. Na ocorrência de vaga, não havendo suplente para preenchê-la, far-se-á eleição, salvo se faltarem menos de nove meses para findar o período de mandato.
CF/88, art. 56, § 2º: prazo de 15 meses para renovação de eleições por vacância, inclusive para senador; e art. 81, caput e § 1º (e suas notas): eleição direta se faltarem mais de dois anos; e indireta se menos de dois anos para findar o período de mandato, no caso de vacância dos cargos de presidente e vice-presidente da República.
Alguns países com sucesso instituíram sistema eleitoral do chamado voto distrital misto, pelo qual parte dos deputados é eleita pela forma preconizada na atual redação do Código Eleitoral, pré-transcrita, e parte é eleita pelo voto majoritário, isto é, fica eleito o candidato mais votados independentemente de partido ou coligação, ou da votação global dos candidatos de sua legenda.
Esse sistema, menos complexo, é verdade, do que o sistema proporcional puro, vigente no Brasil, é defendido pelos que não se conformam com determinados fenômenos eleitorais como o Tiririca ou Enéas Carneiro. Enrustidos em pequenos partidos, esses candidatos puxadores de voto conseguiram a proeza de serem eleitos e ainda carregarem dois ou três deputados federais, em face da votação expressiva que obtiveram, colocando o quociente partidário superdimensionado. Num desses casos chegaram a ser eleitos candidatos com até menos de mil votos.
Como ponto de equilíbrio, o sistema distrital misto pode aperfeiçoar a prática democrática em nosso País, evitando tão graves distorções e ao mesmo tempo permitindo (na parcela admitida de voto proporcional) a representação das minorias políticas. É ainda verdade que descomplica o sistema eleitoral em vigor. Mas isso será tudo?
Esse o desenho institucional. Pelo modelo eleitoral vigente, puramente proporcional, os deputados integram listas partidárias abertas. A eleição passa por um cálculo que leva em conta os votos válidos no candidato e no seu partido (ou coligação), o chamado quociente eleitoral. Tal modelo permite que os partidos se agrupem em coligações partidárias e pelo cálculo do quociente é definido o número de vagas de cada partido (ou coligação), pela eleição dos mais votados do partido ou coligação. Exemplificando, se temos um eleitorado de 1 milhão de eleitores e o Estado tem 10 (dez) vagas para a Câmara dos Deputados, o quociente eleitoral será de 100.000 votos. Quer dizer, cada partido a cada 100.000 votos, em termos, elege um deputado federal. Pelo sistema do distritão, que pretendem aprovar, cada Estado é transformado num único distrito eleitoral. Serão eleitos os 10 (dez) deputados federais mais votados, independente da votação global do partido ou coligação (se vier a ser permitida).
Evidentemente, o distritão descaracteriza o sistema distrital misto e serve apenas ao propósito de reeleger os atuais deputados federais. Mais uma arisca manobra dos detentores do poder que não querem largar o osso da República. Tudo gira no propósito de manter as mesmas elites políticas cujo legado envergonha esta Nação.
*Advogado Especializado em Direito Administrativo e Direito Eleitorial.
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