09/10/2015
por: Poliana Belisário Zorzal*
Antonio Alberto Ribeiro Fernandes**
As Universidades brasileiras se caracterizaram como o celeiro da pesquisa científica no Brasil. Concentrando quase a totalidade dos mestres e doutores do país, estas instituições apresentam dentre suas atividades a pesquisa e o desenvolvimento de novos produtos e processos. Entretanto, muitas vezes, tais desenvolvimentos tecnológicos das universidades não se tornavam disponíveis à sociedade e seus diversos setores devido à carência de instrumentos legislativos e jurídicos para tal. Em especial, quando vislumbramos as demandas das empresas, o diálogo com as universidades era quase inexistente. Quando eventualmente estabelecido, era carregado de desconfianças entre as partes.Assim, anteriormente à Lei de Inovação as relações entre a Universidade-Empresa nem sempre eram entendidas como atividades de extensão da universidade, sendo muitas vezes até mal vistas pela comunidade acadêmica.
Os desenvolvimentos tecnológicos produzidos dentro das universidades brasileiras eram, em geral, apenas publicados na forma de artigos.Adicionalmente, a transferência de tecnologia para a sociedade era vista simplesmente como essa publicação dos resultados das pesquisas em periódicos e a retribuição aos pesquisadores era exclusivamente a autoria dos estudos.
Anteriormente a 2004, apenas algumas exceções dentre as universidades no Brasil buscavam a proteção das criações intelectuais de seus pesquisadores e professores por meio da proteção conferida pelas modalidades da Propriedade Intelectual, como por exemplo, patentes ou registros de softwares. Em outros casos, os próprios professores, buscando a proteção de seus inventos, ainda que desenvolvidos na Universidade, davam entrada em processos de registro ou depósitos em seus próprios nomes.
Com a finalidade de transpor a barreira existente entre Universidades, empresas e sociedade, em 2004 foi sancionada a Lei de Inovação (Lei nº 10.973, de 02 de dezembro de 2004) que dispõe sobre incentivos à inovação e à pesquisa científica e tecnológica no ambiente produtivo e dá outras providências.Esta lei coloca a Universidade como importante playerno cenário da inovação tecnológica no país e estabelece medidas de incentivo à inovação e à pesquisa científica e tecnológica com vistas à capacitação, bem como ao alcance da autonomia tecnológica e ao desenvolvimento industrial do País, nos termos dos arts. 218 e 219 da Constituição Federal brasileira.
Uma das exigências mais impactantes da Lei de Inovação foi a criação dos Núcleos de Inovação Tecnológica (NITs)nas Instituições Científicas e Tecnológicas (ICTs) - o que inclui as Universidades -em seu art. 16, que dispõe “A ICT deverá dispor de núcleo de inovação tecnológica, próprio ou em associação com outras ICT, com a finalidade de gerir sua política de inovação”.Tal obrigação evidencia o papel fundamental da Universidade pública no processo de inovação do Brasil, sugerindo que se estabeleça como permanente em sua relação com a sociedade brasileira. O modelo de Universidade como unicamente transmissora de conhecimento por meio do ensino é algo do passado.
Em suas diversas frentes de atuação, os NITs brasileiros buscam valorizar o conhecimento científico produzido na Universidade, criar uma cultura de empreendedorismo, fomentar a interação entre Universidade e empresa, proteger e realizar a transferência tecnológica das criações geradas pela Universidade. Enfim, uma atividade de criação de oportunidades para o ensino e a pesquisa da Universidade se beneficiem dessas parcerias com empresas, objetivando o desenvolvimento econômico e social do país.
Assim, os NITs são responsáveis por gerir a política interna de inovação e promover a utilização, por partedo setor produtivo do conhecimento científico, tecnológico e cultural produzido na universidade. Adicionalmente, no Brasil os NITs assumem funções de intermediadores das relações Universidade-Empresa, por meio da realização de estudos de viabilidade técnica e econômica das inovações criadas pelos pesquisadores, e gerenciando todos os processos relacionados à transferência tecnológica para os setores empresariais, através da promoção de licenciamentos e da criação de empresas nascentes (por exemplo, spin-offs).
Além disso, a transferência de tecnologia da universidade para a empresa, quando realizada com retribuição financeira, premia a atividade criadora dos pesquisadores, de forma a valorizar economicamente seu investimento nos estudos, seja na forma de tempo, intelecto, recursos humanos, estrutura física, dentre outros.
No estado do Espírito Santo os esforços para uma maior integração entre as ICTs capixabas e o setor produtivo se iniciaram com uma articulação entre UFES, IFES e INCAPER para a formação de um NIT conjunto como previsto na Lei de Inovação. O NITES (Núcleo de Inovação Tecnológica do Espírito Santo) se estabeleceu como um arranjo entre as 03 instituições capixabas e diversos parceiros, como a FINEP, FAPES, FINDES, Movimento Espírito Santo em Ação, Companhia de Desenvolvimento de Vitória e SEBRAE-ES.
Assim, a sociedade capixaba passou a dispor de estruturas na UFES, IFES e INCAPER responsáveis pela gestão da inovação, a saber, INIT (Instituto de Inovação Tecnológica), Agifes e NIT-INCAPER, respectivamente.
Especificamente na UFES, o INIT apresenta atividades bem delineadas, de forma a facilitar a interação entre a UFES e a sociedade e empresas capixabas, como:
• Avaliar produtos e processos decorrentes de atividades, projetos de pesquisa. Opinar sobre a conveniência de se promover sua proteção, assim como, quanto à conveniência de sua divulgação;
• Solicitar proteção de propriedade intelectual, quando pertinente, os produtos resultantes de atividades de pesquisa e de inovação de seus docentes, servidores técnico-administrativos, alunos e colaboradores;
• Acompanhar os pedidos de proteção da propriedade intelectual da UFES;
• Manter os títulos de proteção a propriedade intelectual da UFES;
• Intermediar a celebração de contratos de licenciamento, de transferência de tecnologia e de parceria com terceiras entidades, para a outorga de direito de uso ou de exploração de criações desenvolvidas na UFES;
• Estabelecer mecanismos de cooperação como convênios, programas ou linhas de pesquisa com outras universidades, centros de pesquisa e instituições públicas e privadas;
• Promover eventos, tais como palestras, cursos, seminários, oficinas (workshops) e outros, relacionados com a política de inovação da UFES;
• Divulgar os resultados dos estudos, pesquisas e criações desenvolvidas no âmbito da política de inovação da UFES, fomentando parcerias com interessados em nossas tecnologias;
• Prestar serviços de consultoria em proteção de propriedade intelectual, licenciamento e transferência de tecnologia;
• Zelar pela política institucional de estímulo à proteção da propriedade intelectual e de transferência de tecnologia.
Por meio de tais ações, a promoção do desenvolvimento econômico capixaba é uma das consequências da transferência dos conhecimentos gerados dentro da ICT para o setor produtivo, criando assim inovações que resultam em produtos que beneficiam a sociedade. Tal processo facilita se não, viabiliza, o movimento das descobertas da pesquisa acadêmica, do laboratório até o mercado, visando o benefício público.
Dessa forma, os Núcleos de Inovação dispõem de instrumentos para contribuir, via apoio à inovação,para o desenvolvimento sustentável do Espírito Santo, em especial nos momentos de crise, como o atual. Cabe a nós estabelecer a sinergia entre o mercado e a academia, uma vez que os instrumentos já estão disponíveis.
* Coordenadora de Propriedade Intelectual na empresa Prospective Inovação Tecnológica e Ambiental;Doutoranda em Biotecnologia - Bionegócios e Marcos Legais na Universidade Federal do Espírito Santo
** Físico, Doutor em Ciências dos Materiais IME RJ,Pós Doutorado Universidade da Califórnia EUA, Professor Titular da UFES, Diretor do Instituto de Inovação Tecnológica da UFES
Publicado também em Folha Diária
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