Grupo de Conjuntura - UFES
No ano de 2015 o dragão da inflação foi motivo de alarde nos principais noticiários do país em meio aos rumores de crise e “desgovernança”. Como explicar o comportamento dos preços e, em particular, as suas tendências para 2016 é questão nada trivial nesse cenário de grande instabilidade política e estagnação econômica. Pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), medido pelo IBGE e principal referência para a política monetária baseada em metas, a inflação fechou 2015 nos alarmantes 10,7%. Superior aos 6,4% de 2014, sendo a maior taxa desde 2002, quando registrou 12,5%, bem como também acima do teto da meta (6,5%).
As principais causas que impactaram o IPCA, em 2015, foram as altas de 18,3% no item Habitação, de 12,1% em Alimentação e Bebidas e de 10,16% no Transporte. A primeira foi puxada pelos reajustes nas tarifas de Energia Elétrica Residencial (de 51,0%, em média) e nos preços do botijão de gás (22,6%).
No item Alimentação e Bebidas destacaram-se os aumentos de 30,4% nos preços do feijão e de 20,5% no açúcar e derivados. Tais elevações encontram explicação nas reduções da oferta, impactada pelas condições climáticas, resultando na quebra da safra do feijão; no aumento da exportação de açúcar, cosequência tanto da depreciação do câmbio quanto da elevação dessa “commodity” na bolsa de Nova York.
Por fim, a elevação em Transporte foi puxada pelos itens combustíveis (21,4%) e ônibus público (15,1%), acompanhando os expressivos aumentos nos preços monitorados.
Na análise da inflação nas metrópoles pesquisadas a variação ficou entre 9,2% em Belo Horizonte e 12,6% em Curitiba. A Grande Vitória registrou uma alta de 9,5%, próxima do mínimo e abaixo da média nacional, mas ainda acima da meta. Houve uma convergência dos valores registrados para o índice no segundo semestre de 2015 responsáveis por contrapeso importante no resultado acumulado do ano.
Outro indicador interessante de se avaliar é o Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC) por que considera apenas as famílias com renda mensal até 5 salários mínimos (e não 40 como o anterior). Por ele percebe-se que a população mais pobre sentiu mais o encarecimento dos preços já que fechou o ano de 2015 com 11,3% de variação, acima do IPCA e dos 6,2% do ano anterior.
Já no cálculo da cesta básica feita pelo DIEESE, em dezembro de 2015, que também capta o impacto da inflação sobre a população mais pobre, houve um aumento dos preços no ano em todas as 18 capitais pesquisadas. O maior foi em Salvador (23,7%) e o menor em Manaus (11,4%), ambos bem acima do IPCA confirmando que a inflação foi maior justamente entre os que enfrentam maiores restrições orçamentárias. Porto Alegre aparece como a capital com a cesta mais cara, de R$ 418,82, enquanto em Aracaju registrou-se a mais barata, de R$ 296,82. Em Vitória o preço da cesta equivaleu a R$384,99, um aumento de 15,6% em relação a 2014.
O Índice Geral de Preços – Disponibilidade Interna (IGP-DI) da FGV permite ainda avaliar o comportamento global da inflação no país, considerando os preços no atacado (IPA), no varejo (IPC) e na construção civil (INCC). Fechou 2015 em 10,7%, taxa idêntica ao IPCA, grande piora ante os 3,8% registrados em 2014. Observou-se aumento em todos os três componentes, porém o mais expressivo deu-se nos preços no atacado,11,3%, contra os 2,2% de 2014.
Em síntese, a aceleração inflacionária em 2015, no cenário de contração econômica do PIB de -3,8%,é explicada predominantemente por pressões de oferta e não de demanda. Pode-se destacar em especial os aumentos nos custos de produção relacionados aos preços monitorados (destaque à energia e combustíveis) à depreciação da taxa de câmbio (desvalorizou 46% no período) incidindo na queda da oferta interna dos produtos comercializáveis e no aumento de preços dos importados. Essa constatação explica os efeitos ambíguos que a elevação da taxa de juros de 11,75%a.a. para 14,25%a.a. durante o ano teve sobre a inflação. Pelo lado da demanda não houve o impacto esperado. Por outro lado, aumentou os custos financeiros da dívida pública com piora da situação fiscal e aprofundamento ainda maior da crise.
O início de 2016 apresentou uma trégua, com o IPCA acumulado de janeiro a março correspondendo a 2,6%, inferior aos 3,8% de 2015. Considerando somente o mês de março o índice teve uma alta de 0,4%, menor taxa registrada desde 2012 (0,2%) e também inferior ao de 2015 (1,3%). Com isso, algumas agências e consultorias vêm considerando, para 2016, um processo consistente de desaceleração inflacionária em direção ao teto da meta.
Ainda existem, porém, pressões contrárias imprevisíveis. Nesse contexto de crise econômica e política, o enigma em torno do comportamento da inflação se mantém. Podemos citar a instabilidade quanto às expectativas e à especulação, a grande volatilidade da taxa de câmbio e as intensas variações climáticas com secas e chuvas acima da média que ainda acometem regiões no Brasil com efeitos deletérios sobre as safras, incidindo sobre a redução da oferta e o aumento dos preços.
No entanto, abre-se espaço para que o cenário recessivo da economia e o desemprego voltem a ocupar a atenção do governo no lugar dos discursos apocalípticos sobre o dragão da inflação.