Por Anaximandro Amorim
Monteiro Lobato (1882 - 1948) jamais imaginaria que uma de suas fábulas, "O velho, o menino e a mula", estaria, décadas depois, tão atual. A historia de um homem que, dando ouvidos ao "mimimi" alheio, monta e desmonta o filho (e ele próprio) de uma mula, ilustra bem o que se passa hoje em dia: todo mundo tem opinião para tudo e tudo vira polêmica. Seja o menino em cima do animal; seja o velho; seja o que for. Aliás, até Monteiro Lobato já virou polêmica. É o mundo do "mimimi".
A diferença da época de Lobato para a de hoje em dia é que os canais se amplificaram. Uma vez eu li, em outra crônica, que nunca se deu tanto microfone para tão pouco o que se falar. Vou mais além: hoje, até os imbecis conseguiram espaço para despejar imbecilidade. E que espaço! Como diriam os latinos, "de gostibus et coloribus non est disputandum", ou, no popular: gosto não se discute. Cada um tem o seu. E aí, com tanta facilidade, é muito fácil agrupar pessoas por gostos, não-gostos, mal gostos e desgostos. O único problema é quando uma tribo começa a querer se impor. Aí, é muito mimimi. Quando não seguido de palavrões, claro.
É interessante notar que a internet não é um espaço dissociado do real, ao contrário do que se possa imaginar. "Virtual" ver de "virtus", que, também em latim, quer dizer "potência". Logo, o mundo virtual é o mundo "real potencializado". Assim, ao se publicar na web, não se está escondido atrás de uma tela de computador, mas, sim, visto, diria até, desnudado. O problema, aliás, é, justamente, esse "potencializar". Como o que a gente fala ganha mais força, parece até que cada qual se acha no direito de "colonizar" a opinião alheira. E, como os microfones estão abertos, está armado o palco para se falar o que quiser. E tome mimimi.
É mimimi para tudo! Se o artista morreu, por que falar dele e não de outro? Mimimi. Se se fala só disso e não nos problemas do Brasil? Mimimi. E se só se fala em um problema e não se fala do outro? Mimimi. É tanto mimimi que fico pensando no velho e no menino, montando e desmontando da mula tantas vezes que Monteiro Lobato teria que espichar o texto. Aliás, o próprio Lobato já foi alvo de mimimi, quando tachado de racista, por uma passagem do "Reinações de Narizinho". Realmente, o mimimi não poupa ninguém.
Sabe, acho a internet um território raso e inapropriado para se debater o que for, mas, principalmente, para buscar informações e tentar convencer alguém. Nada substitui os olhos nos olhos. Ao contrário, acho que a web convida, pela sua natureza, a esse enfrentamento. Nós, humanos, somos seres naturalmente belicosos e, numa época em que as pessoas parecem feitas de porcelana, acha que ganha aquele que consegue impor seu mimimi. Eu, ao revés, não tenho paciência. E, se qualquer coisa é motivo, então, melhor parar por aqui. Senão, daqui a pouco, também viro motivo de mimimimimimimimimimimi...