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Praticamente todos os índices de inflação acumulada nos últimos 12 meses (novembro de 2015 a outubro de 2016) registraram uma desaceleração quando comparados com igual período entre 2014 e 2015. Assim, por exemplo, nesses dois períodos, o IPCA reduziu-se de 9,92% para 7,87%, o INPC caiu de 10,33% para 8,50%, o IGP-DI de 10,56% para 8,00%, e o ICV de 10,62% para 7,64%. A despeito dessa desaceleração, à luz da profunda recessão econômica que grassa o país há mais de nove trimestres, segundo o IBGE, salta à vista a resiliência do processo inflacionário, e quão distante ainda se está do centro da meta, de 4,5%. Afinal, a diminuição do nível de atividade; o incremento da capacidade ociosa; a elevação do desemprego; a redução dos salários e da massa real de rendimento das famílias; a contração do crédito; tudo isso compete direta ou indiretamente para a redução do nível de preços. Quais seriam, então, as contratendências?
Antes de retornar a essa questão, cabe tecer mais algumas breves considerações sobre os determinantes gerais da dinâmica da inflação nos últimos 12 meses.
Um fenômeno que salta à vista nesse período foi a expressiva desaceleração nos preços administrados, cuja taxa de variação em 12 meses, segundo o IPCA, recuou de um pico de 18,08%, em dezembro de 2015, para 7%, em outubro de 2016 (com destaque para os preços da energia elétrica e dos combustíveis). Entretanto, os preços livres estiveram longe de apresentar um forte recuo, conforme era esperado; nesse caso, as taxas de inflação acumulada em 12 meses passaram de 8,51%, em dezembro de 2015, para 8,15% em outubro deste ano.
Considerando mais especificamente o último semestre, para compreender essa trajetória haveria de se considerar o expressivo incremento nos preços dos medicamentos e dos planos de saúde, bem como a realização dos Jogos Olímpicos no Brasil, que puxaram para cima um conjunto de preços, sobretudo no setor de serviços. Mais importante, dever-se-ia invocar as vicissitudes da produção agropecuária, decorrentes da seca e de outras intempéries que se abateram sobre diversos estados do país, principalmente em decorrência do chamado El Niño.
Em acréscimo, poder-se-ia ainda considerar os efeitos das variações cambiais ocorridas no último período, bem como a oscilação dos preços das commodities agropecuárias no mercado mundial, ambos fenômenos que, em geral, tardam a se fazer sentir plenamente sobre a produção e os preços domésticos dos alimentos, e que, por vezes, possuem efeitos ambíguos no curto e médio prazo. Como se sabe, no ano de 2015 houve uma forte desvalorização do real frente ao dólar, o que tendeu a reforçar o escoamento da produção de tais commodities nos mercados externos, diminuindo a oferta interna, e, por outro lado, tendeu a encarecer os alimentos importados, bem como alguns insumos imprescindíveis. Porém, não menos expressiva foi a apreciação do real em 2016, com efeitos opostos. Paralelamente a isso, e na contramão desses fenômenos, verificou-se uma tendência à redução do preço das referidas commodities no ano de 2015, e à sua elevação, sobretudo na primeira metade do ano de 2016.
Em todo caso, a taxa de inflação do grupo de alimentos nos últimos 12 meses, com referência a setembro de 2016, foi de 16% segundo o IPCA. Não obstante, caso se exclua os alimentos desse cômputo, vê-se ainda que os preços livres elevaram-se de modo expressivo no período em questão. Logo, faz-se necessário buscar outras explicações para a persistência do processo inflacionário. Uma possibilidade seria atribuí-la a elementos inflacionários inerciais e às expectativas dominantes entre os agentes econômicos. Sem negar a importância dessas expectativas, mais relevante seria considerar a propensão e a capacidade de um conjunto de empresários de defenderem as suas margens de lucro por meio da elevação de seus preços, em um contexto de grandes incertezas sobre os rumos da economia brasileira e de grande turbulência política. Esse recurso torna-se ainda mais estratégico quando se considera que, em geral, esses mesmos empresários encontram-se fortemente endividados, depois de se refestelarem em anos de crédito abundante e barato (fortemente subsidiado), os quais em grande medida não se traduziram em investimentos produtivos sólidos.
Tendo em vista, entre outros fatores, que a crise econômica no Brasil tende ainda a se prolongar no tempo; que aqui não serão realizados novos megaeventos esportivos tão cedo; que as predições meteorológicas e as estimativas do Ministério da Agricultura auspiciam melhores dias para a produção agropecuária; e que a (sobre)valorização do real frente ao dólar deve prosseguir, catapultada pela voracidade dos especuladores financeiros, pelas medidas de repatriação de recursos e pelo “ajuste fiscal”, pode-se esperar uma desaceleração mais expressiva da inflação no próximo período (abstraindo a sazonalidade).Isso, evidentemente, pressupondo que não ocorrerão grandes turbulências no mercado mundial, que a crise política brasileira será arrefecida, e que as políticas privatizantes, de austeridade, de precarização do emprego, de cortes nos gastos sociais, enfim, que a aplicação sem peias de todo o velho receituário neoliberal, que há décadas acumula catástrofes pelo mundo, não terá efeitos disruptivos. Haja otimismo!
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