Por Guilherme Henrique Pereira*
O que acontece na economia e na política de um país em determinado momento histórico não pode ser compreendido olhando apenas para os fatos ou decisões recentes. Há poucos meses as notícias estavam dominadas pelo processo do impedimento (ou do golpe) e agora estamos discutindo os muitos problemas que nos impõe o governo instalado, as mudanças profundas na condução da política econômica, bem como as consequências de se tornar explícito o método de governar: primeiro o meu e de meus apoiadores.
Surpresas diárias e banalização do cargo público, via nomeados sem a devida condição moral para o exercício da autoridade, compõem o cenário atual, fortemente marcado pelo tema da corrupção. Aliás, esse tema sempre volta a cena política, e isso acontece quando se tem um inimigo político para ser derrubado. A corrupção não tem amigos ou simpatizantes, todos querem um governo limpo, daí ninguém defenderá um governo que se envolveu em falcatruas. Logo, para derrubar o inimigo político esse é sempre o discurso, basta convencer aos eleitores que a corrupção está operando solta.
Foi exatamente o que aconteceu em 2016. Qual a diferença? O Governo foi trocado e agora são os novos Ministros os denunciados. Em outros casos, como o Collor, uma vez cumprida a sua funcionalidade a corrupção sai de cena, volta aos bastidores. Será que perderam o controle? Ocorrerá um tiro no pé? Continuará o processo de denúncias e queda de Ministros até que se inicie um novo Governo?
Tudo indica que a corrupção é uma endemia incorporada a nossa formação histórica. De existência permanente que só mostra sua cara quando a minoria governante se divide por qualquer motivo e quebra o pacto de governança. Nessa hora, o povo é chamado para participar da briga e o tema da mobilização aparece. Trocado o adversário político, reconcilia-se por cima e sem o povo. As votações obtidas tanto no processo do impedimento quanto na PEC do congelamento dos serviços públicos, parecem apontar que já temos um nova conciliação.
Contudo, as novas prisões e as “espadas sobre cabeças”, representadas por novas denúncias ou possíveis delações, indicam que ainda há interesses que não foram acomodados. Tomara que sejam eles coletivos, amplos e com força para refazer a conciliação com a presença do povo pela primeira vez em nossa história.
Mas desde quando se pode falar em corrupção no Brasil? José Honório Rodrigues nos deixou como legado alguns livros sobre a história de nossa formação social, econômica e política. Em um deles (Aspirações Nacionais, paginas 57/58), o autor ao diagnosticar marcas profundas que exigiam mudanças, registra o seguinte:
“ ...Corrupção e venalidade não são também defeitos recentes. Vários viajantes assinalam sua existência, que remonta ao período colonial; foi também tratada em A Arte de Furtar, escrita no século XVII". O livro citado é de 1652 de autoria do viajante F. A. Varnhagen e mais.....". A corrupção vinha do alto, e as próprias autoridades recebiam propinas pelos contratos públicos."
Saltando séculos, chegamos a outubro de 2016 quando ocorre o lançamento do livro de Alex Cuadros, jornalista americano, intitulado ''Brazillionaires" que trata da história pessoal de bilionários brasileiros. Em entrevista ao Blog Brasilianismo e respondendo a pergunta “A corrupção é fator importante para a existência dos bilionários brasileiros?” declarou:
"Sim , a corrupção é um fator importante na composição dos bilionários do país. A corrupção era uma precondição de negócios, que todos cometiam, e seria interessante saber o quanto da riqueza se deve ao talento empresarial dessas famílias. ..............Estamos vendo agora comprovadamente que sistematicamente se usou a corrupção como parte do modelo de negócios. A Odebrecht tinha um departamento de propina. Essas famílias: Odebrecht, Camargo Correia, Andrade Gutierrez, Queiroz Galvão, OAS, são algumas das mais poderosas do país."
Parece que em séculos nada mudou. A corrupção é parte integrante da forma de funcionar e operar do nanico capitalismo brasileiro. Nanico não só pelo seu tamanho no mundo capitalista, mas principalmente em sua incapacidade de se valorizar em condições civilizadas de respeito aos trabalhadores, democracia, demais instituições e categorias sociais.
A sociedade constituída com essa marca não poderia ser diferente, afinal, a minoria dirigente está preocupada apenas em garantir o patrimônio e poder, atuais e dos herdeiros. Daí as nossas jabuticabas: campeã da desigualdade, titubeante em sua soberania nacional, sistema político caótico, partidos políticos de defesa de interesses e não de programas e uma democracia que, apesar de avanços recentes, ainda falta muito para a participação efetiva da população.
Mas, a irresponsabilidade histórica de nossos grupos de dirigentes, em alguma curva da história, será desmascarada e uma nova sociedade brasileira emergirá. Este é o meu sonho de consumo.
* Economista, professor
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