Por Anaximandro Amorim*
Eu costumo decepcionar as pessoas quando digo que não gosto muito de natal. Não deveria ser. Nascido em um lar católico, também me considero assim, apesar de não ser lá muito praticante há tampos. Sinceramente? Não preciso ir à Igreja para ter Jesus no meu coração. Conheço, aliás, muita gente que nem religiosa é e o tem, sem saber. Da mesma forma, não acho que caridade, solidariedade e amor ao próximo devam ser praticados só uma vez ao ano. O nome disso não é espírito do natal. É hipocrisia.
Não me lembro ao certo com que idade descobri que o "Bom Velhinho" era o meu coroa. Acho que as coisas foram se revelando aos poucos, a medida que eu crescia. Tudo tão simples, tão sutil quanto a família reunida. É claro que, como toda boa criança, eu adorava ganhar presente. Mas bonecos que emitem luzes, bonecas que falam, brinquedos cheios de lero-lero podem impressionar, num primeiro momento. Depois, enjoam. O melhor brinquedo é o que vem de dentro. É a vontade de estar ao lado de quem se ama. Os melhores presentes não têm preço.
Talvez seja por isso que o natal nunca foi uma data assim, tão especial, para mim. Felizmente, sempre tive uma família presente. E, num mundo que tende ao individualismo, isso, sim, é um presente! Pra mim, natal é todo dia. Eu estou (muito) longe da perfeição mas acho que não custa ser gentil com as pessoas. Civilizado, eu diria. É o mínimo. Dar bom dia, boa noite, não faz cair o queixo. Pedir licença e dizer obrigado, ceder o lugar para os mais velhos, não parar o carro na vaga de deficiente (quando você não é deficiente), segurar a porta do elevador... É estranho, tem gente (e não é pouca) que, lá pela véspera do natal, aprende até a sorrir para os vizinhos. Depois, pode esquecer. No ano que vem tem mais.
Acho clichê botar a culpa no noticiário, pedir para o ano acabar logo, como eu vejo nas redes sociais. Ano passado foi tão ruim quanto este. Os apelos eram os mesmos. As mazelas, da mesma ordem. Longe de mim minorar o sofrimento alheio, mas, sempre haverá um avião que cai e um político sem-vergonha para se aproveitar da dor alheia. Isso tudo só mostra o quanto estamos repetitivos e previsíveis. Os erros são os mesmos. É a humanidade revolvendo a sua pequenez.
Ao contrário do que se possa pensar, no entanto, eu não estou aqui desacreditando da espécie, nem querendo pôr uma pá de cal no natal alheio. É o período que me evoca esses sentimentos, presos na garganta há tanto tempo, esperando para sair do papel. Não há espírito do natal sem espírito do humano. Mesmo quem não crê em Deus (ou até quem crê) ou Papai Noel deveria pôr isso em prática. Talvez eu tenha desacreditado é do Bom Velhinho. Mas, hoje, véspera de natal, escrevo essas linhas pedindo a ele um pouco mais de paz, amor e tolerância aos homens. E que o espírito de natal se perpetue ao longo dos próximos 365 dias.
*Advogado, Escritor.
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