Por Ricardo Coelho dos Santos
Indústria
Se existe em Equinata uma sólida política partidária, tendo à frente os doutos Lordes e seu respeitado Clube, não se pode dizer corretamente que exista uma política industrial bem colocada. Sim, existem indústrias, algumas muito boas, embora sejam uma minoria, mas a política industrial se parece muito com a política de governo. A explicação disso talvez seja porque muitos membros do Clube dos Lordes estejam também à frente da política industrial.
A entidade que deveria guiar a indústria deveria ser a aclamada e celebrada, principalmente pela mídia (que também se vê como membro), Grêmio Industrial. Entender como o Grêmio Industrial trabalha é um desafio e tanto. Vários estudantes em Administração de Empresas tentaram fazer Mestrados e Doutorados com dissertações e teses para tentar explicar o funcionamento, e o máximo que chegaram foi a seguinte conclusão: não deveria dar certo, mas dá! Onde e como as coisas trabalham com resultados positivos é um mistério.
Para começar, em Equinata existe a seguinte filosofia: o importado é SEMPRE melhor que o nacional. Isso faz muitos equinateanos viajarem ao exterior para comprar, por exemplo, roupas. Primeiro, que os impostos em Equinata são tão elevados que uma compra no exterior, contando com passagens de avião (e seus impostos) e os demais gastos (tudo taxado) fazem com que o negócio seja lucrativo. Isso impulsiona dois efeitos negativos. Um: o contrabando é também uma indústria lucrativa em Equinata. Dois: como a arrecadação cai, o governo, precisando de capital para sustentar o trabalho dos Lordes, aumenta a carga tributária. Mas o que não foi dito aqui é que as roupas compradas no exterior são fabricadas exatamente em Equinata. E lá não vendem, pois é um produto nacional e, comprando lá, os impostos se tornam tão altos que vale a pena importar. E outros segmentos industriais equinateanos caem.
Outro problema que afeta a política industrial: se um segmento começa a crescer, como, por exemplo, o farmacêutico, os demais segmentos farão de tudo para dificultar seu andamento. Mesmo que o crescimento de um gere, consequentemente, o do outro, o que acontece é que o status de quem está na frente é abalado, e isso não pode ocorrer! Principalmente, porque muitos industriais são também Lordes, e o prestígio de um Lorde é sagrado e intocável, podendo, portanto, ser defendido com unhas, dentes e com uso da Justiça. Não é raro uma indústria processar a outra pelo simples fato dessa ser concorrente e, com a atuação dos Lordes, até impedir o crescimento de uma indústria que possa atrapalhar outra.
E é aí é que a política industrial fica confusa. O mesmo membro do Grêmio que impede o surgimento de um concorrente ou um possível entrave usando a Justiça e a Força da Lei, prega que somente a livre concorrência é que salvará o reino da sua dívida externa e do seu pequeno crescimento industrial. Mas, o mais interessante, é que eles, que correm para os poderes Judiciário, Legislativo e Executivo para impor a sua indústria ante às demais, reclama depois do excesso de intervenção do Governo – coisa que realmente existe.
A questão da intervenção governamental envolve, logicamente, uma necessidade estratégica da atuação do Clube dos Lordes. Algumas indústrias beneficiam mais o Clube, portanto, essas devem ser mantidas. Não há nada mais antipatriótico em Equinata que um segmento industrial não alinhado ao Clube dos Lordes.
Outra política industrial confusa é a da nacionalização. Algumas indústrias lutam acirradamente pela exclusividade de utilização de produtos “Made in Equinata”. Os Lordes, de vez em quando, até baixam determinações sobre a obrigatoriedade de conteúdos locais. Entretanto, uma vez longe da concorrência estrangeira, a qualidade dos produtos cai tanto que contribui para a indústria de contrabando. O contrabando não é bom para o governo de Equinata, mas beneficia o trabalho de alguns Lordes.
Algumas industrias equinateanas conseguem desenvolver produtos nacionais de qualidade igual ou superior aos estrangeiros. Essas atendem ao sem número dos quesitos de qualidade exigidos, que os Lordes, acionados por outros membros do Grêmio, buscam reduzir para a geração de produtos com preços bem menores. Entretanto, algumas empresas estatais não abrem mão desses quesitos, se tornando então alvo de ataques do Clube dos Lordes, que buscam a justa troca do presidente dessa empresa para o benefício da indústria nacional equinateana.
Porém, mais forte que a política de nacionalização dos produtos, é a de internacionalização das indústrias. Esse é outro ponto confuso para se entender o que os membros do Grêmio pensam. Se uma organização genuinamente equinateana faz sucesso, vem uma indústria estrangeira e a compra por um preço tão elevado que seu industrial proprietário pode passar a viver da renda do investimento de menor retorno daquele reino como se fosse um salário milionário. O ritual de venda da empresa para o estrangeiro é comemorado a ponto de vários Lordes participarem e anunciarem abertamente que esse é o verdadeiro caminho da indústria de Equinata: a globalização, através da entrega de todas suas indústrias ao controle estrangeiro. Uma vez comprado, muitas vezes essa indústria é fechada. Afinal, seu controlador finalmente possui um concorrente a menos.
Para a melhoria da indústria de Equinata, o Lorde Ministro já realizou comissões, subcomissões, simpósios, debates, mesas redondas, congressos, encontros, feiras e eventos. Só não estabeleceu uma diretriz ainda. Um dia, com o apoio do Clube dos Lordes, conseguirá!
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