Ao que parece a maioria dos brasileiros ainda não se deu conta do grave momento histórico que o Brasil atravessa. De um lado o avanço do crime organizado e desorganizado sobre o poder do Estado, gerando insegurança para a população de várias capitais e a sensação de absoluta incapacidade dos ditos operadores de segurança manterem a normalidade.
Na ordem institucional, particularmente nos aspectos relacionados às políticas econômicas e sociais, observa-se que o atual comando do Governo federal parte com força total para o desmonte de vários dispositivos voltados para o desenvolvimento nacional e a seguridade social. O assustador é que, no conjunto, trata-se de uma intervenção profunda realizada por um grupo de interesse que não foi eleito, portanto não colocou suas propostas em debate, dessa forma com clara falta de legitimidade para tanto.
Nestes últimos dias está em foco o desmonte de alguns mecanismos que foram até aqui muito importantes para o desenvolvimento da indústria brasileira.
No âmbito da Petrobrás, seu presidente vem a público para tentar (
(http://cartamaior.com.br/?/Editoria/Politica/Parente-o-serpente/4/37656) ) explicar que não há motivos para polêmicas o fato da Petrobrás ter convocado somente empresas estrangeiras a participarem da concorrência para construção da unidade de processamento de gás do pré-sal. Chama de ranço ideológico a opção de praticamente todos os países do mundo valorizarem, com o Brasil também fazia, o seu mercado interno como o maior recurso que uma nação tem para desenvolver a sua produção, gerar empregos sobre controle interno e buscar soberania no contexto internacional. No seu artigo repleto de retórica partidária e ideológica, tenta dizer que a empresa brasileira não é competitiva, esquecendo-se das condições de custos locais como o câmbio artificialmente valorizado e as diferenças entre taxas de juros aqui e lá fora, além de outros fatores, bem como não fazer a diferença entre custos privados e custos sociais. Finge desconhecer o amplo programa executado sob liderança da própria Petrobrás de desenvolvimento de fornecedores locais e que já coleciona dezenas de casos de sucesso, alguns dos quais hoje já posicionados no mercado externo.
Outro mecanismo a caminho do desmonte é o da empresa nacional que foi o tema de encontro que reuniu em São Paulo, no dia 23 de janeiro, empresários, sindicalistas e representantes de entidades de classe – como o Sindicato dos Engenheiros do Estado Rio de Janeiro (Senge-RJ) e a Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos (Abimaq). Sobre o encontro transcrevemos trechos do Informativo da Associação do Funcionário do BNDES –AFBNDES - (Especial 5) que bem resenhou os resultados da reunião:
[“Todos denunciando políticas governamentais que estariam contra os interesses nacionais. Como exemplo, o favorecimento de empresas estrangeiras na licitação das obras do Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro (Comperj) e o projeto de desmonte da política de conteúdo local que garante a participação de empresas nacionais no fornecimento de bens e serviços e fortalece a soberania do país.
Segundo o presidente do Senge-RJ, Olímpio Alves, o momento exige a construção de uma aliança entre amplos setores da sociedade: “A unidade é a estratégia para a defesa da indústria brasileira e da engenharia nacional. Sem empresas brasileiras não há empregos e nem produção de ciência e tecnologia. A engenharia é o motor do desenvolvimento econômico e social”. Para o presidente do Conselho de Óleo e Gás da Abimaq, César Prata, “a lógica é de favorecimento das empresas estrangeiras, que vêm ao Brasil, exploram e processam óleo com isenção de tributos. E o retorno é praticamente nulo para a sociedade brasileira”.
“A política de conteúdo local precisa ser encarada como política de Estado e não de governo. Perderemos anos de valorização da política industrial e da nossa engenharia. Nosso parque naval e petrolífero será desmontado e comandado de acordo com interesses de outros países. Não existe país soberano sem engenharia e é nossa tarefa resgatar o desenvolvimento social e apontar caminhos para a defesa dos empregos”, complementou o presidente do Sindicato dos Engenheiros.
BNDES – Dentro desta ótica denunciada no encontro de São Paulo, não foi surpresa a notícia, do dia 29/1, de que o BNDES perderá direito a voto no comitê do governo federal que discute a reformulação da política de conteúdo local para o setor de petróleo. Além do Banco, também deixarão de votar a Agência Nacional de Petróleo (ANP) e a Financiadora de Estudos e Projetos (Finep). Com isso o governo centraliza as discussões sobre mudança na política de conteúdo local no nível ministerial.
César Prata, da Abimaq, criticou a mudança: “O BNDES e a Finep naturalmente estão do lado da indústria, do lado da fabricação nacional. Não há ministro para nos defender (dentro do comitê). Vamos perder, o Brasil vai perder indústrias e empregos por falta de um comandante que perceba a tempo o que nos fizeram... as empresas extrairão nosso petróleo, sem pagar impostos e sem deixar contrapartidas ao povo”.
O presidente do Clube de Engenharia, Pedro Celestino, também vê com preocupação as mudanças em curso: “Nós não temos nada contra o capital estrangeiro, desde que seja um capital que venha para cá gerar emprego, pagar impostos, gerar tecnologia, mas o que se quer é nos reduzir à posição de colônia. Como os técnicos do BNDES e da Finep resistem a essa mudança, e a Petrobras hoje tem a mesma posição das petroleiras estrangeiras, foram simplesmente afastados do comitê que está discutindo essa política”].
É também a Diretoria da AFBNDES que chama atenção e em nota própria convida a todos associados para a reflexão sobre “um dos momentos mais graves da história do banco”:
[A imprensa vem noticiando há duas semanas que uma mudança na metodologia de cálculo da TJLP está em curso. Trata-se de uma mudança profunda na precificação do crédito do BNDES, com impactos significativos sobre o Banco e sobre o investimento em capital fixo no Brasil. A mudança basicamente consiste em que a TJLP flutuará como uma taxa de juros de mercado, mais especificamente a taxa de juros de títulos do governo federal de “longo prazo” (NTN-B de cinco anos).
....... é fundamental que ....... avaliem a proposta de uma perspectiva ampliada, buscando captar o sentido mais profundo das mudanças em curso. Nesse sentido, é preciso olhar a proposta de nova TJLP à luz das demais propostas que a atual Diretoria encaminhou e está encaminhando para entender como devemos reagir a elas. A pergunta que todos devemos fazer é para onde está apontando uma Diretoria que reduz deliberadamente o funding de longo prazo do BNDES, e agora propõe uma TJLP de mercado?
Além da possível elevação da taxa de juros de longo prazo, bem como do aumento de sua instabilidade, talvez a mais grave consequência da medida seja a mudança do papel que até hoje se atribuiu à TJLP.
A TJLP tem sido tratada como a taxa que deveria incentivar ou induzir o setor privado em direções consideradas meritórias...... ]
Outro ponto que completa o conjunto de mudanças propostas e que trazem riscos elevados para a promoção do desenvolvimento nacional diz respeito a notícia de que a equipe de Temer pretende permitir que todos os bancos tenham acesso aos recurso do FAT. Essa medida, se efetivada, provocará significativa redução de recursos no BNDES e na Caixa Econômica. A definição do BNDES como intermediário desses recursos tem base constitucional, portanto, o que está em cogitação é mais uma PEC da maldade com aqueles que mais precisam de apoio.
Finalmente neste cenário dos desmontes cabe citar a denúncia dos bancários de desvio na função social desempenhada pela Caixa Econômica Federal “Muitos empregados que hoje prestam atendimento social serão direcionados para a prospecção de clientes de alta renda e para a venda de produtos, repetindo a estratégia das instituições privadas. Essas medidas pretendem desmontar a função social da Caixa que é justamente seu diferencial por atender a nichos específicos que os bancos privados não atendem” na visão de Dionísio Reis, Diretor do Sindicato dos Bancários de São Paulo.
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