Fabrício Augusto de Oliveira
Para os que acreditam – e não são poucos – que a economia está retornando a uma trajetória de crescimento com as políticas que estão sendo implementadas pela área econômica do governo Temer, recomenda-se analisar alguns números que foram divulgados nos últimos dias sobre o seu desempenho.
O déficit primário do governo central, estimado em R$ 139 bilhões para o ano, viu este número elevar-se para R$ 197,2 bilhões, devido a um rombo detectado na revisão orçamentária de R$ 58,2 bilhões, explicado principalmente pela queda da receita projetada com a continuidade da retração da atividade econômica. Como com este “buraco” estar-se-ia descumprindo a meta fiscal anunciada e retirando credibilidade da política econômica, o governo anunciou um ajuste fiscal do mesmo montante, promovendo cortes nos gastos de R$ 42,1 bilhões, dos quais R$ 10,5 bilhões de investimentos do PAC, e receitas adicionais de R$ 16,1 bilhões, sendo R$ 10,1 bilhões oriundas das licitações de quatro usinas hidrelétricas, R$ 4,8 bilhões de reoneração da folha de pagamentos e R$ 1,2 bilhões de aumento do IOF cobrado das cooperativas de crédito. De uma maneira geral, quase todas as medidas retiram forças do crescimento econômico.
Em fevereiro, o déficit primário do setor público como um todo foi de R$ 23,5 bilhões, o maior da história para este mês, desde 2001, e, só não foi pior, porque estados e municípios geraram um superávit de R$ 5,2 bilhões neste mês, o qual costuma ser favorável para suas finanças devido à cobrança do IPVA e IPTU. Como resultado, a dívida líquida do setor público deu um novo salto para 47,4% do PIB, enquanto a dívida bruta chegou a 70,6%, dado o déficit nominal de 8,49% do PIB dos últimos doze meses. Cabe lembrar que para conter a dívida nestes limites, o governo se beneficiou tanto das receitas arrecadadas com o projeto de repatriação de recursos no exterior, que geraram perto de R$ 50 bilhões, como da antecipação do pagamento da dívida realizada pelo BNDES de R$ 100 bilhões. Para o final do ano, o governo projeta uma dívida líquida, como proporção do PIB, de 52,4%, e uma dívida bruta de 76,2%. São números que impressionam, considerando que a política econômica tem se dedicado quase que inteiramente à solução da questão fiscal.
Como as reformas previstas pelo governo, notadamente a reforma previdenciária, para dar uma solução mais de longo prazo para essa questão, começam a fazer água, já que torpedeadas pelos seus próprios apoiadores, mesmo que oportunisticamente, caso do senador Renan Calheiros, a estratégia da política econômica de primeiro “ajustar”, visando dar uma “folga” para a política monetária promover um relaxamento mais corajoso, com o objetivo de dar força ao crescimento, vai ficando cada vez mais distante. Contar com uma melhoria das expectativas dos agentes econômicos nessa situação para a retomada dos investimentos e para “voltar a crescer” afigura-se, cada vez mais, uma ilusão.
Mas não é só. Resultados divulgados sobre a atividade econômica também revelam um quadro pouco animador, apesar de registrar-se um pequeno recuo na velocidade de queda destes indicadores. Em janeiro, o setor serviços, como um todo, caiu 2,2% em relação a dezembro, enquanto o índice de atividade calculado pelo Banco Central, que leva em conta o conjunto dos setores econômico, recuou 0,26%. O nível de desemprego, fechado em fevereiro, aumentou para 13,2%, o correspondente a 13,5 milhões de pessoas procurando emprego. Isso significa menos renda e menor consumo e, portanto, menor força para os investimentos e para a atividade econômica. Não sem razão, o governo reduziu suas previsões de crescimento no ano de 1% para 0,5%, enquanto o mercado já começa a apostar em um número menor.
Tudo isso indica que há ainda um longo caminho a ser percorrido para que a modesta recuperação, que está sendo comemorada por alguns analistas apressados e divulgada como uma grande conquista do governo, se consolide. E, pior, de que se não se for além das medidas de cunho fiscal, que têm sido predominantes, e que têm se revelado infrutíferas, e se dar início à retirada de algumas travas do crescimento, caso de uma maior redução das taxas de juros e da aceleração do programa de concessões, que, até o momento, foi aparentemente bem-sucedido no caso dos filés dos aeroportos, ficará cada dia mais difícil reverter este quadro. Isso porque o investimento não será simplesmente retomado pela força do olhar esperançoso de Henrique Meirelles e as mãozinhas (estimuladoras?) do presidente Temer. É preciso bem mais que isso.
*Doutor em economia pela Unicamp, membro da Plataforma de Política Social, articulista de Debates em Rede e O Beltrano, e autor, entre outros, do livro “Política econômica, estagnação e crise mundial: Brasil, 1980-2010”.
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