Por Fabrício Augusto de Oliveira*
Os números do PIB do primeiro trimestre deste ano divulgados pelo IBGE permitem várias leituras, dependendo de quem e de como estes são analisados: a otimista, cautelosa ou pessimista.
O crescimento registrado de 1% após oito trimestre seguidos de queda parece não deixar dúvidas de que houve uma inflexão na trajetória da economia e de que esta pode estar começando a ingressar numa fase de recuperação. Foi como o presidente da República, Michel Temer, ávido por boas notícias no campo econômico para compensar seu desgaste político, saudou este resultado, decretando o fim da recessão no Brasil, argumentando que teria, em apenas um ano, recolocado a “economia nos trilhos”.
Para os que analisam os dados com mais cautela, ainda é cedo para comemorar este feito. Afinal, o crescimento ocorreu sobre uma base bastante deprimida, a do último trimestre de 2016, e, quando comparada ao mesmo período do ano anterior, registrou-se um recuo de 0,4%, com a economia continuando a se manter no patamar de 2010. E, o que mais coloca em xeque a avaliação otimista, é o fato de que tal crescimento não ter se dado de forma espalhada por todos os setores, mas alcançado graças ao desempenho espetacular do agronegócio, que conheceu uma expansão de 13,4%, visto pela ótica do produto, e de 4,8% das exportações, pela ótica da demanda.
Assim, embora tecnicamente este resultado possa indicar que a economia tenha voltado a respirar sem a ajuda de aparelhos, ainda é cedo para dizer por quanto tempo isso será possível, pois enquanto, do lado do produto, a indústria e os serviços continuam prostrados, do lado da demanda, o consumo das famílias, do governo e os investimentos, que respondem por mais de 90% do PIB, continuam em queda. Não sem razão, houve uma revisão para baixo do crescimento feita por quase todas as instituições de pesquisa tanto para 2016 como para 2017: no primeiro para algo em torno de 0%; no segundo para não mais que 2%.
Se a essa leitura mais realista adicionarmos o aprofundamento da crise política, que deve paralisar as reforma de agrado do mercado que estavam em andamento e a deterioração das expectativas dos agentes econômica ante as incertezas provocadas com essa paralisação sobre o futuro da economia, fica evidente que a tênue luz que se acendeu no final do túnel pode rapidamente se apagar pelo fato de o país ter sido jogado numa encruzilhada com este imbróglio político, do qual não parece haver absolutamente saída.
A hipótese de continuidade de Michel Temer à frente do governo, que se torna cada vez mais difícil, não representa mais nenhuma garantia de que as reformas terão continuidade e de que serão aprovadas, o que seria essencial para dar algum impulso a este pequeno ensaio de crescimento. Com uma base de apoio no Congresso despedaçada, sem desfrutar de qualquer respeito da opinião pública, seu governo, tornado agora ainda mais ilegítimo, não deve conseguir mais nenhuma mudança essencial para manter a economia na trajetória do primeiro trimestre.
A hipótese, com a sua queda, de realização de uma eleição indireta de um novo presidente pelo Congresso, colocará o país, por alguns meses, sob o governo do presidente da Câmara Federal, Rodrigo Maia, outro político investigado na Lava Jato, até a conclusão do processo. Dificilmente, o nome que for escolhido para comandar o país desfrutará de qualquer legitimidade para promover mudanças necessárias para dar forças a essa recuperação, mesmo por que não disporá de tempo suficiente para a montagem de uma nova equipe, para fazer as articulações políticas exigidas e para implantar as medidas que vierem a ser aprovadas.
Por último, no caso de uma eleição direta, como vem sendo defendido e proposto principalmente pela esquerda no país, além de mudanças na ordem constitucional, que demandam tempo, também o tempo exigido para a sua preparação e realização, mostra que isso não ocorrerá, com otimismo, antes do final do ano, sem considerar os custos que uma eleição representa. Enquanto isso, o país continuaria praticamente sem governo e, o que for eleito, também não disporia de tempo suficiente para sequer se organizar para governar, a menos que não se limitasse a um mandato tampão de um ano, mas que o mesmo fosse definido para um mandato normal de quatro anos.
A verdade é que o Brasil, pela falta de compromissos dos políticos com a população, preocupados apenas com seus interesses particulares e familiares, foi jogado numa encruzilhada que não parece oferecer qualquer saída e que a réstea de luz lançada na economia neste primeiro trimestre pode rapidamente se apagar e trazer de volta a recessão que nele se instalou desde 2014.
*Doutor em economia pela Unicamp, membro da Plataforma de Política Social, colaborador do Debates em Rede e O Beltrano, e autor, entre outros, do livro “Política econômica, estagnação e crise mundial: Brasil, 1980-2010”.
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