Fabrício Augusto de Oliveira*
O governo Temer divulgou, no dia 29 de junho, a decisão de reduzir a meta da taxa de inflação oficial, medida pelo IPCA/IBGE, de 4,5% para 4,25%, em 2019, e para 4%, em 2020, com intervalo de confiança de 1,5 ponto percentual para cima ou para baixo. Isso significa que, em 2019, a inflação poderá oscilar entre 2,75% e 5,75% e, em 2020, entre 2,5% a 5%, que haverá cumprimento da meta, embora o ideal, para o mercado, seja que ela não ultrapasse o centro da meta de 4,25% e 4% nestes dois anos.
Não deixa de ser uma medida ousada, considerando o crítico desequilíbrio fiscal que enfrenta o país, com elevados déficits primários nas contas públicas, que devem perdurar por mais alguns anos, e uma relação dívida bruta/PIB que não deve encontrar dificuldades para atingir 80%. Se a isso for somado a instabilidade política que deve se manter até o final de 2018, quando se encerra o mandato do atual presidente, bem como o fato de que até lá as expectativas dos agentes econômicos devem permanecer altamente desestabilizadas, essa decisão pode ser vista apenas como um jogo de cena do governo, visando transmitir maior confiança na política econômica que simplesmente não existe na atualidade.
É possível, no entanto, acreditar que não haverá maior dificuldade para atingir a nova meta estabelecida para a taxa de inflação, caso a atividade econômica continue a ser asfixiada como vem ocorrendo desde 2015. Neste ano, dois índices de inflação, o IGP-DI e o IGP-M, registraram deflação entre janeiro e maio.: o primeiro, de -1,63%, e, o segundo, de -1,96%. Já o índice oficial de inflação, o IPCA/IBGE, apresentou variação acumulada até maio de 1,42%, mas já recuou 61% no acumulado de 12 meses, caindo de 9,32% em maio de 2016, quando Temer assumiu o governo, para 3,6% em maio deste ano. O mesmo comportamento que se verificou para o INPC/IBGE que, no ano, registrou variação acumulada de 1,43%, com queda de 9,35% para 3,35% no mesmo período e recuo ainda maior de 66%.
Não existe maneira melhor de debelar a inflação do que a de retirar os sopros de vida da atividade econômica, destruindo empregos, renda e esperança da população. Nessa questão, os atuais condutores da política econômica vêm demonstrando uma inegável capacidade, vendendo o mantra para a população de que o crescimento só pode retornar com a realização de um ajuste fiscal convincente para trazer de volta os investimentos. Não bastasse a falácia deste argumento, de que nada há a fazer, enquanto não se conclui o ajuste fiscal, as medidas de austeridade que têm saído de suas mentes criativas, retiram ainda mais forças da economia e devem, por seus efeitos, continuar mantendo a arrecadação despencando em termos reais, indicando que o ajuste pretendido se torna cada vez mais improvável e, com isso, qualquer chance de se retornar proximamente à trajetória de crescimento, a prevalecer essa visão do pensamento conservador.
A este respeito, mesmo o argumento de que a redução da taxa nominal de juros, a Selic, de 14,25% para 10,25% entre outubro de 2016 e maio de 2017, pode contribuir para a retomada do crescimento, deve ser vista com cautela. Isso porque a inflação tem recuado a uma velocidade bem maior que a taxa nominal de juros, significando que, em termos reais, essa tem se elevado. Enquanto o IPCA recuou 61% entre maio de 2016 e maio de 2017, a queda da Selic não passou de 28% neste mesmo período. Ora, se o custo real do investimento tem aumentado em termos reais, em que medida o empresário se sentirá estimulado para investir? Eficiente para demolir ensaios de expansão econômica que produzam fricções na economia e coloquem em risco as recomendações emanadas da ortodoxia, seus representantes enfrentam grandes dificuldades para abrir caminhos para pavimentar os caminhos do crescimento, pois isso significaria ter de realizar reformas estruturais que, de modo geral, prejudicam as classes dominantes.
Se o governo divulgou a nova meta, visando colher aplausos e demonstrar tranquilidade na atual turbulência política de que conta com uma política econômica competente e confiável, ou mesmo para desviar o foco das atenções que tem merecido as denúncias sobre o presidente realizadas pela Procuradoria Geral da República, parece ter errado o alvo, pois nem mesmo o mercado manifestou grande entusiasmo com a medida. Depois de três anos de recessão, seria mais bem-vinda alguma medida pró-crescimento, mas seria esperar demais de uma equipe econômica que não demonstrou, pelo menos até o momento, saber lidar com essa questão, e não de uma que se vale exatamente da falta do crescimento para se tornar viável.
* Doutor em economia pela Unicamp, membro da Plataforma de Política Social, colunista do Debates em Rede e de O Beltrano, e autor, entre outros, do livro “Política econômica, estagnação e crise mundial: Brasil, 1980-2010”.
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