Por Aylê-Salassié F. Quintão
Só mesmo Temer e Meireles, agarrados às amarras da Pinguela de FHC, conseguem fazer previsão de futuro. Acalentar sonhos neste momento exige que se livre previamente das chamadas “permanências”, esses rastros de coisas extintas que insistem em desafiar a realidade, a Lava Jato, e que pretendem sobreviver às eleições. O mundo, já entrou na “sobre modernidade” (Augê, 2008), andando acelerado, mas os brasileiros arrastam-se ainda desorientados pelos caminhos do presente.
Tudo se desenvolve por aqui lento, e marcado pela presença ativa de agentes e concepções arcaicas. Torna difícil acreditar em promessas e fantasias. Reformas efetivas, seja a da previdência, a política, a trabalhista e outras, tramitam em fragmentos pela eternidade, emperradas por emendas, pedidos de vista, e até pelos rituais instaurados nos regimentos internos do Congresso e do Judiciário. Nunca são alcançadas pela legislação penal.
Os usos e costumes remanescentes nesta nossa zona periférica de conforto ainda resultam dos vestígios das relações sociais de produção herdadas do sistema produtivo primário, que subsistem em meio ao processo de industrialização e o tecnologizado. As contradições geradas tem conduzido as sociedades à pós-modernidade, desarrumando a vida dos humanos, fazendo aflorar a confusão, o individualismo e o hedonismo, trazendo o caos. Vão configurando novas faces para a cidadania, por meio de uma história em movimento.
Mesmo sob o peso dessas armadilhas na vida política, o País não pode ignorar os valores sobre modernos que estão chegando, e se instalando de maneira caótica para tornar a vida dos futuros governantes ainda mais dramática. A sociedade reclama por um rearranjo. A sobre-modernidade vem agregando paradigmas que desenraízam os cidadãos, lugares e ideologias e desafiam a relação com o mundo, reinstalando as pessoas no seu tempo.
E que tempo é esse? O tempo de cada um é o da sua geração. Os das gerações Lolapaloosa ( X,Y, Z), futuros governantes do País, é o da superabundância de acontecimentos, de referências e de acelerações na vida (produtividade, comunicações, conhecimento). Produz alterações físicas de grande impacto, com a apreensão e uso de espaços, de objetos e lugares, desnaturalizando-os. Nessa corrente, são apanhados também os espaços para o dinheiro, para a politicagem e para aqueles que sobrevivem das permanências. Tente a ampliar-se no campo da equidade, e a estreitar-se para a falta de ética dando lugar à sustentabilidade, aos direitos humanos, à solidariedade e à qualidade de vida.
No bojo da sobre-modernidade, vem aí - não se sabe quando chega por aqui - uma gestão de vanguarda, capitaneada por “empresas humanizadas”, comprometidas com seu espaço de relação: comunidade sede, famílias de operários e consumidores. É o que os sociólogos John Mackey e Sisodia Rajendra chamam de "Capitalismo Consciente"(2013) . As lideranças empresariais de Davos, vem fazendo uma leitura sistemática das recomendações dos fóruns sociais (Porto Alegre) e, aos poucos, incorporam a ideia da existência da missão ajudar a desenvolver seres humanos melhores para o mundo, num contexto em que todos prosperem.
Grandes empresas como Google, Southwest Airlines, Whole Foods Market, Patagonia, e UPS adotaram em sua gestão aspectos construtivos capazes de criar valor não só para si mesmas, mas também para seus clientes, funcionários, fornecedores, investidores, a comunidade e o meio ambiente. São empresas que já apostam em um futuro mais cooperativo e humano. Sílvia Faciolongo, CEO da Orhion Evolução e Crescimento Humano, dispõe de um levantamento sobre empresas de práticas humanizadas nos Estados Unidos entre 1998 e 2013, onde é mostrado que elas tiveram um retorno acumulado de 1.681%, contra 118% do S&P 500 (índice composto por quinhentos ativos (ações) cotados nas bolsas de NYSE e NASDAQ). “Periféricos”, obsoletos, irresponsáveis”: são qualificativos que, com raras exceções, adequam-se bem ao brasileiro deste momento. Como estamos atrasados!...
Assim, o mundo dos negócios na Europa e nos Estados Unidos vai sendo invadido pelos valores humanos e ambientais sobre-modernos, desautorizando vagarosamente as grandes apropriações privadas, tendendo a provocar um encolhimento do lucro financeiro, símbolo da riqueza e, enquanto tal, acumulador de Poder. Dificilmente a tendência por uma distribuição de oportunidades e de renda mais equitativa poderá continuar a ser negligenciada pelas grandes corporações. Vale lembrar as queimas de garagens de ônibus, os “roleizinhos” nos shoppings centers e os “ arrastões” no comércio de São Paulo e nas praias do Rio de Janeiro, há dois anos, sem que pudessem ser aplicadas sanções penais vigorosas. É a sobre modernidade.
*Jornalista, professor, doutor em História Cultural
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