Por Fabrício Augusto de Oliveira*
O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, continua aprontando e apequenando o país perante o mundo. Dono de um temperamento irado, indócil e previsível, bombardeado por escândalos sexuais e políticos e por seguidas divergências e escaramuças com os quadros de seu próprio governo, a ponto de já ter demitido trinta e seis em apenas um ano, Trump, no campo da economia, tem arrastado os Estados Unidos para comungar com a visão tosca e anacrônica das regras econômicas que prevaleceram no passado longínquo das primeiras décadas do século XX. Por isso, tem perdido apoio até mesmo entre os seus pares republicanos, tornando cada vez mais provável que poderá ser apeado do poder antes mesmo da conclusão de seu mandato.
Depois de aprovar uma insensata reforma tributária em dezembro do ano passado, que aliviou o pagamento para as empresas e os contribuintes – pessoas físicas – mais ricos, a qual causou protestos até mesmo dos mais endinheirados do país, Trump decidiu, agora, jogar uma rede protecionista para setores econômicos da segunda revolução industrial, o aço e o alumínio, com a justificativa de defender o emprego do trabalhador norte-americano. Em plena era de globalização e de queda das fronteiras nacionais para os produtos e serviços da indústria, do comércio e das finanças, o tiro de Trump pode sair pela culatra e desencadear uma guerra comercial prejudicial para toda a economia mundial.
A alíquota de 25% (era de 0,9%) sobre o aço importado pelos Estados Unidos e de 10% para o alumínio (contra os 2% anteriores) afeta vários países exportadores destes produtos, mas são altamente prejudiciais especialmente para a China e o Brasil. A China, principal produtor mundial de aço e alumínio, mas que pouco exporta diretamente este material para os Estados Unidos, pode ver interrompida a triangulação que faz com outros países para colocar o mesmo no mercado norte-americano. Já o Brasil, aparece como o segundo maior exportador de aço para o país, atrás apenas do Canadá, com exportações que representam um terço de suas vendas deste produto para o exterior. Países como Coreia do Sul, Japão, Índia e China, juntamente com o Brasil, sinalizam contestar a medida na Organização Mundial do Comércio (OMC), mas este processo demanda tempo. A União Europeia, por sua vez, ameaça retaliar o país com a adoção de medidas contra US$ 3,5 bilhões de produtos americanos importados pela região, incluindo bicicletas e uísque Bourbon.
Ao contrário do que Trump prevê, a economia e o emprego dos americanos podem ser prejudicados. Setores que dependem destes produtos para sua produção, como os da construção, automotivo, siderúrgico e petrolífero, devem ver aumentados os seus custos, com rebatimentos sobre a inflação que tem se mostrado sob controle, mesmo com a recuperação mais sólida da economia. Economistas projetam estimativas de perdas de 180 mil empregos americanos com a medida e um enfraquecimento das forças do crescimento da economia de 2,7% prevista para este ano pelo FMI com impactos deletérios para o resto do mundo.
Trump tem se revelado, o que já era esperado, um populista de direita que quer mover a roda da história para trás para favorecer os ricos e setores econômicos da segunda revolução industrial, em plena era da globalização. Com a reforma tributária, jogou para escanteio a importância do sistema de impostos progressivos para corrigir os defeitos congênitos do capitalismo, visando permitir que o sistema econômico se reproduza sem maiores tensões sociais que podem conduzi-lo ao colapso. Com as medidas protecionistas anunciadas, ensaia descer pela mesma escada que os países desenvolvidos haviam retirado do alcance das economias em desenvolvimento para impedir que fossem economicamente alcançados pelas mesmas, para usar uma expressão de Chang no livro “Chutando a escada”. Sem essa escada, pode pisar no vazio e desabar sem encontrar apoios que aparem sua queda. E levar junto a economia mundial.
Pode ser que Trump tenha sentido também inveja da Inglaterra com o seu “brexit” contra a globalização e resolvido dar, ele próprio, mais um empurrão neste processo. Uma sandice e um retrocesso inadmissível para os que defendem a nova ordem econômica mundial.
*Doutor em economia pela Unicamp, membro da Plataforma de Política Social, articulista de Debates em Rede e O Beltrano, e autor, dentre outros, do livro “Economia e Política das Finanças Públicas no Brasil: um guia de leitura”.
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