Por Fabrício Augusto de Oliveira*
Paulo Guedes, da Escola de Chicago e futuro ministro da economia do governo Bolsonaro, está montando uma equipe coesa, com membros formados na mesma escola ou que partilham do pensamento neoliberal. Como Guedes, Joaquim Levy, indicado para a presidência do BNDES, Roberto Castelo Branco, para a da Petrobrás, e Rubens Novaes, para a do Banco do Brasil, passaram pelos bancos dessa escola e ali receberam os ensinamentos de Milton Friedman de ser o Estado a “encarnação do mal”.
Mansueto Almeida, indicado secretário do Tesouro Nacional, Carlos von Doellinger, presidente do Ipea, Roberto Campos Neto, do Banco Central, e Pedro Guimarães, da Caixa Econômica Federal, não beberam na mesma fonte de Chicago, mas se formaram e rezam a mesma cartilha deste pensamento. Isso significa que se trata de uma equipe altamente homogênea, doutrinada na aversão ao Estado e na crença de ser o mercado capaz, por si, de corrigir as distorções do sistema e garantir a felicidade geral da população, desde que os indivíduos possam livremente tomar suas decisões.
Milton Friedman, um dos pais da filosofia neoliberal, conseguiu a proeza de restringir o objetivo da ciência econômica ao controle da inflação e apontar o Estado como a causa primária da ineficiência e instabilidade do sistema, por seus gastos excessivos e inúteis para a economia e a sociedade, devendo por isso ser contido em seus objetivos de expandir o emprego e reduzir as desigualdades sociais, por meio do aumento da oferta de moeda. Suas ideias foram colocadas em prática no governo do ditador chileno, Augusto Pinochet, na década de 1970, e depois embasaram as políticas dos governos de Ronald Reagan, nos Estados Unidos, e de Margareth Thatcher, na Inglaterra, para quem a sociedade não passa de uma “abstração”, e apenas o “indivíduo” em seu desejo de enriquecer deve ser levado em conta pela ciência.
Mesmo que tais políticas tenham conduzido a economia para um quadro de baixo crescimento, elevado desemprego, aumento das desigualdades e da pobreza, acabaram tornando-se dominantes com o avanço do processo de financeirização e de globalização da economia porque, com elas, garante-se a multiplicação e a proteção da riqueza acumulada que está nas mãos de poucos “indivíduos”. Mas isso não tem a menor importância para este pensamento, por se tratarem de vencedores, os que fazem escolhas acertadas e eficientes, e são estes, e apenas estes, que merecem receber a benção dos céus e da riqueza.
A fórmula apresentada para a reforma da economia chilena pelos “Chicago-boys”, como passaram a ser conhecidos os economistas de Pinochet, e que se consagraria como o modelo virtuoso das política neoliberais, contemplava: i) remoção completa das barreiras das importações; ii) liberalização completa do mercado financeiro e dos fluxos internacionais de capitais; iii) redução do tamanho do Estado, com um amplo programa de privatização das empresas estatais, incluindo, neste processo, os sistemas de saúde e da previdência social; iv) eliminação de qualquer controle de preços da economia; v) realização de uma reforma tributária para diminuir a tributação sobre as corporações, o patrimônio e as camadas de mais alta renda; vi) repressão e desarticulação dos movimentos sindicais e de partidos da esquerda.
Tirante alguns elementos mais característicos daquele período, os demais não diferem muito dos que vêm sendo defendidos pelos “Chicago-oldies” como têm se autointitulado a nova trupe da equipe econômica de Bolsonaro: tornar prioridade absoluta da política econômica o combate à inflação; reduzir ao máximo possível o peso do Estado, colocando travas na expansão do gasto social e avançando no processo de privatização das empresas estatais; criar mecanismos mais eficientes para controlar suas ações – tipo Banco Central independente -; e abrandar a tributação sobre o capital e as rendas mais altas sob o argumento de tais medidas serem necessárias para controlar a inflação e garantir o retorno dos investimentos para a retomada do crescimento. É a mesma fórmula que tem mantido o sistema econômico mundial num quadro de baixo crescimento, elevado desemprego e de instabilidade e que, implementada no Brasil por Joaquim Levy e Henrique Meirelles, nos governos de Dilma Rousseff e de Michel Temer, garantido ao país manter-se prisioneiro da recessão e da estagnação.
Se Bolsonaro, que nada entende de economia, continuar garantindo carta branca para os Chicago-oldies neste campo, o país pode se preparar para enfrentar dificuldades econômicas e tensões sociais ainda maiores durante a sua administração, o que tudo indica, até o momento, ser o cenário mais provável. Para uma escola que considera que os pobres atrapalham a boa gestão econômica, por que necessitam de políticas do Estado, não existe outra saída senão a de seu extermínio. A proposta de extinção do 13º salário pelo vice de Bolsonaro, general Hamilton Mourão, se ajusta perfeitamente à essa filosofia e à investida que pode ser desfechada contra os trabalhadores no futuro governo.
*Doutor em economia pela Unicamp, membro da Plataforma de Política Social e articulista de Debates em Rede e o Beltrano, e autor, dentre outros, do livro “Política econômica, estagnação e crise mundial, Brasil 1980-2010”.
Não há comentários postados até o momento. Seja o primeiro!