Por Daniel Sampaio* e Rafael da Silva Barbosa**
A crise sanitária global instalada pelo Covid-19, veio mostrar, entre outras, a importância da capacidade instalada das agências bancárias nesse território, que tem mais de 8 milhões km². Um exemplo nesse sentido é a atual política de auxílio emergencial no valor de R$ 600,00 realizados pelo governo federal por intermédio da Caixa. A existência da oferta dos serviços bancários públicos garante maior possibilidade de acesso e de diminuição nos deslocamentos, evitando-se aglomerações e sendo fatores importantes para o atendimento de demandas em regiões mais distantes de núcleos urbanos de maior porte, especialmente para famílias de baixa renda, onde o acesso ao transporte coletivo, muitas vezes, é um fator de bloqueio. Portanto, é sempre bom lembrar o papel que teve o Estado no processo de desenvolvimento das relações de produção no território brasileiro e que suas funções vão para além da geração de lucro ou valor para o acionista, típicas do setor privado.
Para ilustrar a questão, vamos aos dados. O Banco Central do Brasil divulga periodicamente estatísticas referentes ao setor financeiro no Brasil, sendo uma das fontes de informações mais completas para compreender a dinâmica bancária e financeira nacional. Em relação à quantidade do número de instituições e agências bancárias houve uma mudança na metodologia da pesquisa a partir da metade do ano de 2016, justo no período de inflexão política marcada pelo Golpe, o que inflou os números, pois incluiu outros estabelecimentos do sistema financeiro não-bancário, o que proporciona a falsa impressão de crescimento das agências e instituições financeiras. Isso justifica a criação de duas categorias na Tabela 1: a “contínua” representa a série tal qual divulgada pelo Banco Central, e a “ajustada” buscou mensurar o número de agências e instituições financeiras caso não tivesse ocorrido a mudança na metodologia.
De acordo com os dados disponíveis pelo Banco Central do Brasil (Bacen), o número de agências bancárias cresceu consideravelmente entre 2007 e 2016, com 4.344 novas unidades (Tabela 1). Entretanto, a partir de 2016 ocorreu uma inflexão desses números na série “contínua”, mas principalmente na “ajustada”, com redução em 2.822 unidades, fruto da crise política e econômica que pode ser atribuída ao Golpe de 2016, que deprimiu a economia com severas perdas sociais no período. O primeiro impacto dessas mudanças foi o aumento no tempo de espera por serviços básicos bancários com maiores filas.
O principal banco público, o Banco do Brasil, perdeu mais de 1 mil agências na virada de 2016 até abril de 2020, enquanto a Caixa Econômica Federal, o segundo maior, parou de crescer exatamente no ano de 2016. Dos bancos privados, o Bradesco mantém seu nível; o Itaú encolheu abruptamente; e o Santander segue em crescimento (Gráfico 2).
Gráfico 2 – Número de agências das Cinco Maiores Instituições Bancárias no Brasil
Em 2008, o Itaú fez uma fusão com Unibanco, por isso para 2007 foi somado as agências das duas instituições de 2.505 e 930, respectivamente, resultando num total de 3.435.
Em 2008, o Santander fez uma fusão com ABN AMRO Real S.A., por isso para 2007 foi somado as agências das duas instituições de 1.111 e 1.069, respectivamente, resultando num total de 2.180.
Dentre os principais bancos no Brasil percebe-se um crescimento da participação dos bancos privados relativamente aos públicos, principalmente após 2016. Esta modificação pode estar relacionada com processo de reestruturação bancária pública marcada pelo avanço das políticas de austeridade, cuja meta principal é reduzir a participação do Estado na economia. Além disso, percebe-se a presença na presidência do Banco Central do Brasil de figuras ligadas a estes principais bancos privados. Henrique Meirelles, historicamente ligado ao BankBoston (cujos ativos no Brasil foram vendidos ao Itaú em 2006), dirigiu a instituição entre 2003 e 2010; Alexandre de Tombini, funcionário de carreira do Banco Central, presidiu a instituição entre 2011 e 2016, e , após este período, foi diretor do Fundo Monetário Internacional (FMI) e representante-chefe para as Américas no Banco Internacional de Compensações (BIS) ; Ilan Goldfajn, historicamente ligado ao Itaú, presidiu a instituição entre 2016 e 2019; e, Roberto Campos Neto, historicamente ligado ao Santander, é presidente desde 2019.
No que tange ao alcance regional dos bancos, a distribuição por grandes regiões das unidades públicas é mais homogênea do que o setor privado. Enquanto o setor público concentra 44% das suas unidades na Região Sudeste, com distribuição equivalente entre as regiões Nordeste e Sul, com 20% em cada; o setor privado concentra 61% na Região Sudeste e mostra maior desequilíbrio nas demais regiões.
A capilaridade da estrutura bancária pública potencializa as medidas públicas para o enfrentamento dos efeitos da Covid-19. Entre as mais importantes, a ampliação do crédito as micro e pequenas empresas, as maiores geradoras de empregos, deve ser foco primordial. O objetivo deve ser a manutenção dos empregos e do nível de renda com vistas a evitar um colapso geral do sistema e da vida das pessoas.
* Economista, doutor em Desenvolvimento Econômico (IE-UNICAMP), professor Adjunto de Economia da Universidade Federal do Espírito Santo (UFES).
** Economista, doutor em Desenvolvimento Econômico (IE-UNICAMP), pós-doutorando em Política Social da Universidade Federal do Espírito Santo (UFES) e colunista do Brasil Debate.
Nota: Artigo publicado também por Brasil Debate.
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