Por Erlon José Paschoal *
Nestes momentos de confinamento, de isolamento social, no qual o ritmo frenético do cotidiano capitalista é freado pelas circunstâncias novas, provocadas por uma pandemia, fui impulsionado a refletir sobre o tempo.
Mas o que é o tempo? Na famosa frase de São Agostinho há uma dica: “se não me perguntam, sei o que é, mas se me perguntam, não sei responder”. Por sua vez, o filósofo austríaco Ludwig Wittgenstein, usando uma frase coloquial em inglês, afirmou – em um sutil jogo de palavras – que “What time is it?” é uma pergunta cotidiana, usual, mas “What is the time?” é uma questão profundamente filosófica.
Na mitologia grega, Cronos, o Tempo, filho de Urano (o Céu) e de Geia (a Terra) devorou os filhos para não ser destruído por eles, mas um deles, Zeus, conseguiu enganá-lo e assim mata-lo, reestabelecendo a ordem natural das coisas, a de que os filhos sobrevivem aos pais, os netos sobrevivem aos filhos, os bisnetos aos netos e assim por diante.
Para os gregos o tempo era cíclico, de acordo com os movimentos da natureza, o dia e da noite, as estações do ano, as marés, as chuvas, as colheitas etc. O eterno retorno estava devidamente introjetado no ser humano de então, como algo natural. Até hoje muitas línguas ainda denominam os dias da semana com elementos da natureza. Em inglês, segunda-feira, por exemplo, é Monday, em alemão Montag, em espanhol lunes, em italiano lunedi... o dia da Lua.
Mas afinal o tempo existe ou não? Para Newton, por exemplo, o tempo era uma dimensão absoluta, existia fora de nós, um componente objetivo do universo. Para Kant, por outro lado, o tempo era algo subjetivo, humano, não era algo dado a priori, mas pertencia à psique humana, como um dado presente na consciência. Neste sentido, o tempo não existe para os animais, seres sem consciência, que vivem um eterno presente contínuo.
Depois da revolução francesa, que pretendia começar a contar o tempo a partir do zero, não mais a partir do nascimento de Jesus – a chamada secularização que retiraria as marcas temporais impostas pela religião -, o tempo passou a ser medido com maior exatidão matemática. As noções de progresso e determinismo histórico impuseram uma visão de avanço científico e cultural ininterrupto e inevitável. Um tempo linear e incessante A invenção do relógio mecânico na ocasião estabeleceu a precisão, tornou-se uma convenção social, que mudou o cotidiano de todos, sobretudo, no trabalho e no convívio coletivo.
Nesta mesma época, nos EUA, Benjamin Franklin disse a famosa frase “Time is Money!”, que se tornou um dos principais mantras do capitalismo moderno.
Agora com a teoria da relatividade, da física quântica, as ondas gravitacionais, a curvatura do espaço-tempo e os buracos negros, o tempo passou a ser considerado de formas diversas e ainda inacessíveis à maioria das pessoas. Neste sentido, a relação entre tempo e velocidade no universo por vezes nos causa dúvidas e assombros. Basta ler nos manuais, por exemplo, que a Terra gira ao redor do Sol (translação) a 107 mil km/h, e em torno de seu próprio eixo (rotação) a 1.700 km/h, na região do Equador. Por sua vez, o Sol completa uma órbita na Via Láctea a cada 225 milhões de anos — viajando a mais de 777 mil km/h. Somando tudo, nós, terráqueos, estamos nos deslocando junto com o sistema solar pela galáxia a 871.781 km/h! E para completar temos ainda a velocidade com a qual a Via Láctea inteira se move no universo. Inimaginável!
Mas aqui na Terra, vivemos muitas vezes escravizados e enredados na sequência temporal determinada pelo trabalho, pelos prazos, pelos compromissos e pelas necessidades de sobrevivência no cotidiano capitalista controlado agora, e muito bem controlado, pelas novas tecnologias e por inúmeros instrumentos que povoam e dominam nossas relações.
Enfim, se tiver um tempinho, reflita sobre isso também!
* Gestor cultural, Diretor de Teatro, Escritor e Tradutor de alemão.