Por Erlon José Paschoal *
Os Galpões do IBC em Jardim da Penha parecem já estar no inconsciente coletivo da cidade, sobretudo daquela região, como um Centro Cultural, amplo e repleto de ofertas de atividades artísticas, de trocas de conhecimentos e de saberes e de espaços de produção em diversas áreas da vida cultural e econômica.
Vale lembrar que em nosso Estado a prestação de serviços, a inovação e a criatividade tendem a superar as atividades produtivas predatórias nocivas ao meio ambiente e à convivência social saudável e igualitária, e neste aspecto a cultura ganha um papel de destaque, como um campo nobre de opções de serviços e de renda. Além disso, as nossas influências étnicas, os talentos das juventudes e o vigor das manifestações culturais nas mais diversas linguagens artísticas em todos os estratos sociais, apontam para perspectivas promissoras em nossa evolução socioeconômica e cultural.
O conceito contemporâneo de cultura abrange a cidadania, a convivência democrática, a diversidade de expressões, as novas tecnologias e a ética. A cultura é livre, aberta, plural e, se há um caminho que ressignifique as conquistas da civilização, valores como justiça, liberdade e paz, ele passa pelo entendimento do papel da cultura no processo de transformação social. Nesse sentido, ela se articula com o conjunto de políticas públicas, prioritariamente com as de educação, turismo, ação social e desenvolvimento econômico.
Desse modo, as artes e a cultura são fatores de aprimoramento social e econômico e revelam, sobretudo, o manancial criativo do universo simbólico de um povo. A cultura tem assim um papel estratégico na construção de um Estado socialmente mais justo e igualitário. Não é algo meramente decorativo, ornamental, mas a base da elaboração e da revalorização da identidade, fundamental para o desenvolvimento socioeconômico, e capaz de gerar trabalho e redistribuir renda.
E neste momento pós-pandemia, o grande desafio será ressignificar os espaços e a convivência pública, com base nas novas formas de aproximação, de contato e de trocas com nossos semelhantes, apoiados, sobretudo, pelas novas tecnologias e por seus desdobramentos.
Por outro lado constata-se que a cidade de Vitória tem um déficit gigantesco no tocante à estruturação e à manutenção de espaços e equipamentos culturais, quase todos sucateados. Do Cais das Artes abandonado, passando pela Fábrica de Ideias, o Mercado São Sebastião, o Forte São João, o Mercado da Capixaba, o Maes e o Teatro Carlos Gomes fechados há alguns anos, o Majestic, o antigo Arquivo Público e o prédio das Fundações na cidade alta, e culminando com o Centro Cultural Carmélia M. de Souza totalmente jogado às traças, é algo que causa espanto e indignação aos habitantes da cidade. Que isto nos motive ainda mais para lutar pela sua existência!
No documento Vitória do Futuro – a Agenda 21 de Vitória –, elaborado a muitas mãos em 1996 e republicado em 2003, a comunidade local e inúmeros ativistas da cultura manifestaram um forte desejo de fazer dos Galpões do IBC um espaço cultural de relevo para a Zona Norte da cidade, que carece de equipamentos culturais públicos, com exceção da estrutura do SESI e do campus da UFES. E ao longo destas últimas duas décadas, muitos se ocuparam deste tema e desta proposta.
Com a ameaça imediata da sua privatização por parte do governo federal - que, como sabemos, planeja a venda de praticamente todos os bens públicos e o desmanche de todas as políticas inclusivas que visem ao bem-estar coletivo-, e das respectivas consequências imprevisíveis para a região, faz-se necessária a mobilização de todos os que consideram importante a valorização das relações humanas e do desenvolvimento, tendo a cultura como fio condutor e, sobretudo, das instituições com perfil de administrar e efetuar a gestão de um espaço destas proporções, tais como, as secretarias de Cultura do Estado e do Município, o IFES, a UFES, o Sebrae e a FINDES.
Já houve uma excelente experiência de parceria destas instituições, por ocasião do lançamento do Plano transversal Brasil Criativo pela Secretária de Economia Criativa do então Ministério da Cultura, Claudia Leitão, para apoiar o micro e o pequeno empreendedor criativo. As reuniões entre representantes das referidas instituições abriu portas para a futura criação do Observatório da Economia Criativa, com o propósito de fomentar, capacitar, difundir e mapear as atividades criativas e seus impactos no desenvolvimento econômico de nosso Estado. O conjunto destas instituições seria um excelente caminho para se criar um grupo de trabalho visando ao cumprimento, por parte do governo federal, do acordo feito no ano passado com o Governo do Estado, e à gestão dos Galpões.
Portanto, o momento é de luta e de mobilização pela entrega destes Galpões, como foi acordado, ao poder público do Estado em prol da coletividade, e a formação de parcerias transversais para se debater e elaborar formas de ocupação e de gestão deste importante Centro Cultural para a cidade de Vitória e o Estado do Espírito Santo.
Os novos tempos exigem rapidez, flexibilidade e uma enorme capacidade de adaptação às mudanças. Que estejamos todos fortes e preparados para construir as possibilidades que o futuro nos oferece.
* Gestor cultural, Diretor de Teatro, Escritor e Tradutor de alemão.