Por Ricardo Coelho dos Santos*
Se os adultos lessem mais histórias infantis, minimamente para fazer seus filhos ou netos dormirem, talvez adquirissem um pouco mais de sabedoria. Nos dias de hoje, usar algumas das expressões da minha meninice carece de explicação adicional. Uma seria “matar a galinha dos ovos de ouro”.
Essa fábula foi narrada desde 600 a.C. por Esopo, um escravo grego que mostrou interessantes aspectos do comportamento humano através de fábulas. A Galinha dos Ovos de Ouro narra que um casal passou a viver melhor depois que sua galinha passou a colocar ovos de ouro maciço. Isso veio a resolver muitos problemas, mas, para ficarem mais ricos ainda, resolveram matar a galinha para extrair seu supostamente rico conteúdo interno. E veio a decepção: era uma galinha normal, em nada diferente das demais, só que agora, morta, não geraria mais riquezas ao casal.
Muitas interpretações poderiam ser tiradas dessa alegoria de fundo moral. Eu também me arrisco a dar meu palpite.
O primeiro, seria sobre a privatização da Petrobras. Está sendo conduzida por economistas que usam somente as desculpas que mais lhes convêm, sem conhecer realmente o problema da geopolítica do petróleo. Em todos os países, o governo controla suas empresas petrolíferas, seja como estatais, seja manipulando a iniciativa privada, por se tratar de uma séria questão estratégica de defesa. Governos com petrolíferas estatais não querem abrir mão disso, mesmo que essas possuam a autonomia que a Petrobras realmente nunca teve.
Mas nosso assunto não fica só na economia. A Cultura, também, é envolvida. Ela pode estar tanto nas manifestações populares, mesmo de caráter religioso, como também na erudição dos clássicos, sejam esses musicais ou artes plásticas. Então, toda arte é cultura. Nem todos aceitam todas as culturas, mas o respeito às diferenças culturais é tão fundamental como o respeito à escolha dos gêneros ou às diferenças raciais. Os ovos de ouro aqui são a confirmação da cidadania do povo. Dessa maneira, temos galinhas, gansas (outra versão da fábula coloca uma gansa, no lugar da galinha), patas… Que sejam urubus e ornitorrincos, não importa. Os ovos são de ouro. Se eu gosto de galinha e outros de perua, não matemos nem uma, nem outra. Mas aproveitemos os ovos!
E também, com isso, vem a História! Se há Cultura, há História. A Cultura foi um dos ovos de ouro que acabaram chocando dessa importante galinha. E o Brasil, tem uma História rica que deve ser mostrada nas escolas, com heróis e vilões que devem ser lembrados, tanto para serem copiados como para que antigos erros não se repitam. Se a História fosse melhor passada nas escolas por professores mais apaixonados pelas suas profissões, muitos políticos hoje não estariam cometendo seus enormes enganos e os administradores de empresas não estariam causando situações prejudiciais às organizações. Em outras palavras, eles não estariam matando suas galinhas.
Maus tempos! Quando eu cito um exemplo do que já passou ou do que eu mesmo vivi, os jovens logo me cortam, quase agressivamente, com um “há quanto tempo isso ocorreu?”, como se a cabeça do homem tivesse mudado nos últimos cem anos. Sim, temos tecnologia, temos recursos e mais condições, mas ainda mergulhamos dentro de nossos mundos, protegidos por uma cerca invisível, nos isolando de quem está ao lado, mesmo sob a justificativa de que estamos conversando com outros através das redes sociais. Antes, enfiávamos a cara num jornal. Agora, enfiamos a cara num celular. A única diferença é que, antes da Revolução Industrial, há mais de um século, não se precisava mergulhar no nosso interior pois as pessoas estavam suficientemente isoladas, a ponto de buscarem equilíbrios e irem atrás de atividades realmente sociais, como irem a uma festa, que era um grande acontecimento, ou visitarem as famílias, percorrendo grandes distâncias.
Tal situação, faz me lembrar de uma piada. Quando o velho professor ensinou a um aluno que dois mais dois eram quatro, esse, de pronto, questionou: “Há quantos anos temos isso?”.
Tem se observado que muitos gestores, com diplomas não se sabe de qual escola, ou mesmo se foram formados em alguma coisa senão em soltar bravatas intermináveis e sem sentido, convencendo as mentes pouco preparadas da sua alegada, embora ineficiente, competência, são hábeis açougueiros desse tipo raro de galinha. Assumem uma organização e a primeira coisa que fazem é simplesmente endividá-la. É fantástica a capacidade de endividamento desse pessoal. Há bancos que adoram clientes endividados e nenhum agiota possui uma pessoa controlada como bom cliente. Se eu emprestasse dinheiro a juros, votaria a favor dos perdulários para ocuparem as diretorias. Depois, pressionados, dilapidam o patrimônio histórico e cultural, que dão às suas organizações valor aos seus nomes e até o grau de confiança necessários para as perpetuações tão sonhadas na ocasião dos seus nascimentos. Quando tudo estiver exaurido, drenado, morto, anunciam que eram sinais dos tempos. Uma alegação conveniente de quem não soube lutar por aquilo que esteve à frente diante da sociedade. Comodismo puro com o discurso padrão da falsa modernidade.
Agora, estamos na pandemia. Que conveniente para se justificar a falta de capacidade! Avisam a todos que os fatos inesperados pegaram a todos de surpresa. As regras de distanciamento justificam plenamente o fracasso das organizações como um todo. Ninguém esperava por isso.
Escondem a realidade.
A pandemia realmente abalou a tudo e a todos. Os maus administradores choram desculpas esfarrapadas e escondem a total incompetência. Os bons, fizeram o que se chama “pensar fora da caixa” e minimizaram o impacto negativo e, alguns, até conseguiram fazer as coisas crescerem. Citemos as escolas que conseguiram dar continuidade ao ano letivo usando mídias eletrônicas que não isolaram os alunos do resto do mundo. Falemos dos bancos que não apostaram somente nos perdulários, mas também nos bons clientes, mantendo suas fidelidades. Elogiemos as lojas que passaram a incrementar mais ainda as vendas por computador e até abriram espaço para pequenos concorrentes. E não esqueçamos dos bares e restaurantes que incrementaram suas ações de delivery.
Então, dívidas passadas nem servem para ser desculpas, principalmente porque os gestores que as causaram apoiaram, na grande maioria das vezes, os novos quando nas assembleias. Os competentes que assumiram dívidas, fizeram como primeiro ato, saná-las! Esses venenosos passivos são coisas chamadas de progressivas, mas, no frigir dos ovos de ouro, é matar a galinha aos poucos.