Por Guilherme Narciso de Lacerda*
Um grupo de empresários capixabas visitou recentemente em missão oficial o estado de Santa Catarina para conhecer experiências exitosas, notadamente em inovação.
Seria importante que eles conhecessem também a reação que os catarinenses estão tendo para impedir que o modelo inusitado do governo federal de privatizar a Autoridade Portuária se implante por aquelas bandas.
O complexo portuário de Itajaí é o 2º em importância no Brasil na movimentação de cargas conteinerizadas, tendo registrado em 2020 um crescimento de 12%, ultrapassando 1,3 milhão deTEUs (contêineres de 20 pés).
Ao contrário do que se passa por aqui, lá em Itajaí há uma reação da sociedade organizada, juntando representantes empresariais, das classes trabalhadores, das Universidades e do poder público, com liderança do governo municipal.
A sociedade catarinense não aceita o modelo que o governo federal quer impor. A proposta não demonstra que a iniciativa trará benefícios para a região. Discursos de que haverá aumento de investimentos e da eficiência portuária estão descolados de comprovações, tal como por aqui. Entretanto, no nosso caso, a sociedade capixaba assiste passivamente à condução do projeto federal. A única reação é capitaneada por um grupo de lideranças sindicais e empresariais diretamente ligados ao setor. Ficam alheios, como se não os afetasse a grande maioria das lideranças empresariais e políticas, inclusive o próprio governo estadual.
A proposta de privatização da CODESA avança e, caso ela supere os questionamentos que o TCU corretamente está fazendo, pode ser que ela seja a única a ser efetivada. Se ocorrer, ao contrário do que os apressados possam concluir, os impactos em termos de concorrência penalizarão o nosso projeto portuário. Vários estudos indicam que essa ideia de se fazer uma concessão da função pública não leva a ganhos operacionais. A gestão no novo modelo será feita por um concessionário que terá como clientes os já arrendatários e operadores privados. Essa duplicação de concessão pública é uma ideia despropositada e acarretará elevação dos custos para as empresas que atuam na ponta do processo.
Há várias questões sem resposta na proposta capenga do governo federal. Por exemplo, não se esclarece como seriam coordenadas as atuações dos operadores do Porto Organizado com os TUPs fora dele, e com Terminais retroportuários alfandegados. O argumento de que tudo será bem resolvido pela agência reguladora em Brasília, em interlocuções com os concessionários e arrendatários, é de um primarismo sem igual.
O governo do estado e os municípios ficarão apenas assistindo a tudo sem poder atuar na busca de soluções melhores para a região. Uma Autoridade Portuária pública gerida com transparência e sem ceder a interesses menores de grupos político-partidários é fundamental para que os portos capixabas se desenvolvam. Que nossas lideranças reajam e participem do debate sobre um tema da maior importância para o Espírito Santo, tal como ocorre em Santa Catarina e também em São Paulo.
*Doutor em Economia pela Unicamp, mestre em Economia pelo IPE-USP, professor ap. (Depto. Economia-UFES). Foi diretor do BNDES (2012-2015). Autor do livro “Devagar é que não se vai longe – PPPs e Desenvolvimento Econômico”, recém-publicado pela Editora Letr
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