Por Ricardo Coelho dos Santos*
Nesse texto, não falo de política. Apesar de que, no nosso país, tudo está acabando mesmo em pizza, e da pior qualidade, de supermercado barato, a intenção principal é outra. Falarei, sim, sobre essa delícia da culinária italiana, mas com intenção de despertar a criatividade e a atenção sobre coisas que podem ser melhoradas. Repito a mesma temática com a mesma intenção que pratiquei quando escrevi o texto “O Pizzaiolo” aqui no Debates em Rede (confira em http://www.debatesemrede.com.br/materia/2821/o-pizzaiolo).
Sobre o assunto pizza, posso acrescentar que esse prato veio dos antigos egípcios e passou para os hebreus. Eles comiam pães achatados, talvez até mesmo o nosso conhecido pão sírio, com alguma coisa por cima, seja carne, peixe ou verduras. Veio a fazer sucesso em Roma e caiu no gosto nos moradores de toda a Bota. Até que, no século XIX, a rainha Margherita quis provar o que o povo comum da Itália comia e lhe fizeram uma pizza com as cores do país: branco (a muçarela), verde (manjericão) e vermelho (tomate). A partir daí, a pizza se tornou mais conhecida e gerou algumas modificações tradicionais. Hoje, um cardápio de pizzas num bom restaurante que a serve possui, ao menos, duas páginas de opções.
Existe um padrão internacional para as pizzas servidas em restaurantes, concedida pela Associazone Verace Pizza Napoletana, ou AVPN. De acordo com o site https://debandeja.pedzap.com.br/artigos/gerencia-e-administracao/o-que-e-o-certificado-da-pizza-napoletana/, só os estados de São Paulo, Rio Grande do Sul, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais e Distrito Federal possuem pizzas com esse certificado. O Espírito Santo, com uma cultura italiana tão forte, está fora da lista!
Esse certificado não impede que outros tipos de pizza, não contempladas pelos critérios de exigência, sejam servidos. Mas, vamos e venhamos, há duas questões que aqui escrevo. Não se pode colocar um pouco mais de padronização nas pizzas brasileiras? E não se pode usar um pouco mais de criatividade?
Quando falo de padronização, dou alguns exemplos. Comecemos pela Pizza Toscana, que, em alguns restaurantes, é servida com linguiça moída, e em outros, fatiada. Já a Pizza Margherita vem, em alguns lugares, com a cobertura original e em outros, com queijo parmesão ralado, e já comi, na Bahia, essa mesma pizza com pedaços de presunto formando margaridinhas…
Continuando, temos ainda confusão na própria linguiça calabresa, conhecida por ser temperada com a pimenta de mesmo nome — pelo menos, foi assim que aprendi. Porém, já vi, com esse mesmo título, linguiça frescal, linguiça temperada com erva-doce (não fica mal, posso adiantar) e tantos outros tipos. Assim, não é de se estranhar a imensa diversidade da Pizza Portuguesa. Desafio alguém a encontrar duas “portuguesas”, em restaurantes destacados, iguais. Em alguns, nem a linguiça aparece. E me pergunto: essa teria de ser calabresa? Não poderia ser paio ou outro tipo de linguiça, como uma boa defumada, colocada nas melhores feijoadas? Falarei ainda dessa pizza adiante, mas conheci Pizza Portuguesa levando a linguiça mais sardinha, ovo cozido e cebola. O critério parece ter mudado muito, por aqui…
E existe o porém da criatividade. Se pegarmos as opções oferecidas pela maioria das pizzarias, nos surpreenderemos como formam textos tão parecidos. Uma empresa gráfica no Espírito Santo ganha dinheiro fácil ao montar cardápios: basta imprimir um texto já padronizado, com a ordem de apresentação modificada, e está feito.
Por isso, para provocar a criatividade dos consumidores e dos pizzaiolos do nosso estado, revelarei aqui as pizzas mais surpreendentes, fora de qualquer padrão aqui utilizado, que já consumi pelas minhas andanças.
Começo aqui mesmo, em Vila Velha, no hoje inexistente Beko’s Bar. Quando o centro de Vila Velha possuía boas opções de lanches e restaurantes, o Beko’s Bar, propriedade do Seu Maurício, pessoa merecedora de meu grande respeito e consideração, apresentava uma pizza de queijo inteiramente crocante. E sua linguiça “calabresa” era aquela temperada com erva-doce. Muito boa, mas poderia ter tido outro nome!
Em São Paulo, tive a oportunidade de me surpreender com duas pizzas, nenhuma certificada. A primeira, foi num bar e lanchonete na Avenida São João, em que se comia no balcão. Diferente de tudo, ali não se servia refrigerantes: só chope e frapê! Foi há muito tempo, de modo que não consigo me recordar o nome do estabelecimento. Tanto tempo que eu não tinha ainda idade de beber meu chopinho, coisa que meus pais se deliciaram, enquanto eu fiquei consumindo um frapê de coco. Perguntamos que tipo de pizza eles tinham e o balconista, se mostrando irritado, respondera secamente: “Temos Pizza!”. E encerrou o assunto. Não havia opção de tamanho nem de gosto, mas nos arriscamos e pedimos.
Aliás, uma coisa podemos falar de São Paulo: lá se come bem, mas seu povo é sensível sobre a comida italiana: se você pedir ketchup para acompanhar o prato, principalmente pizza, você corre o sério risco de ser colocado para fora do restaurante!
A pizza veio. Enorme! Foi a maior que já vi! Vinha com pedaços de linguiça num canto, aliche em outro, rodelas de tomate, sardinhas noutro canto, presunto e não me lembro mais o quê, sem uma coisa se misturar à outra. Não conseguimos comer tudo, mas foi uma experiência deliciosa e única. Uma das melhores e mais inesquecíveis pizzas que já comemos.
E também em São Paulo, comi uma bela redonda num dos restaurantes da rede Pizzaria do Bixiga. Foi uma surpreendente pizza de aspargo verde, que estava em regime de experiência. Aprovei com louvor, mas, uma pena, eles tiraram do cardápio um mês depois. Havia, ainda, outros critérios para aprovação.
E falei de “redonda”, mas já comi uma excelente pizza retangular. Foi no restaurante Pizzafari, no Animal Kingdom, na Disneyworld, na Florida, EUA. Qualquer que seja o sabor, todas elas são ótimas. Recomendo também a salada que vem como acompanhamento.
Sobre Pizza Portuguesa, eis uma realmente diferente de tudo imaginado: a que é servida pela Pizzalândia, na Rua Senador Dantas, no Rio de Janeiro. Esse restaurante sexagenário inovou realmente nessa opção: é uma pizza de linguiça calabresa, com a opção de vir sem ou com (muita) cebola, tudo coberto por uma camada de ovo batido, formando uma verdadeira fritada de pizza. O tipo da pizza que não deve ser servida meio-a-meio. Uma brotinho vale por uma refeição completa.
Aliás, a Pizzalândia é a minha pizzaria favorita. Não serve só pizza, como também carne de avestruz e feijão manteiga, um acompanhamento muito procurado pelos frequentadores. Todos os sabores de pizza têm seu referencial só comparável ao excelente serviço. Pizzas de presunto, calabresa ou outro sabor não levam muçarela; o segredo é pedir uma metade com sua opção e outra metade só muçarela. Creiam que poucas coisas são tão boas quanto isso. A pizza de frango tem uma aparência seca, mas proporciona uma explosão indescritível de sabor.
E, terminando, cito a Cantina Buonasera, no Rio de Janeiro, também uma rede de serviços. Sua Pizza de Camarão supera as encontradas em lugares em que a tradição é o peixe. Seu camarão é assado com a pizza, e não como molho de moqueca ou bobó, nos padrões servidos no Espírito Santo, por exemplo. Não estou criticando a forma que o capixaba apresenta essa maravilhosa iguaria, mas chamo a atenção que existe mais de uma maneira de se colocar uma pizza de camarão à mesa.
E, aliás, para mim, o porquê no Espírito Santo se consome pizza de atum e aliche, mas não uma de sardinha, é um mistério. Cadê a ousadia? Em Brasília, comi uma de surubim, uma péssima experiência gastronômica, porém aplaudida pela diversificação.
E viva a pizza. Não a pizza política, mas aquela realmente democrática, consumida com um refrigerante bem gelado, uma boa garrafa de vinho ou, quiçá, com uma caneca de chope bem tirada. E, com mudanças criativas, nossa motivação de consumo certamente aumentará!
* Escritor e Engenheiro.