Por Ricardo Coelho dos Santos*
Pessoalmente, sempre imaginei que um conhecimento que qualquer oficial das Forças Armadas adquiriria é o de Estratégia. Não fiz o Serviço Militar, de modo que confesso desconhecer tal assunto, mas tive a oportunidade, na minha vida profissional, de participar de um curso, ministrado brilhantemente por um coronel reformado do Exército Brasileiro. Recebi ali uma das melhores e mais marcantes aulas da minha vida.
Tendo esse conhecimento básico do básico, posso já contemplar atitudes tidas como questionáveis pelo público leigo em geral e entrei num mundo de segredos que certamente me encantou. Quem não gosta de conhecer a verdade atrás dos fatos, principalmente aquela desconhecida, esclarecedora e que tenha alcançado resultados tidos como fortuitos? Quão indignados ficamos ao saber dos motivos que determinadas atitudes foram tomadas ao conhecimento de uma realidade difícil de ser explicada?
Nelson Rodrigues afirmou numa das suas marcantes frases em favor do seu Fluminense: “E podem me dizer que os fatos provam o contrário, por isso vos respondo: pior para os fatos”. Parece ser essa a regra dos partidos políticos, instituição maior que os governos, pelo menos no caso brasileiro.
Mas existe algo superior aos fatos e suas versões. Algo que não se consegue esconder por muito tempo, pois a revelação surge. O corpo de uma vítima volta a boiar e revela muitas verdades, os desmandos surgem mais cedo ou mais tarde e heróis endeusados viram vilões e bandidos odiados na sua época passam a ressurgir como heróis.
Mas, muitas vezes, a verdade surge mais cedo do que se pretendia. E isso aponta um erro de estratégia. Não adianta, por decreto, mandar se ocultar a realidade sobre determinadas pessoas que não será isso que servirá de véu para os fatos. Aliás, pior: só por causa de se dar tal ordem de esconder o que realmente há e acontece, gera-se uma onda de especulações que já destrói a reputação de qualquer envolvido. O que a boa estratégia manda fazer? Simples: abrir o jogo!
No Brasil, a posição de um Presidente o protege contra a maioria das acusações lhe apontadas, mesmo com comprovação. Comparando o número de tentativas de impeachment que pesa contra os principais mandatários do país e o número de afastamentos realmente tomados a cabo, mostra-se que a blindagem do Chefe do Executivo é bastante eficiente. Porém, o mesmo não ocorre com seus apoiadores, os homens e mulheres que servem de base para o cargo político mais importante do Brasil. Esses caem com facilidade. E, resumindo Maquiavel, a pessoa pisada no chão também eleva o líder. Elevaria mais se ela realmente o erguesse no ombro, mas, não fazendo, pisada, eleva menos, mas eleva!
O líder, com menor que seja a sua visão, reconhece que não adianta sacrificar por aquele que o está prejudicando. É inútil apoiar que o está mais que atrapalhando: o está destruindo!
E os fatos estão aqui: mais de meio milhão de mortos por uma pandemia que o Sr. Presidente da República e seus apoiadores desprezam. E esse é o maior fato que não se deixa ser ocultado! Nosso Capitão acha que essa é uma boa estratégia, crendo que seu péssimo estafe é o único grupo acertado em informar que a rota certa do navio é ir direto contra o iceberg.
Estrategicamente falando, nosso Presidente da República está perdendo uma guerra por cruzar os braços contra o inimigo declarado, vislumbrando e se ocupando principalmente contra adversários mínimos diante dele. Está, na verdade, perdendo a maior oportunidade que um governante brasileiro já teve, acreditando em premissas erradas, fechando os olhos para fatos que não surgem simplesmente, mas berram com alto-falantes sob luzes de holofotes, imaginando estar bem cercado. Mas, ao seu lado, só se encontra oportunistas que certamente o abandonarão no naufrágio.
Vamos rever a história. Churchill não tinha sido um político amado na Inglaterra. Stalin, muito menos, na União Soviética. Mas o porquê o primeiro passou de fracassado pela má condução de uma campanha na Primeira Grande Guerra para ser um dos maiores e mais respeitados estrategistas de todos os tempos? Como o segundo ficou diante de um governo por quase trinta anos? A resposta é que eles tomaram uma atitude em comum: chamaram a responsabilidade das guerras para eles, mesmo sacrificando seus pares. O sacrifício de Stalin foi bem mais cruel, digamos a verdade, mas conseguiu segurar Hitler com armamento insuficiente. E Churchill, assumindo uma Inglaterra empobrecida, defendeu a ilha contra uma invasão que parecia ser iminente, e ainda abrigou o governo resistente da França. Assumiram realmente suas posições de líderes: do bem ou do mal! Esses fatos serão sempre lembrados respeitosamente por essas posturas.
E o Brasil, hoje, ganhou uma guerra de graça! Uma doença terrível nos invadiu, destruiu famílias, abalou profundamente nossa economia… E nosso líder quer saber o que fazer, como se isso não fosse sua atribuição.
É claro que ninguém saberia o que fazer. Quando um inimigo invade nosso território, o primeiro sentimento é o de desorientação total. Mas, com liderança, o caminho para a vitória será encontrado.
E nosso país é um dos mais bem preparados para esse tipo de guerra. Tem pesquisadores dessa área, embora a maioria estivesse e continua estando desempregada. Descobrimos vacinas e doenças, inclusive a variante ômicron da covid-19. Temos médicos e doutores referências mundiais. Mas, com isso, não houve uma mínima convocação desses que seriam os grandes combatentes brasileiros dessa autêntica Guerra Mundial.
A estratégia, que imaginava ser conhecimento de qualquer oficial militar, seria chamar a responsabilidade dessa guerra para si. Seria ficar realmente na frente do processo, e não colocando um Ministro da Saúde que já demonstrou pelas suas declarações que não tem a mínima ideia do que está falando ou fazendo nesse combate. O estrategista é o líder e se seus pares acertam ou erram, a culpa continua sendo dele! Não adianta afastar quem não tenha sua mesma opinião. Divergências surgem e podem ser ou não ser escutadas, mas afastar por visões ideologicamente diferentes fere os princípios de qualquer administrador. O afastamento pode ser por más atitudes ou por incompetência, mas não por antagonismo de opiniões.
E, protegendo seus pares que não merecem ser protegidos, mesmo familiares, nosso Presidente da República está dando uma de avestruz de piada, escondendo sua cabeça num buraco, deixando o resto exposto. Se chamasse para si a responsabilidade e cobrasse resultados que possam confrontar com suas crenças, mas apoiado pelos maiores entendidos em combate a pandemias, não como convidados, mas sim convocados por se tratar de guerra contra um inimigo desconhecido, colocando leis emergenciais rigorosas para proteger o povo e a economia do país, e pessoalmente fazendo as declarações e mandando apresentar as estatísticas, no lugar de deixar para o Consórcio de Imprensa que teve de assumir essa tarefa devido à falta de apoio do Governo Federal, e exigindo posturas positivas de todos os governos de estado, o Sr. Presidente da República poderia ter formado atritos fortes, mas, somado à sua expressiva votação, tal atitude o elevaria ao posto de maior e mais amado presidente do Brasil. Getúlio Vargas, por mais fundamentadas que sejam suas críticas, ainda hoje é o Presidente mais amado do país. Digam-me se existe alguma cidade no Brasil que não tenha um logradouro em seu nome! Pois ele, antes um admirador de Benito Mussolini, peitou italianos e alemães na Segunda Grande Guerra.
Mas ainda há tempo. Nosso Presidente da República está afundando a tal ponto na opinião pública que até Luiz Inácio Lula da Silva, alvo de crucificação geral, está disparadamente na frente de todos os candidatos à Presidência. Mas, como um bom oficial, assumindo a frente dessa guerra terrível que hoje vivemos, chamando a responsabilidade para si, pode ser que ele reverta sua imagem. Uma atitude estratégica que o povo brasileiro está precisando.
*Engenheiro e Escritor