Por Júlio Cezar Costa*
Era um dia de novembro de 2004 e as ruas de cidades da Grande Vitória (ES), literalmente estavam em fogo: os ônibus queimavam!
A sensação de insegurança e medo apavorava a população capixaba. Os presídios estavam sob as ordens dos chefes de facções criminosas.
A mídia dava expressiva divulgação aos fatos e as autoridades atônitas, buscavam urgentemente o que fazer diante das dificuldades e circunstâncias.
O Jornal Nacional da Rede Globo abriu o seu noticiário naquela noite mostrando o ”Espírito Santo em chamas”.
A paranóia foi como se diria hoje, ”viralizada”. O Planalto moveu-se rapidamente para ajudar a conter a baderna na ”ex-capitania” de Vasco Fernandes Coutinho.
Descobriu-se, sem qualquer alquimia política, que tratava-se de uma situação na qual o controle pelo Estado não poderia ser ainda mais fragilizado. Era preciso agir em nome da não ruptura da ordem pública.
Então, um “gênio” em um gabinete brasiliense teve uma “extraordinária” ideia, logo abraçada como boia redentora pela presidência da República.
Sem lei, sem debates e sem se saber o que viria a acontecer, a decisão técnico-política foi colocada em prática, desplanejadamente e com as Polícias locais visivelmente desmerecidas.
Assim, sem gestação e pré-natal, nascia a “Força Nacional”, como mais uma jabuticaba brasileira.
A nomeada “Força Nacional”, constituía-se em um “quebra-cabeça” de tropas de diversos Estados, sem treinamento, sem uniformes, sem insígnias, sem conhecimento do território onde atuariam e que repentinamente foram reunidas para resolver o problema de nossa terra, sem que antes, decretassem o estado de prontidão para as tropas capixabas.
Assim, lembro-me de estar, dias depois, escalado como supervisor de serviço por ocasião do momento da ação inaugural, no melhor estilo hollywoodiano, da “Força Nacional” no 6º BPM no município da Serra (ES).
Foi um show circense, maior ainda do que aquele patético momento do desembarque na chegada a Vitória.
O major capixaba, subcomandante da Unidade serrana, diante de ”mais um rambo no ES”, agora com forte sotaque, trajando, sem identificação e insígnias, a farda emprestada às pressas pela “PM de São Paulo”, recusou-se abertamente a prestar a continência àquele que, em nome da República, dizia-se tenente-coronel, comandante das tropas deslocadas de última hora, espetaculosamente para o solo espírito-santense. Não deu outra, acabaram os dois levados à Corregedoria no final da noite.
Desse modo, naqueles dias, ”o mau”atingiu também alguns dos Oficiais da PMES, idealizadores do “Propas”. Eles foram acusados de improbidade por ministrarem aulas para policiais de todo o Brasil na UFES.
Da noite para o dia o noticiário virou na terra de Ortiz. A crise mudava de endereço do “Palácio Amarelo” para a “Casa Cinza”.
E assim, a nuvem de fumaça escondia a fraqueza da “cúpula” e desviava a atenção da sociedade, mas as ruas continuavam entregues ao crime organizado.
Os dias adiante seriam de grandes perseguições e injustiças, mas não havia outro meio, senão esperar que a verdade fosse restabelecida.
O tempo passou e agora, 18 anos depois, no silêncio das manchetes dos jornais, a Justiça Federal sentenciou: “Desse modo, mostrando-se incontroversa a ausência de atos de improbidade administrativa, JULGAR IMPROCEDENTE o pedido de condenação dos Réus Edmilton Ribeiro de Aguiar Júnior, João Antônio da Costa Fernandes, Josette Baptista, Júlio Cezar Costa, Pedro Delfino e Pedro José Nunes nas sanções pela prática de atos de improbidade administrativa”.
Assim, prevaleceu o brocado de que “a Justiça tarda, mas não falha”, mesmo a dos homens.
E para não esquecermos Bonaparte, lembramos que “o êxito nasce de duas virtudes: audácia e paciência. Audácia para vencer os obstáculos e paciência para vencer as injustiças”.
Vitória (ES), 10 de julho de 2022.
* Coronel da PMES e Associado Sênior do Fórum Brasileiro de Segurança Pública
Foto ilustração: reprodução da internet