Por Fabrício Augusto de Oliveira*
Ao participar do Fórum Econômico Mundial, em Davos, na Suíça, no final do mês de maio deste ano, o ministro da Economia, Paulo Guedes, exaltou as iniciativas tomadas pelo Brasil para combater a crise, e garantiu que o Brasil vai crescer à frente das economias avançadas por ter feito melhor o dever de casa, ajustando as finanças públicas e fazendo uma política monetária contracionista.
O ministro Paulo Guedes tornou-se, no governo um expert em vender otimismo sobre o desempenho da economia, mesmo contrariando os dados que são divulgados sobre a atividade econômica. Ainda na última semana, manteve a projeção de crescimento de 2% para este ano, e de 2,5% para os próximos anos até 2025. Mesmo que tal façanha seja alcançada, ainda será muito pouco para uma economia que praticamente não cresce desde 2015, à exceção de 2021, quando essa taxa atingiu 4,6% depois do tombo de 3,9% registrado em 2020, devido aos efeitos deletérios do novo coronavírus.
O que o ministro não esclarece é como o Brasil conseguirá crescer na contramão da economia mundial. O otimismo que existia no início do ano sobre o desempenho da atividade econômica no mundo, traduzido nas projeções que foram divulgadas por instituições como o FMI, o Banco Mundial e a OCDE, está rapidamente se desfazendo e dando lugar a um crescente pessimismo sobre o seu comportamento em decorrência da aceleração do processo inflacionário no mundo, da guerra entre a Rússia e a Ucrânia e do aumento generalizado das taxas de juros pelos bancos centrais para reverter a alta dos preços.
Em junho, todas as projeções de crescimento do mundo já haviam encolhido: a do FMI caiu de 4,1% para 3,6%; a do Banco Mundial de 4,4% para 2,9%; e a da OCDE de 4,5% para 3%. Na revisão feita, a OCDE reduziu, também, o crescimento do Brasil de 1,4% para apenas 0,6% neste ano. Boa parte dos economistas consultados sobre essa tendência consideraram, contudo, serem projeções ainda otimistas, apostando que uma recessão global se aproxima, podendo chegar com força no final do ano ou, com grande grau de certeza, em 2023. Isso, em virtude da deterioração do cenário internacional causado pela aceleração dos preços, pela guerra, que não tem prazo para terminar, pelo movimento dos juros e pelos novos confinamentos da população gestados pelo surgimento de outras variantes do vírus.
A grande indagação deste cenário é a seguinte: como o Brasil conseguirá sustentar uma maior taxa de crescimento na contramão do que está ocorrendo no restante do mundo, considerando, inclusive que, historicamente, o país depende do comportamento do cenário externo para alçar voos mais robustos nessa direção? Internamente, não há fatores de dinamismo da economia que justifiquem esse otimismo, a não ser os R$ 41 bilhões que serão despejados na economia com a aprovação do projeto do estado de emergência eleitoral: o desemprego continua alto, a renda média do trabalhador em declínio, as taxas de juros em elevação, o investimento praticamente parado e o Estado com o seu poder de gastos limitado ante uma dívida bruta do governo geral (DBBG) próxima de 80% do PIB.
Mesmo o maior trunfo exaltado por Paulo Guedes para apostar em maior crescimento do Brasil, a melhoria das contas públicas que, efetivamente, conheceram uma melhora em 2021, com a geração de um superávit primário de 0,75% do PIB e a redução da dívida bruta do governo geral (DBBG) para 80% e que vêm se mantendo nessa trajetória em 2022, aumentando a confiança do investidor na capacidade de solvência do Estado, pode estar com os dias contados. Em primeiro lugar, porque a recessão, caso se instale no país, derruba também as receitas públicas, brecando, como consequência, a principal variável que explica a melhoria ocorrida. Em segundo porque, ao abrir as comportas do gasto público para tentar viabilizar a reeleição do atual presidente da República nas eleições no final do ano, os ganhos que foram obtidos no front fiscal podem simplesmente se eclipsarem, exigindo ajustes mais severos nos próximos anos contrários ao crescimento econômico.
Existe ainda mais um fator que tolda os horizontes do crescimento ainda este ano: as eleições. As reiteradas críticas às urnas eletrônicas e as ameaças de golpe feitas pelo presidente Bolsonaro, com o respaldo de alguns militares de seu entorno, têm criado um cenário de incertezas sobre os seus resultados e um clima de instabilidade para os investidores, que só poderão ser superados após o término do processo e a confirmação nos cargos dos que vencerem o pleito. Se a profecia de Paulo Guedes for alcançada, mesmo com estes fatores tão adversos, o que é muito improvável, o mesmo poderá candidatar-se, e obter sucesso nessa condição, a oráculo da economia para predizer o futuro, o que a ciência econômica até hoje não conseguiu.
* Doutor em economia pela Unicamp, membro da Plataforma de Política Social e do Grupo de Conjuntura do Departamento de Economia da UFES, articulista do Debates em Rede e autor, entre outros, do livro “Governos Lula, Dilma e Temer: do espetáculo do crescimento ao inferno da recessão e da estagnação (2003-2018)”.
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