Guilherme Narciso de Lacerda (*)
O debate entre os candidatos a governador realizado nesta semana (27/09/2022) revelou a dimensão estreita do grupo de lideranças políticas do nosso Estado. As manifestações agressivas e até desrespeitosas dos candidatos em direção ao atual mandatário frustraram aqueles que esperavam ouvir propostas e sugestões para um desenvolvimento econômico e social capixaba.
Mas, uma outra revelação do evento foi a frustrante constatação de que todos – sem exceção – atuaram como se não tivessem memória e como se o Espírito Santo não fosse integrante de uma federação.
Nenhum deles foi capaz de reconhecer a importância que os governos de Lula e Dilma tiveram para os capixabas, inclusive o atual governador. É triste ver um aliado assim, que, sem o apoio que o Partido dos Trabalhadores lhe deu jamais teria tido a trajetória política vitoriosa que tem. E diante de ataques injustos e irresponsáveis de alguns na direção do candidato (e futuro Presidente) Lula, o governador não teve a sensibilidade de registrar que seu projeto de governo tinha afinidades com o projeto federal que será vitorioso, restabelecendo uma profunda injustiça que foi feita em 2018 e iniciado pelo golpe efetivado em 2016, travestido de uma decisão política legal.
Essa ingratidão da elite política estadual cobrará seu preço. A história não perdoa os ingratos e como está escrito por Cervantes “ela é fruto da soberba” e por isso precisa ser rechaçada. Como parece que todos esqueceram, é bom lembrar apenas alguns registros entre dezenas de ações que favoreceram o nosso Estado. E que fique claro, as ações federais não foram dádivas, e sim um direito legítimo, mas que, ao longo dos tempos, vinha sendo sempre desprezado.
Em 2003, o governo estadual enfrentava uma situação delicadíssima em termos institucionais, políticos e econômicos. E foi a decisão ágil do Presidente Lula, logo nos primeiros meses de seu primeiro mandato que permitiu reiniciar uma nova era de reconstrução estadual, numa parceria exitosa com o então governador Paulo Hartung. Só isso bastaria para mostrar a importância dos governos do PT para os capixabas. Mas, foi feito muito mais. É triste ver líderes políticos e empresariais locais desconsiderarem os investimentos volumosos que o Estado recebeu e que repercutiram em ganhos diretos para todos eles. Como seria o ES sem a Jurong? E por que a Jurong veio para cá? E o enorme bloco de investimentos no complexo de óleo e gás? E o pré-sal?. E as milhares de moradias com o Minha Casa Minha Vida? Um programa social que foi abandonado, deixando até hoje mais de 4.000 unidades sem serem concluídas.
Mas, voltemos ao debate. Estava ali estampado um pedaço do que é o Espírito Santo, não o seu todo. Dois candidatos defensores do desqualificado mandatário nacional. Um deles, com uma voracidade parva. O outro, também defensor do mesmo time, com posições menos agressivas mas com a mesma visão torpe da realidade, jogou fora sua boa biografia de gestor municipal eficiente. O mesmo pode se dizer daquele que adotou a linha do “tanto faz”, no âmbito federal. Uma lástima. Um administrador dedicado com bons serviços prestados ao maior município do estado perdeu a grande oportunidade de se tornar uma liderança estadual de maior estatura. Um outro, com o discurso de condenar a velha política e dizer que é o novo mas que não consegue distinguir a diferença entre a complexa atuação política e a gestão de uma média empresa. E, por fim, o atual governador, que é aliado do projeto nacional de barrar a barbárie e preservar a democracia, mas que preferiu se juntar a grupos de discursos fáceis, insossos e falaciosos, deixando em segundo plano aqueles com quem teria dever de caminhar. Todos os candidatos atuaram a partir de cálculos políticos, pensando exclusivamente em obterem dividendos, iludidos com as ruidosas manifestações de grupos sociais bem aquinhoados economicamente, vestidos hipocritamente de verde e amarelo. Eles estão dessintonizados com os verdadeiros anseios da maioria da população capixaba que sofre e que sabe como era melhor a vida dela em outros tempos. Os capixabas sabem quem implantou os vinte e tantos Institutos Federais de Educação e permitiu que os humildes, aqueles que nunca tiveram vez, passassem a frequentar a Universidade e ter uma educação de qualidade. Eles sabem que podiam viver melhor até 2014. E eles sabem também quem foi o presidente irresponsável no enfrentamento de uma pandemia que matou quase 15 mil capixabas.
Registre-se que no enfrentamento da covid-19 o governo estadual teve uma atitude exemplar que merece elogios. Aqui no estado o índice de mortos por infectados foi de 1,21%, muito menor do que o índice brasileiro, que foi de 1,97%, o maior do mundo!. Portanto, faltou ao governador mostrar à sociedade as dificuldades que ele enfrentou com o governo federal para atenuar o desespero de famílias. Na certa, se tivesse havido integração entre as duas esferas de governo o número de óbitos e de sequelados teria sido muito menor.
Enfim, o projeto vitorioso capitaneado por Lula e Alckmin será a grande oportunidade para reabrir um novo tempo em nosso país, soterrando a monstruosidade em que vivemos há quase quatro anos. A partir de então as “elites” política e empresarial do nosso estado terão que se repensar, se reposicionar e ficará claro o tamanho dos oportunistas e a dimensão daqueles que efetivamente tiveram compromisso com a democracia e com um desenvolvimento econômico-social inclusivo.
(*) Doutor em Economia pela Unicamp, mestre em Economia pelo IPE-USP, professor (após.) Departamento de Economia da UFES. Foi diretor do BNDES (2012-2015). Autor do livro “Devagar é que não se vai longe – PPPs e Desenvolvimento Econômico”, publicado pela Editora LetraCapital.
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