Por Fabrício Augusto de Oliveira*
Depois de apedrejar e tentar derrubar a democracia no país, o ex-presidente da República, Jair Bolsonaro, e sua mulher, Michelle Bolsonaro, foram premiados com o dinheiro do contribuinte, por ocuparem cargos de honra no Partido Liberal (PL), um partido fisiológico, com salários que, juntos, somam 83 mil reais, bancados pelo fundo partidário, ou seja, com a receita de impostos.
Bolsonaro já amealha, como capitão da reserva do exército, uma aposentadoria de 12 mil reais por mês e também uma aposentadoria, como parlamentar, de 30 mil, o que, somados aos ganhos do PL, somam 125 mil por mês para o casal, saindo dos cofres públicos.
Tudo isso, sem contar que, por ter comandado o país por quatro anos, ainda lhe é assegurado como direito, segurança e apoio pessoal para suas atividades, dois motoristas com veículos oficiais da União, o que transforma os 125 mil num piso que o povo terá de suportar enquanto durar essa situação.
Os 83 mil reais adicionais repassados pelo PL para o casal, nem de longe se aproximam do valor das joias árabes pelas quais Bolsonaro, pelo que tem sido divulgado pela imprensa, não mediu esforços para tentar incorporar ao seu ativo pessoal. Mas, considerado em termos de fluxo, e não de estoque, este valor representa aproximadamente 0,5% do que seria possível obter, em termos reais, se as tentativas de Bolsonaro tivessem dado bons resultados e, se conseguisse vendê-las por 17 milhões de reais, aplicasse esse valor no sistema financeiro. Nada mal: saem as joias, mas entram os salários do PL para compensar a perda.
Bolsonaro alega que só teve conhecimento de um dos conjuntos das joias que foi retido na Receita Federal, um ano depois que seus auxiliares, incluindo o ministro da pasta de Minas e Energia, Bento Albuquerque, tentaram, de modo ilegal, passar pela alfândega, ou seja, sem declará-las, para incorporá-las ao seu acervo pessoal sem ter de realizar o pagamento de impostos. Devem ter avaliado porque, neste caso, o imposto seria de 50% sobre o valor do bem. E, sem ruborizar, manifestou sua indignação com a acusação de ser responsável por presentes que “nunca pediu e nem recebeu”.
Como mentiras têm perna curta, logo descobriu-se que, além de ter se empenhado, usando vários ministérios de seu governo e o próprio chefe da Receita Federal para resgatá-las, ainda existiam mais dois conjuntos de joias que haviam entrado ilegalmente no país e que já haviam sido classificadas como e devidamente incorporadas ao seu patrimônio pessoal.
O caso das joias ainda continua sob investigação, mas, pelo andar da carruagem, tudo indica que terá um desfecho desfavorável para Bolsonaro e para os seus pares que o ajudaram nessa empreitada, procurando, com argumentos falazes, blindá-lo da responsabilidade neste episódio, incluindo o próprio ministro Belo Albuquerque que, mesmo acuado, confirmou não tê-lo avisado deste “presente”, como se isso fosse possível.
Se o caso das joias seguiu o caminho dos espertos para mascarar uma apropriação indevida de seu conteúdo, os salários de Jair e Michelle Bolsonaro com o dinheiro do contribuinte pelo PL, partido de Valdemar da Costa Neto, seu presidente, um político que não tem o menor compromisso com os interesses da população, preso e condenado a 7 anos de prisão, em 2013, por corrupção e lavagem de dinheiro, têm sido amplamente divulgados na imprensa. Nem por isso, deixam de ser um acinte para a população brasileira: um prêmio imerecido para um ex-governante que, além de inimigo da democracia, em momento algum revelou qualquer empatia pelo ser humano. A não ser para os que, vivendo no estado de natureza, apoiam seu modo antidemocrático de governar.
* Doutor em economia pela Unicamp, membro da Plataforma de Política Social e do Grupo de Conjuntura do Departamento de Economia da UFES, articulista do Debates em Rede, e autor, entre outros, do livro “A economia política clássica: a construção da economia como ciência”, publicado pela editora Contracorrente, em 2023.