Fabrício Augusto de Oliveira*
O crescimento do PIB no segundo trimestre deste ano contrariou todas as expectativas que apontavam para uma alta de 0,9% e alcançou inesperados 1,4%. Na comparação com o segundo trimestre de 2023, o aumento foi de 3,3%, contra expectativa de 2,7%, registrando, no acumulado de 4 trimestres, uma expansão de 2,5%. Com os resultados registrados até o momento neste ano, subiram as apostas de que o crescimento no ano possa chegar a 2,5%, podendo se aproximar de 3% nas projeções mais otimistas, o que merece ser comemorado, já que, no início do ano, a não ser dentro dos quadros do governo, ninguém apostava em crescimento superior a 1,5%, incluindo o mercado financeiro e o Fundo Monetário Internacional (FMI).
A maior novidade deste resultado foi que, dessa vez, o crescimento veio mais espalhado entre os setores em relação aos períodos anteriores, indicando maior equilíbrio da economia. Sob a ótica da oferta, o crescimento foi de 1% para o setor de serviços e de 1,8% para a indústria, com a agropecuária conhecendo um recuo de 2,3%. Já sob a ótica da demanda, tanto o consumo das famílias quanto o do governo cresceram 1,3%, um crescimento vigoroso, com a formação bruta de capital fixo conhecendo uma expansão de 2,1% e de 5,7% em relação ao segundo trimestre de 2023. Já o setor externo contribuiu negativamente para essa expansão, dado o aumento bem mais substancial das importações (+7,6%) em relação às exportações (+1,4%).
Antes, no entanto, que esse desempenho mais favorável do PIB alimente expectativas de que o Brasil parece ter engatado a marcha de um crescimento mais sólido e sustentável, é necessário avaliar não somente os fatores que mais contribuíram para essa expansão, assim como a possibilidade de que sua força possa ser mantida para dar continuidade a essa trajetória.
Em breve síntese, são vários os fatores que podem ser apontados para explicar este melhor desempenho da economia: a liberação de quase R$ 100 bilhões de precatórios pelo governo determinada pelo Supremo Tribunal Federal no início do ano; o aumento real do salário mínimo em maio; o aquecimento do mercado de trabalho, com a queda da taxa de desemprego de 7,8% em dezembro de 2023 para 6,8% no trimestre de maio a julho de 2024; a antecipação do 13º salário dos aposentados; e o movimento de queda da taxa de juros Selic, atualmente em 10,5%, que foi, no entanto, interrompida na última reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central.
Não surpreende, assim, que a força deste crescimento tenha se dado pela expansão do mercado interno, considerando que a contribuição do mercado externo foi, inclusive, negativa, dado o maior crescimento das importações vis-à-vis as exportações. Mas preocupante é o fato de que, embora a formação bruta de capital tenha conhecido uma expansão de 2,1% no trimestre, a taxa de investimento no Brasil continua muito baixa, tendo representado apenas 16,8% do PIB neste trimestre, contra 16,4% no mesmo período de 2023. Dessa forma, embora importante a maior expansão da FBKF, o setor continua como inibidor do crescimento à medida que este tende muito rapidamente a esbarrar em limites colocados pela capacidade de oferta, passando, com isso, a pressionar o nível de preços, exigindo a adoção de medidas restritivas do Banco Central para conter a inflação.
Não sem razão, devido ao maior aquecimento do mercado de trabalho e à ampliação da demanda interna, explicada por estes fatores, ante uma estrutura de oferta limitada, a inflação voltou a ganhar força, com o mercado aumentando, semana a semana, a expectativa de seu crescimento, atualmente em 4,3% para 2024 e 3,92% para 2025, ambas acima da meta de 3% estabelecida para estes dois anos. Para trazê-la para a meta, a expectativa, que se torna crescentemente mais certa, é a de que na próxima reunião do Copom, seja retomada a política de seu aumento, que poderá chegar a 0,75pp até o final do ano, atingindo 11,25%, não se descartando, em projeções mais pessimistas, que a mesma chegue a 12% no início de 2025. Isso significa que um dos fatores que vinham contribuindo para ajudar a injetar oxigênio no PIB deve passar a exercer um efeito contrário ao tornar o crédito para o consumo e o investimento bem mais caro.
Mas não é só isso que pode travar a expansão do PIB. A política fiscal, que tem sido a grande estrela da política econômica para manter minimamente a economia aquecida desde a crise da Covid-19, está encontrando limites para continuar desempenhando este papel, principalmente pelos compromissos assumidos com a aprovação do arcabouço fiscal que estabeleceu o atingimento de determinadas metas para as contas públicas. Embora essas metas já tenham sido flexibilizadas recentemente pelo governo, não restam dúvidas de que, por mais que o objetivo do crescimento figure entre as prioridades governamentais, sua contribuição parece também estar nos limites.
Diante disso, a previsão é a de que, embora o crescimento neste ano possa chegar a 2%-2,5% pelos resultados já alcançados até junho, o mais provável é que ocorra uma desaceleração no segundo semestre e, por enquanto, que a expansão de 2025 não deverá ir além de 1,5%.
* Doutor em economia pela Unicamp, membro da Plataforma de Política Social e do Grupo de Estudos em Conjuntura da UFES/ES, articulista do Debates em Rede e autor, entre outros, do livro “A economia política clássica: a construção da economia como ciência”, publicado pela Editora Contracorrente em 2023.
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