Por Ricardo Coelho dos Santos
O Escotismo veio a surgir como uma proposta educacional diferente, mais prática, fora das salas de aula, em agosto de 1907 na Inglaterra. O jovem general Robert Stephenson Smyth Baden-Powell, observando a juventude do seu país, sentiu que algo deveria ser feito. Ele tinha comandado a resistência contra os böers na África do Sul com poucos homens e recursos e muita criatividade, num ato que o alçara a ser o mais proeminente herói nacional da época. E, para a sobrevivência da cidade contra uma armada que não respeitava nem gênero nem idade, ele usara rapazes, formando um grupamento hierarquizado que se ocupava em tarefas que não necessitavam o uso de armas, como mensageria, enfermagem, cozinha e o que pudessem realizar.
O que Baden-Powell observara era que os jovens, apesar dos bombardeios e das ameaças constantes, se apresentavam motivados, pois lhe haviam sido atribuídas sérias responsabilidades e, assim, eles se sentiam úteis.
Juventude diferente, apática e levada a vícios foi o que ele encontrou na sua Inglaterra, e isso o preocupou. Seguidor de Maria Montessori, Baden-Powell valorizava mais a Educação do que o militarismo e, provocado pelo fundador da Brigada de Jovens, uma organização paramilitar, resolveu experimentar o Escotismo, “Boys Scouts”, onde jovens, com apoio, orientação e dentro das melhores normas educacionais, praticariam uma forma de serem autossuficientes tanto em casa como na sociedade ou sozinhos. Em suma, um exercício motivacional de empreendedorismo aplicado a partir da infância até se chegar à fase de jovens adultos.
Foi um sucesso. O resto é história do Escotismo Mundial que pode ser contemplado resumidamente em https://www.youtube.com/watch?v=ZuzoBFE4o0A&t=446s.
O Escotismo chegou ao Brasil em 1910, a bordo do encouraçado Minas Gerais, se estabelecendo como Centro de Boys Scouts do Brasil no Rio de Janeiro. Em 1914, foi fundada a Associação Brasileira de Escoteiros (ABE) e outras organizações vieram atrás. Em 1924, havia, numa rápida análise, funcionando no país, a Confederação Brasileira de Escoteiros do Mar, Associação de Escoteiros Católicos do Brasil, Associação Fluminense de Escoteiros, Comissão Central de Escotismo e Confederação de Escoteiros do Brasil, de acordo com o livro do pesquisador Antônio Boulanger, “Escoteiros do Brasil – 100 Anos da UEB”, recentemente lançado.
Coube ao oficial da Marinha de Guerra, Benjamin Sodré, provocar a unificação, e sua ideia foi logo atendida, e, em 4 de novembro de 1924 foi fundada a União dos Escoteiros do Brasil, a única no país reconhecida pela Organização Mundial do Movimento Escoteiro e pela legislação brasileira. Hoje, com 100 mil escoteiros apoiados por mais de 20 mil voluntários adultos, se vê o escotismo brasileiro crescendo cada vez mais e sendo protagonista e referência de ações ambientais, artísticas, cívicas, comunitárias e, principalmente, educacionais. As chuvas que castigaram o Rio Grande do Sul encontraram no Escotismo ajuda aos atingidos em várias situações. E, em Mimoso do Sul, aqui no Espírito Santo, a situação não foi diferente. De Ecoporanga e São Mateus a Cachoeiro de Itapemirim, escoteiros jovens e adultos fizeram o que puderam para ajudar as vítimas da tragédia.
O Escotismo influencia no jovem liderança, independência, planejamento e execução, espírito de equipe e, paradoxalmente, capacidade de sobreviver sozinho, além de espiritualidade com liberdade de escolha de religião e aceitação incondicional entre as pessoas não importando etnia, fé, cultura, nível social e mesmo ideologias políticas. Os jovens confiam nos adultos que se mostram merecedores de serem líderes e, em contrapartida, os adultos confiam e respeitam os jovens nas suas opiniões e escolhas. E é aí que se baseia o sucesso do Escotismo: é uma força educacional que tem retorno por parte do seu corpo discente, o sonho de muitos educadores que foi idealizado, por mais estranho que pareça, por militares.
Essa influência permanece para a vida toda, e no Brasil, não é diferente. Basta ver que temos, no país, algumas pessoas notavelmente famosas que foram influenciadas pelo Movimento Escoteiro nos campos culturais, educacionais, políticos e empresariais, como a atriz Adriana Birolli, o Ministro da Justiça Affonso Penna Júnior, o cantor Agnaldo Timóteo, o Almirante e artilheiro do Botafogo Benjamin Sodré, já citado, Caio Vianna Martins, um herói escoteiro que dá nome a estádio de futebol, o apresentador Celso Cavallini, as atrizes Cláudia Gimenes, Cleo Pires e Marieta Severo, o escritor Coelho Neto, o ex-Governador Espiridião Amin, Frei Betto, Georg Black, autor do primeiro gol de cabeça do Brasil pelo Grêmio e hoje dá nome ao Grupo Escoteiro mais antigo do país, os vice-Presidentes Geraldo Alkmin e José Alencar Gomes da Silva, o jornalista Gilberto Dimenstein, o Ministro Guido Fernando Mondin, Dom Hélder Câmara, os ex-Presidentes Itamar Augusto Cautiero Franco, João Batista de Oliveira Figueiredo, Juscelino Kubitchek de Oliveira e Washington Luiz Pereira de Souza, o cantor e humorista Jurandir Czaczkes (Juca Chaves), um franco admirador do Movimento e autor de muitas piadas que nos divertem até hoje, a dupla de cantores Kleiton e Kledir Alves Ramil, os humoristas Leandro Hassum e Mauro Facchio Gonçalves (Zacarias), o poeta Manuel Bandeira, o Governador Mário Covas, o escritor Moacyr Scliar, João Carlos D’Ávila (Paixão) Cortes, ícone do povo gaúcho, Paulo Skaf, o Prefeito Rafael Greca de Macedo, o jornalista Ricardo Boechat, o empresário Roberto Marinho, o diplomata Sérgio Vieira de Mello, o guitarrista Tony Bellotto, o ator Walmor Chagas, a médica Zilda Arns e o cantor Washington (Bel) Marques da Silva.
E no Espírito Santo não foi nada diferente. Personagens da nossa História passaram pelo Movimento Escoteiro Capixaba, hoje dando nomes a escolas, estradas, ruas e até uma cidade. Temos aqui Alberto de Almeida, Antônio Gil Veloso, Atílio Vivácqua, Bartouvino Costa, Carlos Imperial, Ely Junqueira, Ernesto da Silva Guimarães, Eugênio Trombini Pellerano, José Elias de Queiroz, José Monteiro Peixoto, Luiz Edmundo Malisek, Luiz Paulo Veloso Lucas, Alberto Farias Gavini Filho, Renato Casagrande, Mário Bodart, Milton Vivas, Placidino Passos e Sylvio Rocio.
Muitos outros nomes já foram identificados e esses podem ser contemplados no site https://www.escoteiros.org.br/escoteiros-notaveis-e-famosos/, num trabalho que a equipe nacional de historiares escoteiros, a Patrulha Jaguatirica, mantém e busca atualizar.
Dessa forma, há pelo menos uma centena de motivos de se comemorar o Centenário da União dos Escoteiros do Brasil. No Rio de Janeiro, um lenço escoteiro virtual ficará no pescoço do Cristo Redentor durante o evento de celebração, no primeiro final de semana de novembro.
Aqui, no Espírito Santo, o Instituto Histórico e Geográfico de Vila Velha, cuja diretoria é em grande parte também vinda do Movimento Escoteiro, mais a Região Escoteira do Espírito Santo, decidiram também fazer a comemoração. Será um evento aberto, no qual toda a comunidade de escoteiros, antigos escoteiros, simpatizantes e curiosos são convidados. Será na Igreja Nossa Senhora do Rosário, na Prainha, em Vila Velha, um templo com quase quinhentos anos, o mais antigo do Brasil em funcionamento. Lugar melhor não há.
O grande evento será no próximo dia 26 de outubro, sábado, às 10:00 h. O celebrante será o Padre Hugo Galvão, capelão nacional católico dos Escoteiros do Brasil, que virá de Natal, RN, especialmente para o evento.
Fica, então, o leitor também convidado a participar. Nos veremos lá!