Fabrício Augusto de Oliveira*
O Banco Central voltou novamente, por unanimidade, a aumentar a taxa de juros (a Selic), no dia 18 de junho, de 14,75% para 15%, a 7ª vez desde que teve início, em setembro de 2024, a política de sua elevação e a mais alta desde 2006, visando trazer a inflação para o centro da meta de 3%. Em termos de juros reais, a taxa subiu de 8,65% para 9,53%, a segunda mais alta do mundo, só perdendo para a Turquia, a qual se encontra no patamar proibitivo tanto para o consumo quanto para os investimentos em 14,4%. A Rússia, com uma taxa de juros real de 7,6% passou, com isso, a ocupar a terceira posição no ranking mundial, e a Argentina, a quarta, com 6,5%.
Quando Roberto Campos Neto, presidente do Bano Central comandava essa instituição, até o final do ano passado, qualquer aumento decidido pelo Comitê de Política Monetária (Copom) era motivo de chiadeira geral. Desde o presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, que o acusava de estar a serviço do grupo de empresários da Faria Lima e não ser patriota, porque jogava contra o crescimento econômico, até os economistas considerados da linha mais progressista do país, não faltavam críticas à política monetária apontada como insana e descolada da realidade. Gabriel Galípolo, indicado por Lula, e considerado um economista da linha heterodoxa (?), aumentou-a quatro vezes, elevando-a de 12,25% para 15%, mas hoje não se ouvem mais essas vozes, como se a política monetária fosse um primor. Apenas uma nota na imprensa do Partido dos Trabalhadores (PT) apareceu condenando essa medida, acompanhada de críticas compreensíveis do setor produtivo e de seus órgãos de representação.
Nos Estados Unidos, o Banco Central americano (o FED) decidiu, ao contrário do Brasil, manter as taxas de juros inalteradas, dentro de intervalo de 4,25% a 4,5%, mesmo com o risco Trump. Nem por isso, o presidente do país, Donald Trump, que vem mantendo uma cruzada contra as decisões do banco sobre as taxas de juros e do seu presidente, Jerome Powell, deixou de criticá-lo novamente. Para ele, o chefe do FED “é uma desgraça americana [...] atrasado demais [...] uma das pessoas mais burras e destrutivas do governo [...] por estar custando centenas de bilhões de dólares ao nosso país.”
Cada 1 ponto percentual da Selic gera um encargo financeiro de R$ 55 bilhões em 12 meses, segundo cálculo do próprio Banco Central, o que significa que só na gestão Galípolo, os juros a serem pagos aos credores do Estado deverão ter um aumento de R$ 151 bilhões. Enquanto isso ocorre, o ministério da Fazenda vem enfrentando dificuldades para aprovar um pacote de aumento de impostos estimado em R$ 20 bilhões para garantir a meta do superávit primário estabelecida no arcabouço fiscal para 2025. Ou seja, enquanto essa meta vai se tornando cada vez mais difícil de ser atingida, mesmo que isso ocorra, não será capaz de deter a piora do endividamento público causada pelo maior avanço destes encargos. A pergunta, diante disso é: como falar em ajuste fiscal, quando é próprio Banco Central o responsável pelo maior desajuste das contas públicas? Mas isso não é tudo.
A taxa real de juros de 9,5% representa um convite para os investidores deixarem de investir e os consumidores de consumir, especialmente para os que têm de lançar mão do crediário. Representa, assim, um veneno letal para a atividade econômica, ao restringir a demanda agregada, o que, no Brasil, pode ser confirmado pelos sinais de desaceleração do crescimento econômico, em boa medida explicada por essa terapia equivocada do Banco Central. Com menor crescimento, menores deverão ser as receitas do Estado e, consequentemente, maior o desajuste das contas primárias.
Em virtude dessa política suicida, o Brasil destina, atualmente, cerca de 8% a 9% do orçamento para o pagamento dos juros da dívida, que deverão aumentar ainda mais, enquanto os Estados Unidos, ainda mais endividados, apenas 3,2%, e os países com nota AAA nas agências de risco – S&P Standard, Fitch e Moody’s – algo em torno de 1,6%. Neste caso, nenhum ajuste fiscal parece possível para compensar a drenagem de recursos públicos garantida por essa política do Banco Central de manter permanentemente a porta aberta para garantir a felicidade do capital financeiro. Enquanto isso, os economistas mais progressistas do país parecem ter tirado férias para não se comprometerem com a “heterodoxia” do Banco Central.
*Doutor em economia pela Unicamp, membro da Plataforma de Política Social e do Grupo de Estudos de Conjuntura do Departamento de Economia da UFES, articulista do Debates em Rede, e autor, entre outros, do livro “Karl Marx: a luta pela emancipação humana e a crítica da Economia Política”, publicado, em 2025, pela Editora Contracorrente.
Foto: O Estadão
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