Por Adolfo Breder
Nesta semana a minha palestra para jovens de comunidades, que participam da nossa Escola de Talentos, abordou o Novo Acordo Ortográfico dos países de Língua Portuguesa. E eles quiseram saber o porquê das mudanças. Além dos evidentes interesses de integração dos povos envolvidos, destaquei como a língua é dinâmica - como as palavras vão ganhando novos sentidos.
Nosso título é um atualíssimo exemplo. Nem precisei explicar. Sua mente já sinalizou do que estou falando, não é? Vivemos um momento de direitos vilipendiados, de um país em que o desperdício e a ganância conjugados aprofundaram a crise, destacadamente para quem tem menos posses e voz.
Passear pelas ruas das nossas cidades tem sido uma atividade penosa. Nem pensem nos buracos das calçadas, no trânsito caótico, nos trombadinhas históricos, nas balas achadas e outros inconvenientes circunstantes. Falo dos imensos albergues que se formaram sob as marquises, nas refrigeradas (às vezes) portas de caixas eletrônicos, dentro de latões de lixo, buraquinhos e buracões encontrados ou arquitetados. São idosos, casais apaixonados, são crianças-prioridade-absoluta, são camelôs de trem, pessoas com variadas deficiências expostas e donos de banquinhas de amendoim. Literalmente aos nossos pés. Num traço Educação, Saúde e Moradia, conceitos totalmente ausentes nessa poça de indignidade. Chove lá fora!
Para mim, para você leitor(a), talvez seja tranquilo dizer “Eu moro no endereço tal”. Pode gerar uma sensação de identidade, revelar um status social, pode ser um convite para um prazeroso café e papos... E para nossos concidadãos abandonados à sua própria sorte urbana? Entendo agora a gramatical referência ao presente indicativo da miséria material e moral em que orbitam. Palavras ganham sentido. Palavras perdem sentido. E direção.
Nosso título remete a maiúsculas preocupações. Para que cada um tenha o suficiente para viver humanamente a sua realização pessoal e social, a decência de nossos líderes é reclamada e imperiosa.
O aurélio deve definitivamente incluir o verbete ‘moro’ com a acepção de universal busca de justiça contra os exércitos dragões da corrupção de todas as cores. Com suas vogais de fonética grave, a inquestionável palavrinha vai exprimir o desejo das pessoas de bem: que não reste tijolo sobre tijolo da muralha que nos separa de compartilhar os direitos básicos e a riqueza gerada por nós em nossa planetária terra - compartilhar ‘de todos, com todos e por todos’.
Foto: do autor: Atrás das barraquinhas de camelôs no Buraco do Lume – outubro/2013 (RJ).
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