Por Erlon José Paschoal*
E a lista foi amplamente divulgada. Anunciada antecipadamente e publicizada com toda a pompa, com todos os vazamentos possíveis e imagináveis, contendo nomes os mais diversos: de corruptos a vigaristas; de simples receptadores a patifes; de canalhas inveterados a ingênuos imperdoáveis; de infames bandidos a bandidos infames; de políticos que receberam de boa fé a malfeitores convictos; de cínicos pilantras a pilantras cínicos......enfim uma lista pra ninguém botar defeito e que mostra as relações indecentes e abusivas entre agentes públicos e empresários inescrupulosos, todos buscando atender apenas aos seus próprios interesses e de seus cúmplices e comparsas. Uma aberração, da qual todos tinham ciência, incluindo aí o judiciário e a mídia calhorda, mas que fingiam não existir, para o “bem de todos”.
Pois bem, e como será o país depois disso tudo? Como serão as relações entre os setores público e privado? Como será a relação entre o setor público e a mídia? Todos passarão a ser honestos, irão esquecer todos os bilhões desviados, e continuar a vida pós-golpe como se nada tivesse acontecido? Não é o que se vê. Muito pelo contrário. Ao mesmo tempo, os pequenos inquisidores partidários, fraudulentos e infames com salário superfaturado demonstram preocupação apenas com seus privilégios e sua impunidade. Pouco contribuem para a mudança desta realidade hedionda. Chegaram até mesmo a postar nas redes sociais uma cena patética pedindo a todos que protejam seus interesses e suas atitudes suspeitas, incompatíveis com o cargo que ocupam.
Por sua vez, o Congresso repleto de bandidos golpistas assumidos tenta impor mudanças que deterioram as relações trabalhistas, desmontam a economia e infectam de morte a Previdência, a espinha dorsal da justiça social. Indivíduos sem nenhum senso coletivo, sem noção de políticas públicas abrangentes e inclusivas, que assumem descarados seus próprios interesses mesquinhos em detrimento do bem-estar da maioria da população, sobretudo da enorme parcela dos mais pobres. Com o golpe baixo e sujo, associado ao incitamento ao ódio e ao preconceito executado pela mídia manipuladora e mau caráter, a vida pública brasileira virou um vale-tudo, uma “suruba” geral, como afirmou o Caju. Um retrocesso ético, político e econômico para o país com consequências inimagináveis para as futuras gerações. O caos, a desordem e o desmanche dos direitos sociais executados pelos bandidos golpistas podem levar a conflitos sociais ainda mais sangrentos. Era esta deterioração das relações políticas e sociais, esta intolerância e estes conflitos crescentes o que queriam? Era o crime organizado no poder com suas inúmeras ramificações o que queriam? Afinal que tipo de gente é esta?
E neste contexto qual será o futuro do jornalismo sem qualquer credibilidade e respeito pela informação, que assume partido, persegue e difama supostos desafetos e deturpa descaradamente os fatos, sem quaisquer escrúpulos, consolidado após o golpe? Um jornalismo que defende interesses escusos e se alia ao que há de pior na sociedade brasileira para enganar, ludibriar e iludir grande parte da população? Muitos jornalistas vivem e trabalham encarcerados nestes grandes veículos sendo obrigados a obedecer cegamente os donos, os senhores da informação. Naturalmente ainda temos a mídia alternativa com seus inúmeros blogs e sites que buscam refletir sobre a realidade de maneira mais abrangente e crítica. De qualquer maneira, pela importância da disponibilização da informação nos dias de hoje, este tema precisa ser analisado e debatido por todos.
Bem, às vezes não sabemos exatamente se estamos entre os achados ou entre os perdidos, mas talvez resida aí uma das características mais marcantes de nossa realidade: os contrastes extremos, quase excludentes, os discursos verborrágicos e hipocritamente sinceros em meio a mais absoluta vigarice, e as combinações surrealistas que nos fazem sentir muitas vezes num pesadelo kafkiano ou num sonho do país das maravilhas; é o tão falado efeito gangorra que nos joga da euforia ao desespero, da tragédia mais calhorda à explosão máxima de alegria telefabricada. E se tivéssemos uma classe dirigente realmente interessada em buscar saídas imediatas para nossas questões sociais mais graves, composta em sua maioria - pasmem - por pessoas íntegras e honestas ? Como seria? Pois, enquanto não cultivarmos valores que norteiem claramente nossas atitudes, não há Reforma que dê jeito nas anomalias grotescas de nossa organização social. Neste contexto, reduzir a distância entre o que se diz e o que se faz, entre o que se pensa e o que se expressa, passam a ser as principais exigências e os principais alimentos de um futuro mais saudável e mais humano.
Ainda bem que podemos escolher em que acreditar. Desse modo, não precisamos ficar dependentes de nossos famigerados líderes e governantes - muito menos dos meios de comunicação - e poderemos também inventar coletivamente uma realidade mais próxima de nossos sonhos e de nossos desejos mais íntimos. Mãos à obra!
* Gestor cultural, Diretor de Teatro, escritor e tradutor de alemão.