A divulgação pelo IBGE dos resultados do PIB de 2016, confirmando que houve uma contração da renda nacional de 3,6%, praticamente reeditando a queda de 3,8% registrada em 2015, revelou que a economia brasileira conseguiu produzir uma das piores recessões de sua história entre o segundo trimestre de 2014 e 2016, com queda acumulada de 9,1% na renda per capita dos brasileiros, só superada pela recessão do início da década de 1980, quando este tombo chegou a 12,6%.
Nunca na história do Brasil registrou-se uma recessão tão prolongada, acompanhada de uma taxa de desemprego formal de 12% em dezembro, ou mais de 20% se se incluem, neste contingente de desocupados, os que estão vivendo de bicos e os que desistiram, por desalento, de batalhar por uma nova vaga de trabalho. Apesar disso, o governo e os representantes do mercado acreditam que o pior já tenha passado e que o país já reiniciou uma nova caminhada rumo à recuperação e ao crescimento econômico, deixando para trás o inferno da recessão produzida por políticas inconsequentes e irresponsáveis do governo anterior.
Alguns números da economia deste início de 2017 parecem confirmar o otimismo que o governo tem procurado transmitir para a população sobre o início desta nova era como obra exclusivamente da nova política econômica implementada pelos “gênios” da economia: a indústria voltou a emitir alguns (ainda fracos) sinais de que continua viva, enquanto o mês de fevereiro registrou contratação líquida de 34 mil novos empregos formais e a confiança dos empresários, bem como dos consumidores, têm conhecido algum nível, ainda que modesto, de elevação.
Há mais fatores que são apontados para uma possível melhoria deste quadro: a inflação se encontra em queda livre, tendo se aproximado, nos últimos doze meses, do centro da meta, pondo cobro a um dos mecanismos que mais prejudicam a vida e a renda dos que recebem salários; com o objetivo de estimular o consumo (de forma contida), o governo liberou para saques por seus titulares as contas inativas do FGTS, esperando injetar R$ 30 bilhões na economia; o leilão de privatização (chamada de concessão) dos aeroportos atraiu investidores, embora não na dimensão pretendida, gerando receitas adicionais para o governo de US$ 3,7 bilhões, com ágio de 23%, tomado como indício inequívoco de credibilidade da política econômica; o front externo continua favorável, com o déficit em conta corrente reduzido, nos últimos doze meses, a 1,3% do PIB em janeiro; a economia internacional, especialmente a economia norte-americana projeta melhor desempenho para 2017, apesar das dúvidas reinantes sobre a economia chinesa.
Estranhamente, no entanto, o Ministério da Fazenda reduziu, no dia 21 de março, a expectativa de crescimento econômico para este ano de 1% para 0,5%, aproximando-se das projeções do mercado, caminhando em direção contrária ao que seria esperado diante deste cenário mais animador que tem sido desenhado pelas autoridades governamentais. Disso se pode inferir que o governo ou está enganando a população ou está perdendo a convicção de que a atual política econômica poderá não gerar os resultados esperados.
A verdade é que os espasmos de vida que se tem registrado na atividade econômica são inconsistentes e podem ter vida breve porque resultantes muito ainda da melhoria das expectativas que ocorreu com a troca de governo e dependente, para ter continuidade, do avanço de algumas reformas anunciadas, ainda que limitadas para este propósito. Os efeitos do primeiro caminham para o fim e, pelo andar da carruagem, dificilmente as reformas propostas, mesmo que insuficientes, conseguirão prosperar no atual governo a ponto de manter acesa essa chama.
O fato, tirante a queda da inflação pela asfixia a que foi submetida a atividade econômica, e as pequenas doses de remédios ministradas para dar alguma força ao consumo, mas que devem ser usadas para saldar dívidas, muito pouco se fez, até o momento, para reverter a queda espetacular de 4,2% do consumo e de 10% dos investimentos registrados em 2016, os principais motores do crescimento. Como estes demandam mais ações que a mera manifestação de otimismo demonstrada pelo governo para reagir, não será nenhuma surpresa que o país continue, ainda por mais algum tempo, se não no inferno da recessão, no mínimo no purgatório da estagnação.
*Doutor em economia pela Unicamp, membro da Plataforma de Política Social, articulista de Debates em Rede e O Beltrano, e autor, entre outros, do livro “Política econômica, estagnação e crise mundial: Brasil, 1980-2010”
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