Por Ricardo Coelho dos Santos*
Temos governo?
Nesse momento, há de pensar o leitor que é uma pergunta dos tempos atuais, fruto da má administração que aqui está. Mas, pedindo perdão pela contrariedade, não!
Na verdade, essa pergunta tem alguns anos. Um século, talvez, com alguns poucos períodos de bonança que logo são violentamente cortados com críticas ferozes de entendidos formados em Opinião de Círculos Fechados, com títulos de doutor honoris causa em ninguém sabe o quê, mas se tornando até referências publicadas e dando bases a dissertações e teses aplaudidas.
O que vem a ser governo de uma nação?
A resposta é simples: é manter um território, seu povo, sua economia e a soberania de tudo de forma progressivamente sustentável, com poderes trabalhando em harmonia e com a população com direitos garantidos e plenamente ciente dos seus deveres.
Mas será que essa resposta está correta? Bom, para mim, está, e ainda define que governo é aquilo que faz o Estado funcionar. Mas a pergunta mais crucial é: isso satisfaz os vários segmentos da nossa sociedade?
Respondo que sim, porque, baseado no que se colocou acima, aqueles que se julgam estar acima das leis que não os beneficiam e pouco se importam com os direitos alheios não vão concordar. Ora, a Lei mais importante que deveria existir é que puniria qualquer pessoa que prejudicasse outrem inocente.
Um bom governo deve defender o bem estar da população, mas também apoiar a iniciativa privada, sem diferenciação de benefícios. Podemos, então, resumir que o governo defende o empreendimento e o trabalho, a empresa e o trabalhador, os grupos econômicos e as famílias. Mas tais conceitos estão sendo deixados de lado.
Nenhum governo no Brasil conseguiu ter a direita ou a esquerda sonhadas pelos extremistas. Nenhuma empresa se estabeleceu livre de obrigações legais, ambientais e trabalhistas assim como nenhum sindicato de trabalhadores obteve sucesso em beneficiar seus afiliados, prejudicando injustamente a iniciativa privada. E o que podemos falar sobre isso? A resposta é “Graças a Deus!”. Mas, também, há muito tempo temos encontrado governos polarizados numa dessas direções, com várias tentativas de se ir aos extremos.
Os que são rigorosamente contra qualquer tipo de intervenção do Estado na iniciativa privada esquece que leis, impostos e padrões devem vir de uma entidade neutra, e essa entidade é o Estado. O Estado, além de qualquer governo, deve existir apoiado em normas que limitam extremos cancerígenos à Nação.
Por outro lado, quem acha que o Estado deve ser a única empresa no território, proprietário de lojas e indústrias, escolas e hospitais e até mesmo da opinião pública, está o condenando a não possuir criatividade, ideias e, consequentemente, progresso.
Ora, pode o Estado ser empresário? A resposta é sim e não. Por que o Estado precisa ser proprietário de um hotel, de uma fábrica de tecidos ou de uma companhia de transporte urbano? Não precisa! Porém, ele pode incentivar a construção de um estabelecimento de hotelaria numa região com potencial progresso, pode verificar a capacidade fabril de uma região e promover eventos que levem a um empreendedor se arriscar numa planta industrial ou até mesmo assumir algo tão estratégico como a condução de pessoas num lugar, enquanto ninguém o faz.
Porém, nesses últimos anos temos encontrado administrações públicas que não direcionam o governo para benefícios globais, mas sim, particulares. A verdade é que nosso governo é fraco! Muito fraco mesmo! E isso, tanto no Executivo como no Legislativo e Judiciário! E nosso povo aceita isso, pois se acostumou a essa condição e deixa acontecer os nossos descalabros sem nada fazer, senão criticar. Na verdade, o povo só é mesmo lembrado na época das eleições.
Parece que tudo começou no governo Sarney, quando ele, para combater a inflação, declarou congelamento de preços e vários empresários provocaram desabastecimento e aqueceram o mercado negro. Deram o recado: “vejam quem é que manda nesse país!”. Resultado, veio outra inflação, numa série que só veio a ser contida quando o plano Real surgiu pelas mãos de Rubem Ricupero, que logo foi derrubado por uma fala particular errada e revelada numa trama jornalística sórdida para se colocar no lugar o governante que os mandantes da política queriam, a ponto de dar-lhe erroneamente a autoria do plano. Deixemos claro que Fernando Henrique Cardoso nunca se anunciou como o responsável pelo Plano Real.
Mas, voltando a Sarney, eis que na sua época foi elaborada nossa atual Constituição Federal. Uma colcha de retalhos que atendia a um batalhão de lobistas para que se colocassem ali não leis que atendessem ao Estado, mas sim, aos grupos políticos e econômicos que surgiam vindos de todas as ideologias: de extrema direita à extrema esquerda. A Constituição deveria ter o mínimo de regras colocadas, estabelecendo o caráter do seu povo, deixando abertos espaços para progressos tanto sociais como industriais, mas sua maior abertura mesmo foi para emendas que permitissem o governo funcionar.
Não vamos crucificar nossos governos! O regime militar nos trouxe progressos industriais onde a iniciativa privada não teria coragem de se firmar e que somente grandes corporações estrangeiras, com a fama mais que conhecida de depredadoras, se estabeleceriam. Foi aí que estatais como Embratel, Petrobras e Companhia Vale do Rio Doce trabalharam pelo progresso do país. Já o governo Sarney nos trouxe a Constituição. Collor nos deu o Estatuto da Criança e do Adolescente e a Defesa ao Consumidor, Itamar Franco trouxe o Plano Real e Fernando Henrique Cardoso nos presenteou com uma organização impecável da máquina de governo e sustentando o Plano Real para que esse não se colapsasse como os inúmeros planos anteriores. Já Lula elaborou importantes planos de desenvolvimentos industriais e deu maior projeção internacional ao Brasil e Dilma permitiu que a Polícia Federal tivesse uma das maiores liberdades de ação dos últimos tempos. Temer resolveu alguns entraves para o progresso e Bolsonaro está trazendo os sentimentos nacionalistas de volta. Portanto, todos fizeram coisas boas. Não podemos negar tais boas atitudes.
Porém, o que nenhum governo fez foi olhar todos os segmentos da sociedade como igualmente importantes para o país. Anos atrás, se criou o INSS, acabando com planos de previdências privadas auto sustentáveis como o IAPI e o IAPB e desviaram, e ainda desviam, os recursos da Previdência Social em benefícios de particulares para o povo ser acusado pela sua não sustentabilidade, surgindo ideias mirabolantes de dificultar os benefícios tão prometidos na sua implantação. Outros planos de previdência surgiram nas empresas estatais, com até obrigações forçadas para a participação de empregados, juntando um capital que acabou sendo utilizado pelo próprio governo para o benefício de empresas particulares praticamente falidas e agora forçando os empregados a cobrirem financeiramente com os desmandos.
Outros exemplos: uma organização pretende estabelecer um empreendimento novo numa cidade e encontra barreiras nas câmaras municipais que ecoam gradativamente até às instâncias federais máximas, tendo de limitar ou mesmo desistir do que faria. Uma cidade pretende estabelecer um Centro de Pesquisa e encontra dentro dela toda sorte de correntes contrárias. Um Secretário de Estado pretende estabelecer Escolas Técnicas no Estado e vê sua ideia ir por terra devido a lobby de empresários junto ao próprio governo que ele serve.
Assim, não temos realmente governo. Temos somente defensores de interesses de grupos particulares que lutam usando a máquina de Estado que lhes foi dada pelo povo, esquecendo-o e montando suas próprias regras.
E chamam isso de Democracia!
*Engenheiro e escritor.