Por Vanda Lucia Breder
Que ninguém mais ouse
tocar a taça que me trouxe um dia
e pousou em minhas mãos,
para que se resguarde nela,
de todo abuso ou descaso,
o cheiro e o toque dos seus dedos.
Que fique presa
à peça usada de sonho
a memória do seu corpo refletido,
para que o meu corpo,
habituado,
não se esqueça
e jamais se ausente do seu.
Que se reserve no leito
o espaço em que pudemos
viver algumas noites
sem sermos perseguidos
com foices de adeus,
até que uma saudade acorde
e saiba te trazer
em carinho de volta.
Que te espere sempre,
em meu rosto,
uma alegria leve,
cor de abraço e amor tão simples,
como bocejo, bom dia,
um 'oi, moço', talvez.
Que ninguém, jamais,
possa julgar
ou colorir de malícia
o nosso intervalo de amor,
nossos momentos,
e que nem um só minuto
se perca em culpa ou angústia.
Que o seu alento, em mim,
se faça largo
e o vento da tarde
leve o pólen de todas as mágoas.
Que todo caminho
que cruzar, de novo,
nossas mãos, nosso corpo,
seja estrada de vida inteira.
Que se livre e se solte
e seja minha e sua
qualquer verdade
que contar segredo ao coração.
Que nem mesmo nós
possamos ocultar o que fomos
ou destruir o que ainda podemos.
Que todo o intenso
se preserve e sobreviva
e não se dilua
ou se guarde para o nada.